Democracia é a melhor resposta para mediar conflitos
O Globo
Eleitorado que vai às urnas reúne demandas
diversas, mas é possível — e necessária — convivência entre visões opostas
Neste domingo, quase 156 milhões de
brasileiros estão aptos a exercer seu direito de cidadania, cumprindo o ritual
democrático de comparecer às urnas para escolher os prefeitos que governarão
sua cidade pelos próximos quatro anos, seguindo à risca o plano de governo
apresentado durante as campanhas e chancelado pelo voto. Elegerão também os
vereadores responsáveis por formular as leis que nortearão o dia a dia das
cidades e de seus moradores. O voto é o momento que o cidadão tem para se fazer
ouvir.
Desse eleitorado, 52% são mulheres, a maior
parte está na faixa de 45 a 59 anos (25%) e quase metade (43%) vive na Região
Sudeste. Trata-se de contingente diverso, que desafia o discurso polarizado,
por vezes agressivo, que anima embates nas redes sociais, a propaganda
eleitoral ou mesmo debates em que nem sempre prevalecem a civilidade, a
sensatez e o tom propositivo.
Um retrato dessa diversidade e da convivência
entre diferentes perfis e posições políticas no país está na série de
reportagens da GloboNews “A cara do Brasil”, exibida também no Jornal Nacional
nos dias que antecederam a eleição. Repórteres conversaram com moradores nas
cinco regiões do país para conhecer suas expectativas, posições políticas e
entender como convivem com quem pensa diferente. Fica claro que, longe do
ambiente conflagrado das redes sociais, o entendimento é possível.
Em Manaus (AM), a família do ex-goleiro Edmilson Brabo, que se define como de direita, vive numa mesma vila. Foi a maneira encontrada para compartilhar as despesas, como explica o filho Abrahão Nicolas Brabo. “A gente precisa pagar conta de luz, conta de água, se alimentar todos os dias. O almoço às vezes é feito lá [na casa do pai], às vezes é feito aqui. A gente se une para ser família”, diz Abrahão. “A gente tem diferentes convicções políticas, mas convive de forma harmoniosa, como deveria ser a sociedade.” À pergunta sobre o que une o Brasil, Abrahão responde: “Todos nós temos um sonho de vencer, de ter um emprego, uma boa casa, um carro, poder trabalhar de forma digna”.
Também no Amazonas, a líder comunitária
Raimunda Ferreira Viana, moradora da comunidade do Catalão, localizada no
município de Iranduba, a cerca de 40 quilômetros de Manaus, conta que o
agrupamento, que reúne 400 moradores em casas flutuantes no Rio Negro, mantém
um grupo de WhatsApp em que as diferenças políticas não importam: “Tem de tudo:
esquerda, direita, direita, esquerda. Todo mundo sabe quem é quem. Tu é
esquerda, tu é direita. Na eleição presidencial, começavam com brincadeiras.
[Eu dizia] Não, vamos deixar para lá. A gente nunca se desentendeu”.
Em São Paulo, os motofretistas Luiz Ricardo
Lira da Silva Souza e Eliel da Silva Estêvão Bezerra têm posições políticas
distintas, mas isso não afeta a convivência dos dois. “É filho brigando com o
pai, pai com o sobrinho que não fala com o tio por causa de questões
ideológicas que não vão mudar em nada nossa vida. Independentemente se ele é de
direita, se eu sou de esquerda, se ele tem uma visão A e eu uma visão B, no
final estamos no mesmo barco”, diz Eliel. Luiz Ricardo afirma que sua única
bandeira é a do Brasil: “Só tem uma pauta que eu defendo, a do ser humano. Que
se criem leis para todos nós, não se crie uma lei para uma classe, uma
minoria”.
