quinta-feira, 10 de julho de 2014

Discurso para convencer 47 milhões de indecisos

• Governo e oposição vão usar a derrota do Brasil como argumento na corrida eleitoral. Os petistas ressaltarão que, apesar do fracasso em campo, não houve problemas durante a Copa. Já os rivais destacarão os exorbitantes gastos com o torneio

Paulo de Tarso Lyra, João Valadares e Grasielle Castro – Correio Braziliense

Ainda sob o efeito da derrota do Brasil no Mundial, governo e oposição buscam o discurso para atrair 47 milhões de eleitores — um terço do eleitorado, que ainda não vestiu a camisa de um lado ou do outro para as eleições de outubro. Os oposicionistas defendem que o vexame perante a Alemanha apenas coroou um torneio que teve obras superfaturadas, entregues com atraso e resolvida pelo jeitinho brasileiro de decretar feriados nos dias dos jogos para não travar a mobilidade. Para os governistas, a "Copa das copas" foi um sucesso, os aeroportos funcionaram, os pessimistas foram calados e não se pode culpar a presidente Dilma Rousseff (PT) porque não foi ela quem entrou em campo ou escolheu Luiz Felipe Scolari para ser treinador da Seleção Brasileira.

"A partir de agora, viveremos a Copa das culpas", disse Carlos Melo, cientista político e professor do Insper Instituto de Ensino e Pesquisa. "Cada um dos lados vai tentar empurrar para o outro as razões desse fracasso. O eleitor indeciso será bombardeado por uma guerra infinita de versões", prosseguiu Melo. O especialista lembra que, nas redes sociais, a cada gol alemão, multiplicavam-se cobranças à presidente pela ausência de investimentos em saúde e em educação e a prioridade dada às obras para o Mundial. "Mas não podemos esquecer que São Paulo, governado pelo PSDB, lutou para sediar a abertura dos jogos", completou.

O cientista político da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Fábio Wanderley avalia que o povo brasileiro sabe separar bola e voto. "A verdade é que ainda vai correr muita água até as eleições", afirma. Ele acredita, no entanto, que a derrota pode servir como adubo para o recrudescimento das manifestações de rua que sacudiram o Brasil em junho do ano passado.

O Planalto e a campanha do PT pela reeleição de Dilma Rousseff asseguram que, até o momento, não há qualquer razão para mudanças de planos. A presidente segue disposta a ir ao Maracanã no domingo para entregar a taça ao vencedor do Mundial. Há alguns dias, a decisão causou estresse entre a Secretaria de Comunicação da Presidência e o Ministério do Esporte, pois Aldo Rebelo confirmou a presença de Dilma à Fifa antes de comunicá-la do convite.

Ontem, a presidente foi entrevistada pela CNN e não escondeu que estava abalada pelo resultado do jogo. "Meus pesadelos nunca foram tão ruins. Como torcedora, claro, estou profundamente sentida porque eu compartilho da mesma tristeza dos outros torcedores. Mas também sei que somos um país com uma característica muito particular. Nós crescemos no desafio da adversidade. Nós somos capazes de superar", disse a presidente. A entrevista vai ao ar hoje.

Dilma também reforçou o discurso feito por estrategistas de campanha de que "o Brasil organizou e sediou a que eu acredito ser uma das melhores Copas do Mundo. E muito disso se deve à habilidade dos brasileiros de oferecerem hospitalidade e de dar boas-vindas a torcedores de todas as partes do mundo", elogiou, mostrando que o discurso de que "a parte do governo foi feita" será usado como combustível eleitoral. Na segunda-feira, a presidente participou de um cara a cara com internautas e chegou a fazer o "tóis", formando uma letra T com os antebraços, gesto usado por Neymar nos jogos do Brasil.

Corrupção
No campo da oposição, Eduardo Campos (PSB) cancelou a agenda de candidato em Fortaleza por acreditar que os eleitores interpretariam mal alguém pedindo votos em um momento de comoção nacional. "Nossa proposta foi, é, e sempre será, trabalhar a favor do Brasil. Queremos sempre que as coisas deem certo." Aliados do socialista, no entanto, afirmam que, se o tema da Copa for abordado na campanha, virão à tona os escândalos de corrupção e de superfaturamento nas obras para o Mundial.

Já o candidato do PSDB, Aécio Neves, que esteve no Mineirão, permaneceu em reuniões internas ao longo da quarta-feira. Mas o Instituto Teotônio Vilela, vinculado ao partido, divulgou uma nota dura. "A vitória alemã representa o triunfo da técnica, da disciplina, do método e do rigor sobre o improviso e o descompromisso. Quantas vezes, ao longo de sete anos, não ouvimos autoridades federais dizendo que o "jeito brasileiro" de fazer as coisas seria um sucesso, como se organização, planejamento e método fossem atributos indesejáveis para uma nação tão criativa quanto a nossa?", disseram os tucanos.

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