O Globo
O ministro do Supremo mostra que não tem
nenhum tipo de amarras, nem mesmo com o governo
Muitos parlamentares passarão o fim de ano sem os presentes que prepararam para si próprios e para os seus. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Flávio Dino acabou com a festa das emendas parlamentares antes do Natal, e fez muito bem. Suas decisões não foram seguidas pelo Congresso. O Parlamento achou que podia dar um jeito, driblar as exigências de transparência, de definição clara de quem envia o dinheiro, para quem e por quê. Exatamente para evitar o que acontecia — o dinheiro ir para municípios sem destinação prévia e sem obrigação de prestação de contas —, uma farra com o dinheiro público que tinha de ser controlada.
Dino mostra que não tem nenhum tipo de
amarras, nem mesmo com o governo, porque, para o governo, a melhor coisa a
fazer seria liberar o dinheiro e deixar o Congresso feliz. Me parece uma
alucinação a teoria conspiratória de que ele está de conluio com o governo para
enfrentar o Congresso. Seria tudo uma farsa: a Advocacia-Geral da União (AGU)
entrar com processo contra o Supremo, rejeitado por unanimidade pelo plenário;
a decisão do governo de liberar uma verba de R$ 4,2 bilhões; a resposta de Dino
ao mandar suspender o pagamento já no recesso parlamentar.
Pela teoria, Dino estragou a festa de todo
mundo em conluio com o presidente Lula. Se esse esquema fosse comprovado, ou
Dino, ou Lula, ou ambos seriam gênios políticos, e o presidente da Câmara,
Arthur Lira, teria de tirar o chapéu para os adversários e se retirar de cena
com o rabo entre as pernas. Já haviam atribuído ao mesmo Dino, quando ministro
da Justiça, o maquiavelismo de deixar a baderna de 8 de janeiro de 2023 correr
solta, para prender os bolsonaristas numa armadilha.
Convenhamos, essas teses só fazem fortalecer
a imagem dele, a quem muitos atribuem o desejo de se candidatar à Presidência
da República em 2026. Prefiro imaginar que Dino atue dentro da linha correta,
que deve ser seguida: obrigar a distribuição de emendas a ser transparente,
clara e auditável. Além do mais, a decisão dele só foi possível porque partidos
políticos — PSOL e Novo — de espectros distintos entraram com ação no Supremo
denunciando irregularidades na distribuição de emendas.
O ofício ao governo federal subscrito por 17
líderes partidários da Câmara dos Deputados, com a indicação de 5.449 emendas
totalizando R$ 4,2 bilhões, acusam os partidos, foi feito “sem aprovação prévia
e registro formal pelas comissões, sob o pretexto de ‘ratificar’ as indicações
previamente apresentadas pelos integrantes das comissões”.
Destaca o PSOL que “houve suspensão das
atividades de todas as comissões permanentes até o dia 20 de dezembro,
inviabilizando a apreciação de emendas e o cumprimento do rito legal”. Sobre o
mesmo fato, manifestou-se o amicus curiae Partido Novo, segundo o qual, “a
pretexto de ‘ratificar’ indicações previamente aprovadas pelas Comissões da
Câmara a título de emendas de comissão (RP8), os subscritores estariam tentando
modificar a seu talante as indicações previamente encaminhadas pelos
presidentes das comissões, bem como suprimir e acrescentar outras”. Além dos
partidos políticos, outras instituições entraram na ação, como o Instituto Não
Aceito Corrupção, a Transparência Internacional e a Transparência Brasil.
O Papai Noel do Ancelmo
Depois de muitos anos, deixei de participar dos pedidos de Papai Noel organizados tradicionalmente pela coluna do meu amigo Ancelmo Gois. Por culpa minha, pois perdi a data fatal, desleixo que, espero, possa ser perdoado pelo intermediário e pelo Bom Velhinho. Gostaria de pedir que Papai Noel ajude o país a voltar aos trilhos, não falo nem do equilíbrio fiscal, nem da alta do dólar. Falo na convivência pacífica entre os diferentes e na possibilidade de termos em 2026 uma eleição que nos livre de uma polarização odiosa que estreita nossos caminhos como nação.
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