Em São Luiz (MA), a sensação de insegurança é
queixa comum da síndica profissional Nara Nunes e do coreógrafo e dançarino
Egnaldo Gomes, mas os caminhos apontados como solução são diferentes. “Quanto
menos crianças nas ruas, quanto menos jovens nas drogas, quanto menos pessoas
em vulnerabilidade social, menos pessoas nós teremos na criminalidade”, diz
Egnaldo. Nara defende mais rigor no policiamento: “Eu já tive situações em que
o ladrão entrou três vezes no meu apartamento. Levou notebook, celular. Tive de
botar grade”.
Esse eleitorado diverso, complexo, repleto de
nuances, é cortejado por 15.573 candidatos a prefeito em 5.569 municípios
brasileiros e por mais de 431 mil postulantes às 58 mil cadeiras nas câmaras
municipais. O desafio desses políticos é oferecer respostas satisfatórias às
demandas de diferentes naturezas que afligem os eleitores. Elas não são iguais
— e nem poderiam ser, diante de um país com tantos contrastes. A despeito de
problemas comuns, as prioridades de Raimunda na comunidade flutuante do Catalão
não são as mesmas dos motofretistas Eliel e Luiz Ricardo em São Paulo.
O pavimento esburacado, a rua que alaga toda
vez que chove, a iluminação precária que traz insegurança, o ônibus que demora
a passar, o posto de saúde que não funciona, a creche prometida que não veio, a
escola sem professor ou o lixo acumulado nos logradouros não são questões de
direita, de esquerda ou de centro. São problemas concretos que precisam ser
resolvidos, independentemente de ideologias. Os serviços têm de funcionar,
mesmo com orçamentos apertados. Por isso mesmo, exigem gestões eficientes.
Não há uma fórmula pronta para lidar com a
miríade de demandas de eleitorado tão plural e multifacetado. Mas inegavelmente
os candidatos deveriam se mirar no exemplo de convivência que vem dos eleitores
comuns. Não foi sempre isso o que se viu na campanha de algumas cidades. A
reportagem da GloboNews e do JN mostrou que os candidatos têm muito a aprender.
Divergir e propor ideias, sim. Estimular o ódio, jamais.
SP tem disputa agressiva entre 3 candidatos
vulneráveis
Folha de S. Paulo
Boulos e Marçal têm mais rejeição que
intenções de votos, segundo o Datafolha; Nunes não alavanca aprovação a sua
gestão
Por simbolismo, mas também por motivos
concretos, a eleição para prefeito da maior cidade brasileira tende a ganhar
dimensões nacionais. Nela costumam se envolver as principais forças políticas
do país —como ocorre agora. Seus vencedores, e mesmo alguns dos derrotados, são
tidos como candidatos naturais a voos mais altos.
A disputa deste ano em São Paulo,
que terá sua primeira rodada decisiva neste domingo (6), mostrou-se
particularmente árdua, agressiva e, ainda neste momento,
imprevisível. Os três candidatos que a encabeçam tiveram suas fragilidades, até
mais do que suas forças, expostas à exaustão durante a campanha.
Na véspera da abertura das urnas, o Datafolha aponta,
mais uma vez, a
liderança compartilhada entre o deputado federal Guilherme
Boulos (PSOL),
com 27% das intenções de voto, o atual prefeito, Ricardo Nunes (MDB), com 24%,
e o neófito Pablo Marçal (PRTB),
que também marca 24%. Em votos válidos, são 29%, 26% e 26%, respectivamente.
Do trio, só Nunes não conta com menos
eleitores dispostos a endossar sua candidatura do que avessos a ela —na margem
de erro. Sua taxa de rejeição de 25% o torna favorito num segundo turno. Mas
chegar lá será difícil.
Mesmo contando com a máquina pública e
dinheiro em caixa, com quase dois terços do tempo de propaganda em rádio e TV,
com o apoio decidido do governador Tarcísio de
Freitas (Republicanos) e nem tão decidido do
ex-presidente Jair
Bolsonaro (PL), o prefeito não
consegue mais do que modestos índices de aprovação à gestão da cidade.
Boulos, derrotado no segundo turno há quatro
anos, ampara-se na aliança com o presidente Luiz Inácio Lula da
Silva (PT).
