quarta-feira, 21 de abril de 2010

Sobre romanos e mineiros :: Wilson Figueiredo


DEU NO JORNAL DO BRASIL

RIO - Em Roma, como os romanos. Em Minas também, mas como os mineiros, claro. E algo mais. Não apenas em política, quem não sabe onde está a diferença pode se dar mal. A candidata Dilma Rousseff nasceu em Minas mas, se não declarar, ninguém percebe. O insuficiente grau de mineiridade a deixa mais vulnerável na eleição presidencial por não ser dada a votos nem outros apetrechos democráticos disponíveis. Não basta, exceto para efeito de registro civil, ter nascido em Minas sem agir ao feitio mineiro. O aprendizado é longo. Não foi por acaso, portanto, que se criou a categoria especial de mineiros nascidos fora de Minas, pouco referidos por esse lado. Alardear para quê? Fazer inveja?

Exemplo oportuno: tendo nascido e morrido no Rio, Francisco Clementino de San Thiago Dantas (1911-1964) era considerado mineiro do melhor quilate, mas nascido fora de Minas não fazia alarde. Elegeu-se deputado por Minas, foi descuidado e não demorou a ficar de olho comprido no Palácio da Liberdade. Chegou a flertar com o Catete. Não era o único, e se atrapalhou. (Machado de Assis seria a mais completa figura de mineiro nascido fora das Gerais, mas a prioridade dele era outra. Via a política com olhos mineiros de cronista parlamentar. Conviria à candidata Dilma e seu padrinho Lula lerem, em dueto, O Velho Senado, onde Machado trabalha com um Brasil anterior a Lula, e que nada fica a dever à História que nasceu e se criou antes dele).

A candidata Dilma Roussff já deve ter percebido que lhe falta muito para se dar bem com os mineiros e ser reconhecida como um deles. Lula pode estar com a avaliação em alta nas pesquisas, mas não sendo candidato senão a ex-presidente, pode inclusive jogar votos fora pelo ladrão, mas o eleitor das montanhas olha de lado e faz que não vê a candidata que quis tirar proveito do centenário do presidente Tancredo Neves e se deu mal. Aquelas murchas flores de retórica depositadas no túmulo de Tancredo Neves e o anátema lançado aos exilados, inclusive petistas, foram a anti-campanha se antecipando ao previsível. Faltou-lhe intimidade com a transição da ditadura para a democracia. E a aflição com que se explicou piorou a versão. Ainda não aprendeu a tirar proveito do silêncio.

Dona Dilma não arriscou sequer um verbo no condicional para ajeitar a situação. Fez de conta que o problema de explicar o passado é da conta do PT e o dela é catar votos para satisfazer a pressa de Lula em operar no futuro. A ressalva para tirar o corpo fora da contradição entre eleição e revolução se complicou quando, sem puxar o freio de mão, a candidata mirou em José Serra e acertou nos exilados da cota do PT, ao negar-lhes a coragem de ficar e detonar a ditadura da maneira possível, qual fosse, pelas armas.

Tudo indica que Dilma Rousseff não se lembrou de ser, ou parecer, pelo menos em Minas, como os mineiros. O elogio da candidata do PT a Tancredo Neves não podia prescindir da explicação indispensável, pois o comportamento do petismo, incluindo o próprio Lula, não considerou que a via indireta era a única, e não apenas para levar ao Planalto o candidato da oposição, mas também para facilitar a retirada dos governantes pelo voto indireto (o único possível àquela altura em que a oposição subia e os ocupantes do poder desciam inapelavelmente por gravidade).
O câmbio ao par pagava com a mesma moeda a dívida democrática acumulada em vinte anos.

Em Minas, como os mineiros, esperava-se de dona Dilma alguma familiaridade com os valores políticos de que a História não abre mão. Lula e Dilma ainda não entenderam que devem explicação reparadora da avaliação equivocada da época que os deixou à margem do curso histórico, que também não passa duas vezes pelo mesmo lugar. O mineiro venceu a ditadura com a arma que ela escolheu

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