domingo, 8 de fevereiro de 2009

Em marcha forçada

Nas Entrelinhas :: Luiz Carlos Azedo
DEU NO CORREIO BRAZILIENSE


Dilma opera com o Orçamento da União, os bancos oficiais, os fundos de pensão e as agências reguladoras, numa espécie de novo “dirigismo estatal”

O Brasil, tecnicamente, entrou em recessão. Ilha de tranquilidade num mar proceloso, o nosso ciclo de desaceleração está em curso desde dezembro passado, no rastro da crise nas 30 nações mais ricas do mundo. Talvez por isso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenha resolvido antecipar a disputa sucessória. Numa espécie de marcha forçada, colocou na estrada a candidatura da “mãe do PAC”, a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff (PT), gerente do “Programa de Aceleração do Crescimento”. Se o Brasil conseguir sair da recessão antes das eleições de 2010, Dilma poderia virar uma espécie de Fernando Henrique Cardoso de saias, isto é, se eleger presidenta da República de forma semelhante ao tucano, que chegou ao Palácio do Planalto, em 1995, graças ao Plano Real.

Recessão

Nesta semana, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) diagnosticou a desaceleração da economia brasileira. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva enfrenta a recessão de duas maneiras. No plano objetivo, adota medidas fiscais e monetárias para garantir o crédito e a produção, estimula o consumo das famílias e amplia o gasto público. No subjetivo, diz que o novo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, está com um “pepinaço” nas mãos e estamos pagando pelos erros dos norte-americanos. Ou seja, se a crise chegar aqui pra valer o fracasso será de Obama.

A estratégia de Lula é eficiente do ponto de vista eleitoral. Dos 35 países avaliados pela OCDE, o Brasil é o único que não está em “forte desaceleração”. Ou seja, a “marolinha” virou “calhau”, mas não deu um “caldo” no governo. Porém, não sabemos ainda se a crise chegou mais branda por aqui ou está vindo atrasada. Os próximos meses é que dirão. Na primeira hipótese, as chances de o governo Lula sair altaneiro da crise em 2010 são reais; na segunda, a sucessão presidencial ocorreria em plena recessão, com o governo desgastado.

Nos países industrializados e emergentes, a desaceleração foi de 8,2 pontos em 12 meses, chegando a 92,9 pontos. Na zona do euro, a queda foi de 8,2 pontos em relação a 2007, com 93,8 pontos. Nos Estados Unidos, o recuo foi de 9,5 em um ano, com total de 91,3 pontos. O Japão caiu para 92,2 em dezembro, uma queda de 7,3 pontos em relação ao ano passado. O Brasil ficou abaixo de cem pontos pela primeira vez em cinco anos. Em dezembro, ficou em 98,8 pontos, uma perda de 5,4 pontos no ano, a melhor situação entre os BRICs: China recuou 14 pontos no ano, total de 87,6 pontos; Índia, 7,5 pontos, soma de 94,4 pontos; e Rússia queda de 17,7, total de 86,7 pontos. Para a OCDE, nota inferior a 100 significa recessão.

Sucessão

O presidente Lula, cuja popularidade cresceu ainda mais com a crise, conseguiu a proeza de transformar a ministra Dilma Rousseff na candidata natural do PT dois anos antes da eleição.

Agora, tece alianças para que seja a monopção das forças que apoiam o seu governo. Essa aglutinação, inicialmente, não se dá por meio dos partidos políticos. É construída a partir das relações do governo Lula com os movimentos sociais e os agentes econômicos. Dilma ocupa a segunda posição no vértice do sistema de poder, abaixo da presidente da República, mas acima de todos os demais ministros. Não há demanda social expressiva ou grande negócio no país que não dependa do aval “técnico” da ministra.

Graças ao marketing político, que dita o gestual, a retórica e o visual de Dilma, a ministra subiu nas pesquisas e acumula forças para conquistar a adesão maciça do PMDB, hoje muito bem plantado na Esplanada dos Ministérios. Há que se considerar, para isso, o papel dela na execução da política “anticíclica” do governo Lula. Dilma opera com o Orçamento da União, os bancos oficiais, os fundos de pensão e as agências reguladoras, numa espécie de novo “dirigismo estatal”, sem precedentes desde o governo Geisel. A crise econômica fortaleceu no governo os setores que veem no “capitalismo de Estado” uma alternativa para o desenvolvimento econômico e as mudanças sociais, ainda que o “ciclo de substituição de importações”, que fomentou essa concepção entre os militares e na esquerda brasileira, tenha sido ultrapassado pela integração do Brasil à economia mundial na década de 1990. Dilma defende e encarna esse projeto no governo.

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