Numa cidade onde é expressiva a rejeição a teses de esquerda, o psolista tem
feito esforços pouco frutíferos para reduzir o contingente de 38% que dizem não
votar nele em nenhuma hipótese.
Embora mantenha o ataque ao bolsonarismo,
procurou se afastar de bandeiras de seu partido, da defesa da ditadura venezuelana
até o direito ao aborto.
Suas críticas à atual administração municipal têm mais teor gerencial do que
ideológico.
Grande surpresa da campanha, Marçal atraiu
votantes bolsonaristas, evangélicos e antissistema com uma combinação de
conservadorismo religioso e provocações não raro caluniosas dirigidas aos
adversários. Sem acesso à propaganda oficial, valeu-se das redes sociais e do
número recorde de debates.
Seu comportamento arruaceiro também lhe
rendeu a repulsa por
parte de mais da metade (53%) do eleitorado paulistano —e o
ex-coach não parece reunir ideias para mudar esse quadro.
Vislumbram-se, pois, três cenários possíveis
de segundo turno, cada qual com implicações políticas muito diferentes. Em
qualquer hipótese, o cidadão paulistano merece um escrutínio mais aprofundado
dos planos efetivos dos candidatos para a cidade.
Estado precisa assegurar direitos no cárcere
Folha de S. Paulo
Relatório revela situação degradante nas
prisões de SP; urge ação integrada entre secretarias para enfrentar problema
A situação no cárcere paulista se assemelha a
um roteiro de filme de terror, e não apenas devido à superlotação
das unidades prisionais. É o que mostra o relatório do
Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT),
órgão federal independente previsto na legislação brasileira.
Divulgado na última terça-feira (1º), o
documento é resultado de vistorias realizadas por 11 peritos em seis presídios,
duas unidades socioeducativas e três instituições de saúde mental
no estado em outubro de 2023.
Foi encontrada uma miríade de problemas.
Alguns deles, estruturais, são recorrentes e conhecidos, mas não menos
impactantes: mofo nas celas, falta de ventilação ou luz, calor extremo e
superlotação a ponto de detentos sentirem falta de ar, além de exposição a
ratos e baratas.
Outros, de ordem correcional, revelam abuso
de força para disciplinar os presos, como uso de canos de ferro, bombas de gás
e spray de pimenta por agentes penitenciários —e até mesmo um local chamado
"masmorra", onde adolescentes internos na Casa São Paulo seriam
algemados e submetidos a agressões.
Também é preocupante o descaso com a saúde
nas unidades prisionais, que vai desde o fornecimento de comida estragada até a
ausência de medicamentos e de atendimento médico. São casos de presos com
membro necrosados, fratura exposta à espera de cirurgia por três anos, em
inanição por causa de maxilar quebrado e presidiárias grávidas sem acesso ao
pré-natal.
O relatório aponta, ainda, o encaminhamento
de pessoas com transtornos mentais para presídios comuns e recomenda o fim da
Unidade Experimental de Saúde, que nem sequer seria credenciada no SUS, segundo o
MNPCT.
O órgão estipulou 341 recomendações ao
governo de Tarcísio de
Freitas (Republicanos) para enfrentar problemas nas áreas de
saúde, assistência social e jurídica e de direitos
humanos. Entre elas, está a criação de um sistema estadual de
prevenção e combate à tortura que possa realizar vistorias periódicas sem
aviso.
Tal dispositivo em unidades federativas, que
pode se dar na forma de comitês, está previsto na lei de 2013
que instituiu o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura —estados
como Rio de
Janeiro, Pernambuco e Roraima já têm iniciativas do tipo.
De todo modo, seja por meio de órgão específico ou de ações integradas, urge melhorar as condições de vida nos presídios para garantir os direitos básicos dos detentos. É o que a lei exige e cabe ao governo paulista cumprir.
