Folha de S. Paulo
A forma de organização é uma inovação
política alinhada ao espírito algorítmico de nossos tempos
O PL (Partido Liberal), legenda que
abriga Jair
Bolsonaro desde 2021, é apenas um hospedeiro institucional do
bolsonarismo. Sua verdadeira organização política é uma máquina digital de
poder descentralizada, com base digital e estratégias próprias, que opera à
margem das regras formais da política.
Tal forma de organização é uma inovação
política que nasceu alinhada ao novo espírito algorítmico de nossos tempos. Daí
o nome: "partido digital".
É o que argumentam pesquisadores do Centro para Imaginação Crítica do Cebrap (CCI/Cebrap) que, em parceria com o Instituto Democracia em Xeque e o Projeto Brief, realizaram uma série de levantamentos de dados para demonstrar por que faz sentido falar em partidos digitais.
"O bolsonarismo não é apenas um grupo de
apoio a um líder, mas uma forma organizativa nascida no ambiente digital, que
hackeia o sistema partidário tradicional para a disputa política
eleitoral", explica Ana Cláudia Chaves Teixeira, pesquisadora do
CCI/Cebrap e professora de ciência política da Unicamp. "Ao operar em
paralelo, o partido digital contorna as legislações eleitorais, modos de
financiamento, bem como consegue operar de maneira nova a mobilização de sua
base."
É justamente tal modo de organização política
que teria permitido a hegemonia política de Bolsonaro no campo das direitas sem
a necessidade de um partido próprio ou de vínculos estreitos com lideranças
políticas tradicionais. E, mais importante, mantendo um discurso antissistema
radical.
Desde o início de sua vida política, Bolsonaro
já passou por oito partidos. A agremiação em que permaneceu mais tempo foi
o PP, fundado a partir de setores da Arena
(Aliança Renovadora Nacional), partido de sustentação da ditadura
militar.
Quando se tornou a principal liderança
política da extrema direita brasileira, Bolsonaro estava abrigado no PSC
(Partido Social Cristão). Na época, de 2016 a 2018, o partido havia começado a
receber um grande influxo de jovens querendo se filiar, algo até então inédito
para siglas fisiológicas de direita. A maioria se declarava fã de Bolsonaro
e Olavo
de Carvalho.
Para viabilizar sua candidatura à
Presidência, o partido pagou um curso de media training para Bolsonaro
para amenizar seu estilo agressivo. Além disso, para aproximá-lo do eleitorado
evangélico, o então líder do partido, Pastor Everaldo, da Assembleia de
Deus, batizou
Bolsonaro, que é católico, no rio Jordão, em Israel.
Porém a radicalidade de Bolsonaro impediu sua
permanência na sigla. A gota d’água foi uma aliança com o PC do B que
possibilitou a eleição de um evangélico e de três vereadores comunistas. Depois
disso, o bolsonarismo tentou se organizar em um partido único por duas vezes
com duas siglas: Patriota e Aliança
Brasil. Foi um fracasso retumbante.
De fato, os políticos bolsonaristas
dificilmente conseguem se sentir representados por qualquer uma das siglas de
direita brasileiras. Afinal, ao contrário da maioria dos políticos brasileiros,
os bolsonaristas mais aguerridos querem fazer a grande política. E, para
disputar corações e mentes hoje, as redes são imprescindíveis, os partidos
tradicionais, não.
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