Folha de S. Paulo
Diretores nomeados pelo governo anterior
votam por corte menor da Selic
A decisão
do Banco Central vai causar algum bafafá político e talvez certo
tremelique financeiro. A direção do BC baixou a Selic de
10,75% para 10,5% ao ano, como era esperado na praça do mercado, em vez de 0,5
ponto percentual, toada em que vinha desde agosto do ano passado.
A redução do ritmo de corte da taxa básica
de juros causaria
os protestos estereotipados e os insultos de sempre —de empresários, PT, governo. O
tremelique virá do fato de que a decisão de frear a queda da Selic foi por 5
votos a 4.
Justamente cinco votos dos diretores nomeados por Jair Bolsonaro ante quatro votos dos nomeados por Luiz Inácio Lula da Silva.
Roberto
Campos Neto, presidente do BC, "esse cidadão", segundo Lula,
votou de um modo. Gabriel
Galípolo, diretor de Política Monetária, cotado para suceder
a Campos Neto, votou de outro. Paulo
Picchetti, economista respeitado e especialista em inflação, nomeado por
Lula, votou como Galípolo.
Sabe-se que Lula tem simpatia por Galípolo,
que foi vice de Fernando
Haddad no Ministério
da Fazenda e ajudou o ministro a convencer o presidente da República
de que era preciso adotar medidas de prudência no gasto do governo.
De qualquer modo, vai parecer divisão
política, não interessam argumentos razoáveis. Vai parecer divisão política
tanto para o governo quanto para os donos do dinheiro e seus operadores. Por
ora, não tende a dar grande problema, mas a fofoca não ajuda.
Faz tempo, entre os povos dos mercados, se
difundira a ideia de que os nomeados por Lula pegariam mais leve com a Selic. O
PT e o governo quase inteiro, por sua vez, estavam convictos de que Campos Neto
e turma conspiravam contra Lula 3.
Pode ser que a divisão do Copom (Comitê
de Política Monetária) seja circunstancial e que os votos pelo corte maior ou
menor tenham motivos razoáveis, "técnicos", como diz o clichê
exagerado a respeito desse tipo de decisão.
Não quer dizer que tais definições não sejam
ou não possam ser em alguma medida "políticas". Mais importante é que
a "técnica", teoria e estatística, não é capaz de nos orientar
decisivamente em tamanha minúcia (0,25 ponto em vez de 0,5 ponto).
Tudo isso posto, a divisão do BC na decisão
desta quarta-feira (8) vai confirmar prognósticos ou preconceitos: diretores
lulianos estariam dispostos a correr riscos com taxas de juros mais baixas e,
no limite, seriam mais moles, "dovish", com a inflação. Até que se
dissipe essa impressão, o que leva tempo, as taxas de juros de vários prazos
podem ficar um tanto mais salgadas (tudo mais constante).
No atacadão do mercado de dinheiro, as taxas
básicas de juros com prazo superior a um ano estão mais altas do que em agosto
de 2023, quando o BC começou a talhar a Selic (a taxa em que o BC interfere
diretamente, de curtíssimo prazo).
Além da política, não há novidade relevante
no comunicado em que o Banco Central comentou
sua decisão. Leitores de borras de café e outros hermeneutas da finança vão se
ocupar das vírgulas. No que interessa para a vida real, não há nada digno de
grande nota.
O mundo está mais perigoso,
"adverso", diz o comunicado, pois a taxa de juros vai demorar mais a
cair nos EUA. As taxas
de juros americanas influenciam o nível do piso das taxas brasileiras:
quanto maiores por lá, maiores tendem a ser por cá.
Com diferenças menores e mais duradouras
entre taxas americanas e brasileiras, mais provável que o real permaneça
desvalorizado (o que não é lá bom para a inflação).
Cereja desse bolo azedo (para o BC) é uma
economia mais aquecida por aqui e o fato de que déficit e dívida do
governo brasileiro não vão cair tão cedo. Por fim, no cenário de referência do
BC, a previsão para o IPCA de 2025 aumento um tico, para 3,3% (a meta é de 3%).
Um comentário:
Lendo e aprendendo.
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