quarta-feira, 29 de setembro de 2021

Cristian Klein - A fusão de aflitos entre PSL e DEM

Valor Econômico

União de partidos indica projeto para evitar decadência

Duas premissas da fusão entre o PSL e o DEM são de que eles formarão um megapartido e que a agremiação terá um projeto independente, de terceira via, na eleição presidencial do ano que vem. Nem um nem outro resultado é garantido.

Em termo quantitativo, o primeiro ponto a se considerar é que a nova legenda perderá a ala mais radical de deputados ligados a Jair Bolsonaro. Espera-se que cerca de 25 parlamentares do PSL, na Câmara, rumem para a sigla que o presidente escolher.

A debandada dos “bolsonaristas roxos” praticamente anula o peso com que a bancada de 28 deputados do DEM contribui para a formação da legenda. Entre esses parlamentares, no entanto, também há expectativa de saídas. Como no Rio, onde o DEM é controlado pelo deputado Sóstenes Cavalcante, ligado ao pastor Silas Malafaia, outro ultrabolsonarista, ambos insatisfeitos com a perda da máquina partidária e a suposta independência que a sigla terá em relação ao governo federal.

Dois deputados licenciados do DEM, ministros de Bolsonaro, também estariam prontos a deixar a legenda. Para Onyx Lorenzoni (Trabalho e Previdência), a fusão reserva o comando do diretório gaúcho, mas sua permanência é incerta. A tendência é que siga Bolsonaro, de olho no apoio dele a seu projeto para governador.

O mesmo ocorre com Teresa Cristina (Agricultura), pré-candidata ao governo do Mato Grosso do Sul. A parlamentar deve migrar para o PP e arrastar dois deputados estaduais do DEM. No Estado, a senadora do PSL Soraya Thronicke, também pré-candidata ao governo, disputa o comando da nova agremiação com o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta (DEM), um dos três presidenciáveis que emergem das fileiras da fusão.

O fato é que ao partir para o ataque, numa aparente demonstração de força, a junção entre DEM e PSL receberá o contra-ataque, num mercado competitivo. Arrisca a ter não mais que a dimensão atual do PSL na Câmara, com 54 deputados, ombreando o PT, e praticamente o mesmo que o DEM no Senado, onde os seis parlamentares da legenda se somam à Soraya, única do PSL, numa bancada de sete, igual à do PSDB e PP, e atrás de Podemos (nove) PSD (11) e MDB (15).

Na Câmara, relevante por ser o principal critério de distribuição de recursos e tempo de TV, a perspectiva de ultrapassar os petistas é menos provável quando se sabe que o partido de esquerda terá o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, atual favorito ao Planalto, a impulsionar candidatos aos Legislativos federal e estaduais. Mesmo em seu pior momento, com a guinada do eleitorado à direita e a erupção do bolsonarismo, o PT elegeu a maior bancada em 2018, feito obtido também em 2014, 2010 e 2002. Em 2006, foi a segunda, atrás do PMDB.

Não é de se desconsiderar a fragilidade que motiva DEM e PSL à fusão. Antes uma potência, o DEM, ainda como PFL, emplacou a maior bancada federal em 1998, com 105 deputados. Desde então, com a crescente fragmentação do sistema partidário e o longo jejum fora do poder, nos governos do PT, a legenda minguou. Mas até o governismo atual, como mostram os casos de Onyx e Teresa Cristina, pode fazer com que eventuais frutos sejam colhidos em outra freguesia.

Depois do baque de 2011, com a enorme debandada liderada pelo ex-prefeito de São Paulo Gilberto Kassab, fundador do PSD, o DEM chegou ao fundo do poço e elegeu apenas a nona maior bancada, com 21 deputados, em 2014. Em 2018, houve um leve crescimento absoluto, para 29, mas que não alterou a posição relativa, perdendo para siglas emergentes como Republicanos (30), PSD (35) e o próprio PSL (52).

O ex-partido nanico - que elegeu apenas um deputado em 2014 - foi catapultado pela vitória de Bolsonaro mas agora, sem o presidente para turbinar as disputas proporcionais, teme encolher novamente, mesmo que tenha o maior volume de recursos do fundo eleitoral e tempo de propaganda na TV.

De tão fácil, para negociações complexas e que quase sempre terminam frustradas, a fusão de DEM e PSL parece indicar a aflição de dois namorados que decidem se casar para dividir custos, aluguel, e não cair mais de padrão de vida. É, por assim dizer, uma decisão de ordem econômica, ainda que facilitada por afinidades ideológicas e pela legislação eleitoral.

A minirreforma de 2017 aboliu as coligações proporcionais, num incentivo ao enxugamento do quadro partidário mas, na segunda-feira, pequenas siglas com sobrevivência ainda mais ameaçada que DEM e PSL comemoraram a decisão do Congresso de derrubar veto presidencial e aprovar as federações partidárias. A novidade permitirá que legendas coliguem-se nas eleições, desde que permaneçam unidas nos quatro anos de mandato.

A segunda premissa da fusão, que vai se revelando em xeque, é a intenção de ser plataforma para um único candidato da terceira via e de manter distanciamento em relação a Bolsonaro. Além de Mandetta, há entre seus quadros dois presidenciáveis: o apresentador de TV José Luiz Datena (PSL) e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), cuja tendência, contudo, é se filiar ao PSD de Kassab.

A falta de competitividade no plano nacional e os variados interesses regionais podem contribuir para que a alegada pretensão executiva de PSL-DEM converta a legenda em mais uma sigla de vocação parlamentar, como tantas outras existentes.

Presidente nacional do PSL, posição que manterá na nova comissão executiva, o deputado Luciano Bivar é refratário à influência do Planalto, devido à briga com Bolsonaro, que quis lhe tomar o partido. ACM Neto, presidente do DEM e futuro secretário-geral, já defende abertamente a liberação de diretórios estaduais e municipais para apoio a outros candidatos, incluindo Bolsonaro, mesmo que o partido lance um nome à Presidência em 2022.

É a estratégia dominante de quem prioriza eleições a deputado, no máximo a governador, um novo MDB, ainda que mais à direita. Pelo jeito, a fusão não será decantação do pós-PSDB ou do pós-bolsonarismo, como partido de direita orgânico a rivalizar com o PT.

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