Voto não é ‘curtida’
O Estado de S. Paulo
Quando a esbórnia da campanha acabar, o
vencedor terá de administrar uma cidade gigantesca com milhões de moradores,
não um perfil irresponsável de rede com milhões de seguidores
Ao irem às urnas hoje, os eleitores devem ter
em conta que governar São Paulo não é um “experimento” tampouco um
“laboratório” para coisa alguma. Idoneidade moral, capacidade administrativa,
habilidade política, prudência e espírito público são atributos indispensáveis
para uma boa gestão de qualquer cidade. Em uma megalópole como São Paulo, a
falta de uma dessas competências pessoais em seu prefeito – apenas uma – já
imporia custos severos aos munícipes que mais dependem do poder público para
ter acesso ao básico para uma vida digna.
O alerta é necessário porque a campanha do
primeiro turno foi marcada não só pela indigência dos debates, mas
principalmente pela desmoralização do próprio eleitor, reduzido à condição de
seguidor de rede social cuja “curtida” foi disputada literalmente a tapa por
alguns candidatos absolutamente desqualificados, sobretudo o sr. Pablo Marçal.
Tal comportamento contraria muitos dos
valores que este jornal defende. Para o Estadão, a política é
essencialmente a persuasão pela palavra, num confronto de ideias regulado por
leis e por padrões mínimos de civilidade. É dever dos que disputam cargos
eletivos preservar a sanidade do espaço público, em que todos se submetem aos
mesmos limites, em nome do bem comum. O exercício do poder por parte de quem
não conhece esses limites carece de legitimidade.
São Paulo não admite despreparo, muito menos
o exercício de uma vaidade desmedida e irresponsável. Basta sair às ruas e,
para onde quer que se olhe, lá estarão os inúmeros desafios e potencialidades
desta grande cidade a reclamarem a dedicação exclusiva e a competência de quem
se dispõe a administrá-la. Hoje, milhões de eleitores vão às urnas para
escolher prefeitos e vereadores, não influenciadores ou coaches. Escolhas
políticas devem decorrer de uma detida análise da experiência dos candidatos,
suas propostas e suas associações, haja vista que geram consequências por, no
mínimo, quatro anos.
Aqui vivem cerca de 11,5 milhões de
habitantes, uma população maior que a de alguns países. Para 2025, prevê-se um
orçamento de quase R$ 120 bilhões, montante recorde na história da cidade de
São Paulo. O cuidado com essas pessoas e o bom manejo dos recursos públicos
exigem dos candidatos à Prefeitura um plano de governo digno do nome, vale
dizer, um diagnóstico preciso dos problemas urbanos e a formulação das
políticas públicas mais indicadas para resolvê-los.
Isso soa óbvio, mas é algo que o Estadão se
vê compelido a relembrar neste dia crucial para o futuro da capital paulista
porque esta, afinal, é a eleição que foi parar numa delegacia de polícia. É
possível inferir que os paulistanos conheçam relativamente bem os candidatos à
Prefeitura, mas quase nada foi dito sobre ideias para governar a cidade mais
rica do País. Como é notório, ofensas pessoais e violência física deram o tom
de uma campanha absolutamente estéril.
A despeito de sua pujança econômica, São
Paulo ainda é uma cidade com problemas muito sérios na oferta de serviços
públicos nas áreas de saúde, educação, transporte e zeladoria urbana – sem
falar, claro, na segurança pública. É responsabilidade do governo do Estado
prover a segurança aos cidadãos, mas é fundamental o papel que a Prefeitura
exerce na redução dos indicadores de violência. Ou seja, São Paulo precisa de
boa governança.
E a governança de São Paulo exige habilidade
política, uma qualidade que obviamente falta aos aventureiros cuja única
promessa de campanha é destruir o “sistema”, na base da ofensa, da violência e
da desfaçatez. Certamente há eleitores para os quais a política é
intrinsecamente corrupta e abjeta, razão pela qual se encantam com os que
pretendem desmoralizá-la. Mas, quando a esbórnia da campanha acabar, o vencedor
terá que administrar uma cidade gigantesca e complexa com milhões de moradores,
e não um perfil irresponsável de rede social com milhões de seguidores.
