Gilberto Scofield Jr.
DEU EM O GLOBO
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Obama estende a mão a Havana, num dia em que os dois governos reconheceram erros
Numa aproximação entre Estados Unidos e Cuba que há décadas não era vista, os presidentes dos dois países fizeram declarações que indicam um degelo nas relações entre Washington e Havana. Em seu discurso de apresentação na 5ª Cúpula das Américas, o presidente dos EUA, Barack Obama, surpreendeu aqueles que achavam que ele evitaria falar sobre Cuba e afirmou que busca "um novo começo" com o país.
As horas que antecederam o discurso do presidente americano foram repletas de gestos de conciliação jamais vistos nos 47 anos de embargo econômico dos EUA a Cuba, maior aliado da União Soviética na América durante a Guerra Fria. O presidente cubano, Raúl Castro, e a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, chegaram a reconhecer que seus países cometeram erros no passado.
- Os EUA buscam um novo começo com Cuba. Sei que há uma longa jornada que deve ser trilhada para superar décadas de desentendimentos, mas há passos importantes que podemos dar em direção a um novo dia - disse Obama. - Deixe-me ser bem claro: não estou interessado em falar apenas por falar. Mas eu acredito que podemos levar as relações EUA-Cuba para uma nova direção.
Na noite de quinta-feira, Raúl Castro afirmara que o país estava disposto a conversar sobre "tudo" com os Estados Unidos.
- Nós dissemos ao governo dos EUA, em particular e em público, que estamos dispostos a discutir tudo: direitos humanos, liberdade de imprensa, prisioneiros políticos, tudo, tudo, tudo - enfatizou Raúl a jornalistas, durante uma reunião com aliados de Hugo Chávez na Venezuela. - Nós podemos estar errados, nós admitimos. Nós somos seres humanos.
As declarações caíram como um raio na Casa Branca, que até então buscava evitar que o tema Cuba se tornasse o principal da 5ª Cúpula das Américas. O secretário de imprensa da Casa Branca, Robert Gibbs, disse a jornalistas no avião de Obama a caminho de Trinidad e Tobago que a admissão dos cubanos de que podem estar errados foi o que provocou a reação mais forte.
Hillary Clinton, a principal diplomata dos EUA, que estava na República Dominicana, saudou a disposição de Raúl para o diálogo. E frisou que a política externa americana para Cuba, com o embargo econômico, fracassou.
- Damos boas-vindas aos comentários de Raúl Castro, à abertura que eles representam, e estamos analisando-os seriamente para sabermos como vamos responder - disse Hillary. - Continuamos em busca de formas de ação produtivas, porque eu e o presidente Obama compartilhamos a opinião de que a política (dos EUA) para Cuba fracassou. A aproximação é uma ferramenta útil para avançarmos com nossos interesses nacionais.
As posturas de EUA e Cuba ajudaram a eclipsar (ao menos ontem) a esperada tentativa do presidente Hugo Chávez, da Venezuela, e de seu grupo de países aliados, como Bolívia e Nicarágua, de roubar as atenções do encontro usando justamente o tema de Cuba.
Chávez e Ortega foram vistos e fotografados apertando, sorridentes, as mãos de Obama. Chávez chegou a dizer, em inglês, para o americano:
- Quero ser seu amigo.
Em seu discurso, Ortega disse estar envergonhado por estar numa reunião da OEA sem Cuba, ainda mais no dia em que se completaram 48 anos da frustrada invasão da Baía dos Porcos. O nicaraguense, porém, tirou de Obama qualquer responsabilidade, lembrando que o americano nasceu apenas meses depois da operação.
Fim de restrições a viagens e remessas de dinheiro
Apesar do embargo econômico de 47 anos imposto pelos EUA a Cuba, o presidente Obama anunciou na segunda-feira o fim das restrições a viagens e ao envio de remessas de dinheiro de cubano-americanos à ilha.
Os líderes fizeram questão de marcar o encontro de Trinidad e Tobago como um marco numa nova etapa das relações entre os países do continente americano, diante de um mundo onde a Guerra Fria acabou e de uma região mais próspera e menos desigual, afetada por uma crise financeira que, pela primeira vez nos últimos tempos, não nasceu em países emergentes. Mas, ao fim e ao cabo, todos enviaram seu recado ao presidente Obama: gostariam de ver Cuba na mesa de negociações do continente e o fim do embargo.
- Precisamos assumir o desafio de promover a interação desta nova ordem regional. O ambiente é de transformações e expectativas de novas realidades de nossos povos. E precisamos reconhecer o anacronismo que é a política de embargo a Cuba - ressaltou a presidente da Argentina, Cristina Kirchner, a primeira a discursar na cerimônia de abertura oficial ontem.
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