terça-feira, 20 de agosto de 2024

Maria Cristina Fernandes - Negociação de emendas se inicia com o Congresso acuado

Valor Econômico

Avalanche de inquéritos de parlamentares envolvidos em irregularidades na destinação dos recursos pesou na unanimidade do TSF em torno da decisão do ministro Flávio Dino

Um único ministro do Supremo Tribunal Federal recebeu, da Procuradoria-Geral da República, na semana passada, oito inquéritos de parlamentares envolvidos em irregularidades na destinação de recursos de emendas parlamentares. Ao ouvir o relato sobre o volume com o qual os inquéritos têm despencado nos gabinetes da Corte, um interlocutor empenhado em acomodar a situação para preservar os espaços do Congresso, jogou o chapéu na tarde de ontem: “A ‘emenda Pix’ acabou”.

A avalanche de inquéritos pesou na unanimidade do STF em torno da decisão do ministro Flávio Dino e inviabilizou a régua e a borracha com as quais o Congresso sonhava desenhar uma saída para o imbróglio das emendas parlamentares. Uma régua faria valer daqui pra frente a decisão e uma borracha apagaria o passado.

Nenhum dos dois artefatos estará à mesa do almoço com o qual o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, receberá seus colegas, os representantes da Câmara, do Senado e do Executivo. Nem há como anular as dezenas de inquéritos que já correm no Supremo contra parlamentares, nem como suspender a auditoria da Controladoria-Geral da União que identificará os municípios campeões em “emendas Pix”, aquelas que não têm origem nem destino conhecidos.

A decisão de Dino estabeleceu o prazo de 90 dias para este mapeamento. A CGU ainda está por definir se o critério se baseará nos municípios de maior destinação per capita de emendas ou se nos municípios campeões de cada região. O prazo ultrapassa as eleições municipais, mas atinge em cheio a disputa pelas mesas diretoras.

A decisão de Dino revogou decisão do Tribunal de Contas da União que havia vetado auditorias do gênero na CGU por entender que esta era uma atribuição dos tribunais de contas estaduais. Nas auditorias do CGU, agora novamente imbuído da tarefa, a Polícia Federal sempre é acionada quando se detecta uma irregularidade para que se incorpore à investigação.

A ausência de régua e borracha é, por enquanto, o único critério a nortear a negociação em curso para a nova ordem. Ministros do STF e do Executivo não usam mais o termo “mediação”. O que está em curso é a forma como a decisão será cumprida.

Desde que ficou evidente a burla à transparência determinada às emendas de relator com a transferência da opacidade e dos recursos àquelas de comissão, os parlamentares começaram a receber recados de ministros do Supremo.

Num almoço com lideranças parlamentares, meses atrás, o ministro Gilmar Mendes, o mesmo que liderou o acordo decorrente da decisão da ex-ministra Rosa Weber de pôr fim ao orçamento secreto, avisou que a situação havia se tornado insustentável. Todos concordaram, mas tudo permaneceu como antes.

Sempre se ouviu no Congresso que o avanço sobre as emendas era decorrente da recusa do governo Luiz Inácio Lula da Silva em abrir espaços para a base aliada nos ministérios de maior orçamento, como Saúde e Educação, e naqueles que formam o coração da gestão, Fazenda e Casa Civil.

O argumento cai por terra quando se recorda a composição da Esplanada no governo Jair Bolsonaro. O Centrão apoderou-se da Casa Civil e da Saúde, mandava e desmandava na Receita e no Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e nem por isso deixou de avançar sobre o Orçamento.

Se as “emendas Pix” já ficaram no passado, a impositividade da execução orçamentária das demais emendas perde legitimidade com a avalanche de inquéritos nos escaninhos do STF e aqueles que decorrerão do mapeamento da CGU. O Congresso chega enfraquecido na negociação da nova ordem.

A decisão do Executivo de mandar como representantes os ministros da Advocacia-Geral da União, Jorge Messias, e da Casa Civil, Rui Costa, deixando de fora da lista o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, não foi suficiente para aplacar inconformismo do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) que, segundo Fabio Murakawa e Renan Truffi, do Valor, pediu para ser recebido, na noite de segunda (19), por Lula.

Ao contrário do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), fechado com o senador Davi Alcolumbre (União-AP), Lira ainda não foi capaz de definir seu candidato. Com essa revoada, porém, não é só o presidente da Câmara que tem sua sucessão em aberto. Num processo de depuração que seja levado a cabo com transparência e rigor, o poder de alocação de recursos desfrutado há anos por Alcolumbre, não tem como passar incólume.

Lula tem muito a perder com a exposição aberta neste confronto, mas muito a ganhar com a recuperação do poder de executar o Orçamento. Como não tem, à mão, um nome para entabular a negociação pelo Executivo com quilometragem e aceitação no Congresso, é obrigado a entrar no jogo.

Com a indicação de Dino, que nunca escondeu sua inconformidade com o orçamento secreto, o presidente moveu sua primeira peça. A falta de transparência do Congresso na alocação de emendas, porém, não poderá ser substituída pela discricionariedade absoluta do Executivo na execução orçamentária.

Lula elegeu-se prometendo que recolocaria o país de volta aos trilhos da democracia. Não foi só o bolsonarismo que esteve a ameaçá-la. A bandalheira orçamentária foi e, em grande parte, continua sendo, seu caixa.

3 comentários:

Daniel disse...

Muito bom! Já que não haverá régua, podem usar a antiga vara de marmelo pra açoitar as nádegas dos meliantes federais subordinados ao Anão Lira.

marcos disse...

Daniel, o petralha, quer usar vara de marmelo nos outros! Não é um mimo? MAM

ADEMAR AMANCIO disse...

Jesus!