Então, nesse momento, o voto dado de maneira
inconsequente cobrará seu preço.
O autoritarismo custará caro ao México
O Estado de S. Paulo
Ambições autocráticas de Obrador e seus
acólitos, incluindo a nova presidente, estão destruindo não só as liberdades
políticas dos mexicanos, mas suas oportunidades econômicas
Por 70 anos o México viveu sob o regime de um
partido único, sem os contrapesos do Legislativo e do Judiciário. Nos anos 90,
as pressões de uma sociedade civil complexa, educada e sedenta de pluralismo
forçaram o Partido Revolucionário Institucional (PRI) a fazer concessões e
reformas estabelecendo instituições eleitorais e judiciais independentes.
Agora, o país caminha a passos largos para hipertrofiar o Executivo e
concentrar poder no partido incumbente, o Movimento Regeneração Nacional
(Morena), fundado por Andrés Manuel López Obrador (AMLO), que no dia 1.º
encerrou seu mandato presidencial de seis anos, passando a faixa para sua
pupila, Claudia Sheinbaum. Um partido único está sendo reinstaurado – só que
desta vez pode ser pior.
O PRI mutilou as liberdades políticas dos
mexicanos e controlava as eleições, mas era disciplinado e construiu
instituições e burocracias profissionais. A agenda do Morena vai na direção
oposta.
AMLO sufocou o Instituto Nacional Eleitoral
(INE) e manipulou as regras para favorecer seu partido. Nas eleições de junho,
elegeu Sheinbaum com ampla margem. A coalizão de esquerda liderada pelo Morena
obteve 54% das cadeiras na Câmara dos Deputados, mas um INE já aparelhado
distorceu as regras de representação, concedendo-lhe 74% das cadeiras e uma
supermaioria no Senado.
Em setembro, quando AMLO ainda era presidente
e a nova legislatura assumiu, ele tentou aprovar 18 emendas constitucionais
para, entre outras coisas, eliminar agências independentes, banir parcerias de
estatais com a iniciativa privada, ampliar a ingerência das Forças Armadas na
segurança pública, erguer barreiras a investimentos e ao comércio internacional
e reduzir prerrogativas de partidos minoritários. O tempo não foi suficiente
para aprovar o pacote, mas Sheinbaum promete encaminhá-lo, e a mais perniciosa
das reformas, a do Judiciário, foi aprovada.
Em três anos, todos os magistrados e
ministros da Suprema Corte serão removidos, e passarão a ser eleitos por voto
popular. Os candidatos serão pré-selecionados pelo Executivo e o Legislativo,
as exigências profissionais serão mínimas e um “tribunal disciplinar” terá
poderes para punir os indóceis. Além do poder oficial, o poder paralelo do
narcotráfico terá amplas oportunidades de influenciar as escolhas através do
dinheiro e da violência.
AMLO e seus acólitos replicam o manual de
outros candidatos a déspotas, como Viktor Orbán, na Hungria. Nesses casos, a
democracia não é derrubada à força de golpes e tanques na rua, mas por erosão
intestina. O México mostra que essa destruição da democracia por meios
democráticos não é prerrogativa de alguma região ou ideologia. Pode acontecer
na Europa ou América Latina, à esquerda ou à direita. Mas nenhum país é uma
ilha, muito menos um país grande, mas em desenvolvimento, como o México, ou um
país desenvolvido, mas pequeno, como a Hungria. O autoritarismo tem custos, e
já se fazem sentir.
A União Europeia tem encontrado meios de
neutralizar e isolar Orbán. As políticas de AMLO estão sangrando a economia
mexicana. Seu governo teve as piores taxas de crescimento neste século: o Banco
Central prevê 1,5% neste ano e 1,2% no próximo. O peso está em queda e o
déficit está acima de 5%, o maior desde os anos 80. Agências de risco advertem
para um aumento do prêmio, e a mídia e o governo dos EUA, país que tem US$ 144
bilhões investidos no México e recebe 80% de suas exportações, alertam que a
reforma judicial não só mina a proteção de direitos humanos e o acesso
imparcial à justiça, como inviabiliza os negócios. Outras reformas no pacote do
Morena violam o acordo de livre comércio com EUA e Canadá, que expira em 2026 e
precisa ser renegociado.
