sábado, 3 de agosto de 2024

Aldo Fornazieri - A farsa

CartaCapital

O venezuelano faz em seu país o que Bolsonaro desejava fazer no Brasil

As eleições venezuelanas são uma farsa do começo ao fim e caminham para uma tragédia, com vários mortos e feridos e centenas de presos. O regime cívico-militar policial, definição do próprio Nicolás Maduro a respeito de seu governo, primeiro perseguiu, prendeu e impediu opositores de concorrer. Depois, aceitou como candidato um ex-diplomata desconhecido, que nunca havia sido candidato a nada. Por fim, o Conselho Eleitoral Nacional, dominado por maduristas, proclamou a vitória do autocrata com 80% de votos apurados, apesar de a diferença entre Maduro e Edmundo González poder ser revertida nesses 20% restantes. Não apareceram atas e boletins de apuração. Caso apareçam vários dias depois da apuração, estarão sob suspeita de fraude.

Maduro faz o que Jair Bolsonaro queria fazer no Brasil. Lá, ele domina o Parlamento, a Suprema Corte e a Comissão Eleitoral Nacional. Aqui, Bolsonaro comprou o Parlamento com o orçamento secreto e investiu contra o Supremo Tribunal Federal e o Tribunal Superior Eleitoral. Queria dominá-los, com prisões e substituições de juízes. As ditaduras contemporâneas caracterizam-se pelo controle das Cortes Supremas, do Legislativo e dos processos eleitorais. Maduro, Nayib ­Bukele, Daniel Ortega e Bolsonaro são todos da mesma estirpe, adotam os mesmos métodos e professam os mesmos valores. Valores e métodos empregados pelos extremistas de direita.

Ortega traiu o sentido revolucionário do sandinismo. Perseguiu e expurgou seus ex-companheiros para instituir uma ditadura corrupta e persecutória. Maduro traiu o sentido revolucionário que existia na origem do chavismo. Substituiu o chavismo por um madurismo corrupto, persecutório, antidemocrático, sustentado por uma oligarquia civil-militar-policial que se apossa das rendas geradas pelo petróleo, empobrece o povo e gera fome e miséria.

Um dos primeiros a denunciar a traição de Maduro foi o historiador e ex-guerrilheiro Toby Valderrama, a quem Hugo Chávez chamava de “velho camarada”. Valderrama e seus companheiros acusaram o novo grupo de poder pós-Chávez de ter reconstituído “o pacto com a burguesia” e reconstruído o capitalismo das elites. Eles acusaram ­Maduro de falsificar o “Plano Pátria” original de Chávez. Todos os que advogaram os princípios originários do chavismo foram expurgados e perseguidos por Maduro.

O atual presidente traiu o sentido revolucionário do chavismo

Gustavo Márquez, ex-ministro do Comércio Exterior e ex-embaixador, denunciou várias vezes a falta de legitimidade de Maduro. Afirmou que ­Maduro e Juan Guaidó eram duas faces da mesma moeda. Maduro e os generais promoveram, segundo ele, a partilha do bolo do petróleo entre empresas norte-americanas, a China e a Rússia. Mostrou que esse regime oligárquico aprofunda o rentismo petroleiro e torna “mais barato importar do que produzir” ao estabelecer controles que destruíram a economia do país.

Os chavistas dissidentes afirmam que a proposta original de Chávez era humanista e que Maduro a destruiu, consolidando um sistema corrupto gerador de “miséria, fome, repressão, exílio e tragédia”. De acordo com Héctor Navarro, titular de quatro ministérios no governo Chávez e amigo do ex-presidente, Maduro entregou o país nas mãos de interesses estrangeiros. Ou seja, o nacionalismo do atual presidente é falso e mofado. Navarro foi destituído do cargo quando Maduro assumiu. Ao denunciar a corrupção, foi expulso do partido. Com Maduro, afirmou, “a revolução fracassou” e levou junto a esquerda latino-americana. Advertência em boa medida verdadeira e não só completa por causa da lucidez de Pepe ­Mujica, de Gustavo Petro e de Gabriel Boric, que sabem que a construção da justiça, da igualdade e do socialismo não pode ocorrer sem democracia e liberdade.

Com a fraude do processo eleitoral de ponta a ponta, o povo venezuelano protesta contra o regime oligárquico de Maduro. Os bairros mais ativos e que puxam os protestos são tradicionais redutos do chavismo, revoltados com a herança trágica promovida pelo regime corrupto e rentista que assalta as riquezas produzidas pelo petróleo. Em bairros como Caricuao, Catia Petare, La Veja e El Cementerio, os panelaços e as manifestações de rua foram recorrentes nos últimos dias. Os jovens que puxam os protestos afirmam que não são liderados nem por partidos nem pelos políticos da oposição. Dizem que a fraude eleitoral precisa ser interrompida e que Maduro precisa deixar o poder. Declaram-se cansados de ser maltratados. Esses moradores dos bairros chavistas dizem ainda que o governo roubou sua dignidade, que não têm sequer dinheiro para comprar comida para os filhos. “Olhe os meus sapatos, estão furados e não tenho dinheiro para comprar novos”, afirmou um jovem de Petare, em Altamira.

Qual a resposta do governo a esses jovens que saíram para protestar? Violenta repressão, prisões e mortes. Mais de 7 milhões de venezuelanos já deixaram o país, uns por terem sido perseguidos, muitos outros para conseguir dinheiro para enviar aos parentes e familiares que ficaram numa Venezuela onde os oligarcas de Maduro ficam cada vez mais ricos e cada vez mais corruptos e onde o povo fica cada vez mais pobre e faminto. Não, o regime de Nicolás Maduro não é e nunca foi de esquerda. 

Publicado na edição n° 1322 de CartaCapital, em 07 de agosto de 2024.

4 comentários:

Anônimo disse...

O regime de Maduro é o espelho fidedigno do que é a esquerda.... Quem falar ao contrário disso é mau caráter mesmo.....

Mais um amador disse...

Hahahahahah

Os caras tão tentando colocar a pecha de direita no Maduro de qualquer jeito.

Ontem, li o Janio de Freitas tentando fazer isso. Hoje, esse.

Nunca houve regimes e ditaduras de esquerda... Tá bom...

Bando de comédias.

Ridículos !

😏😏😏

Daniel disse...

Texto excelente, muito verdadeiro e bem argumentado! Parabéns ao autor, e ao blog por divulgar trabalho de tanta qualidade!

Mais um amador disse...

MST e mais 11 entidades da extrema-direita fascista endoçaram, legitimaram e deram seu aval para o resultado das urnas da última eleição presidencial que manteve o poder com o direitista aliado de Bolsonaro, Nicolás Maduro.

" Nicolás Maduro saiu vitorioso com mais de 51% dos votos, com 80% dos votos contabilizados, derrotando 9 candidatos opositores, incluindo a extrema-direita, que promove uma campanha de desinformação e ataques ao sistema eleitoral.

Para as entidades, o resultado das urnas significa que a “maioria decidiu pela continuidade da Revolução Bolivariana” ( direitista e fascista ) que é alvo de “duras sanções e ataques do imperialismo estadunidense e seus associados na mídia, na política e na economia. ”

( Poder 360 )

( Passadores de Pano não passarão ! )

😏😏😏