Uma parcela da população mexicana está
revoltada. Se não for capaz de mobilizar seus conterrâneos e reverter a
destruição do Estado Democrático de Direito em curso, seu país provará uma das
mais amargas lições da História: que a combinação da concentração do poder
político com a penúria econômica leva inexoravelmente ao recrudescimento da
tirania ou à ruptura pela anarquia.
EAD carece de regras
O Estado de S. Paulo
Única opção de ensino para milhares,
modalidade deve ser aperfeiçoada, não demonizada
O mais recente censo da educação superior
revela que o número de matrículas universitárias no Ensino a Distância (EAD)
praticamente equivalia ao do ensino presencial em 2023 – dos 9,9 milhões de
estudantes do ensino superior, 4,9 milhões estavam no EAD, ante 5,06 milhões no
presencial, de acordo com levantamento recém-divulgado pelo Ministério da
Educação (MEC). Os dados demonstram que é questão de tempo para que o EAD
ultrapasse o presencial, razão pela qual demonizar a modalidade, que para
muitos brasileiros é a única opção de avançar nos estudos, é contraproducente.
Uma devida regulação e inspeção dos cursos, contudo, é mais do que necessária.
É verdade que o contato pessoal, essencial em
diversas esferas da vida, é ainda mais relevante quando se está aprendendo; a
proximidade entre professor e aluno, entre os próprios estudantes e o debate de
ideias e conceitos são amplamente mais ricos no modelo presencial. Mas também é
verdade, e a pandemia de covid-19 é prova disso, que as ferramentas online
evoluíram imensamente, sendo possível oferecer conteúdo sólido e de qualidade
via EAD. Some-se a isso o contexto brasileiro, de inexistência de estabelecimentos
de ensino em regiões onde há demanda ou de alunos que têm de escolher entre se
locomover ou estudar.
Daí a necessidade de que o MEC atue de modo a
garantir um EAD sólido e de qualidade, e não apenas buscar limitar a opção. Não
parece ser o que vem ocorrendo. O ministro da Educação, Camilo Santana, não
participou da divulgação do censo, pois estava ocupado com a campanha para as
eleições municipais em seu Estado, o Ceará. Já o secretário executivo do MEC,
Leonardo Barchini, afirmou que a pasta é contra o EAD, e que as matrículas na
modalidade estão explodindo “por conta dessa regulação que estamos revendo hoje”.
A regulação, de fato, não vem avançando
muito. “A gente tinha um documento de 2007 e precisava rever toda essa
situação”, disse a secretária de regulação do MEC, Marta Abramo, alegando que a
pasta está reavaliando parâmetros de qualidade do segmento EAD, sem detalhar
quando esses padrões serão divulgados.
O ministro, agora ocupado com compromissos
outros, havia dito no ano passado que o MEC criaria uma agência para regular o
ensino superior. Em janeiro deste ano, em entrevista ao Broadcast/Estadão,
Santana declarou que o governo pretendia “criar um marco regulatório para a
educação a distância”; proposta que nunca saiu do papel. A pasta afirma que
está “finalizando um projeto de lei” a ser enviado ao Congresso até o fim do
ano, talvez sem atentar que já estamos no último trimestre de 2024.
De concreto, apenas uma resolução de maio do Conselho Nacional de Educação (CNE) determinando que cursos de licenciatura EAD devem oferecer 50% das aulas de forma presencial. Há uma preocupação especial, e legítima, com a formação de professores, já que o curso de Pedagogia lidera em matrículas EAD. Mas, a julgar pelas prioridades do ministro e pela demora no envio de propostas ao Congresso, o avanço desse modelo seguirá desregulado.
Eleições municipais são alicerce da nossa
democracia
Correio Braziliense
Se olharmos para a maioria dos nossos
vizinhos e outros países, sobretudo para a Venezuela, essa é uma prova
admirável de que a democracia brasileira é robusta
Hoje, 155,9 milhões de eleitores estão aptos
a comparecer às urnas e eleger seus prefeitos e vereadores. Cerca de 400 mil
candidatos, sendo 13.997 a prefeito, e 379.320 a vereador disputam as
eleições. Eventualmente, cidades com mais de 200 mil eleitores, entre as
quais as capitais, realizarão um segundo turno, caso o candidato mais votado
neste domingo não tenha alcançado 50% mais 1 dos votos.
Não é trivial realizar num só dia eleições em
5.569 municípios espalhados pelo país. São 500.183 seções eleitorais que
precisam ser instaladas com segurança e mesários acima de qualquer suspeita,
cada qual com sua eletrônica, que garante o sigilo do voto e apuração à prova
de fraudes, com a divulgação dos resultados no mesmo dia. Se olharmos para a
maioria dos nossos vizinhos e outros países, sobretudo para a Venezuela, essa é
uma prova admirável de que a democracia brasileira é robusta.
A propósito, sua resiliência vem sendo posta
à prova, seja pelo questionamento da urna eletrônica, seja pelas tentativas de
tumultuar ou desrespeitar a vontade das urnas. Entretanto, a vontade popular
vem sendo vitoriosa. Essa segurança no processo eleitoral é um fator de
inclusão da sociedade no processo político, com destaque para as mulheres.
Hoje, elas representam 52% do total de eleitores.
A região Sudeste é a que concentra o maior
eleitorado do país: 66.906.335 (quase 43% do total). Em seguida, vêm a região
Nordeste, com 43.302.692 (27,7%); a Sul, com 22.969.108 (14,7%); e a Norte, com
12.987.166 (8,3%). A região Centro-Oeste, com 9.747.379, representa pouco mais
de 6% do total do eleitorado. São Paulo continua a ser o maior colégio
eleitoral do Brasil, com 34.403.609 eleitores (22%).
O voto é obrigatório para 135,3 milhões de
eleitores. A maior parte está na faixa etária de 45 a 59 anos, que somam 3,8
milhões de pessoas. Além das mulheres, como destacamos acima, nota-se o
crescimento do eleitorado jovem, na faixa etária de 18 a 24 anos, que soma 18,
3 milhões de pessoas (quase 12%). Entretanto, o voto é facultativo para 20,5
milhões, no caso, pessoas analfabetas, jovens de 16 e 17 anos e maiores de 70
anos.
Esses números, de forma inequívoca, tornam
muito forte a nossa democracia, bem como a existência de partidos enraizados na
sociedade e um sistema eleitoral dos mais modernos do mundo. Mesmo que
eventualmente, aqui ou ali, não haja tranquilidade no pleito. A violência
política ainda é uma realidade em muitos lugares, existe manipulação e
propagação de mentiras nas redes sociais e ainda há no país locais onde a
liberdade dos eleitores está ameaçada pela existência de grupos armados e
criminosos, que ameaçam candidatos concorrentes, eleitores e mesários, mas
ninguém vai às urnas puxado pelo nariz.
A propósito, a ministra Cármen Lúcia,
presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), manifestou sua preocupação com
a "manipulação da informação" e uma espécie de "cabresto
digital" nas redes sociais. Apesar de a tecnologia ter permitido o
aperfeiçoamento e a segurança do processo eleitoral brasileiro, segundo a
ministra, existe também o lado do mal: "O algoritmo tem interesses e não
liga para a vida dos outros. A não ser para aquele que o domina. Temos de
lembrar, somos seres humanos, não somos máquinas, mas com ela, introduziu-se a
desinformação e o abuso de algoritmos", disse a ministra. Nada disso,
porém, desfaz o fato de que as eleições no Brasil são a grande festa da
democracia. Vote consciente.
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