Por Fabio Murakawa | Valor Econômico
BRASÍLIA - O juiz Sergio Moro fez ontem duras críticas ao projeto de lei que de abuso de autoridade, atualmente em tramitação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. O texto, de autoria do senador Renan Calheiros (PMDB-AL) e relatado por Roberto Requião (PMDB-PR), é visto por críticos como uma retaliação aos desdobramentos da Operação Lava-Jato, que tem entre seus alvos dezenas de parlamentares.
"Ninguém é favorável a abusos cometidos por juiz, promotor ou autoridade policial. Apenas se receia que, a pretexto de coibir abuso de autoridade, seja criminalizada a interpretação da lei", afirmou Moro, durante audiência pública em uma comissão especial da Câmara para reformar o código penal brasileiro. "O que a magistratura tem feito, e também recentemente a Procuradoria-Geral [da República], é apresentar sugestões de forma que deixe isso claro no projeto."
Nesta semana, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentou aos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE) um projeto alternativo ao de Renan. Mas a proposta foi solenemente ignorada pelos senadores em sessão anteontem na CCJ, que tem dez parlamentares - cinco titulares e cinco suplentes - alvo de investigações na Lava-Jato. Para Moro, "a interpretação da lei, na avaliação de fatos e provas, não pode ser considerada crime", o que está no cerne da proposta de Janot.
"Senão houver uma salvaguarda clara e inequívoca nesse respeito, o grande receio é que os juízes passem a ter medo de tomar decisões que possam eventualmente ferir interesses especiais ou que envolvam pessoas política ou econo- micamente poderosas", afirmou.
No fim do ano passado, Moro participou de sessão temática no Senado para debater o projeto de abuso de autoridade. Foi convidado por Renan, que então presidia a Casa. O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), também participou. À época, Moro manifestou preocupação com a criminalização das interpretações dos magistrados.
"Nós não queremos inibir os juízes, mas nós queremos evitar que juízes façam política partidária", rebateu o deputado Paulo Teixeira (PT-SP), que ao lado de outros colegas de legenda partiu para o ataque contra Moro na comissão.
Teixeira questionou também os motivos que levaram o juiz a determinar a condução coercitiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a divulgação de grampo de uma conversa entre ele e a então presidente Dilma Rousseff, no ano passado. "Vossa Excelência num contexto de golpe parlamentar estava pretendendo contribuir para a derrubada da presidente Dilma Rousseff?", indagou.
"À luz do que se passa hoje no Brasil, e em especial na capital do Paraná, eu não sei se estou ensinando corretamente direito penal para os meus alunos. Porque parece que há um direito em vigor, construído na República de Curitiba, e aquilo que eu ensino aos meus alunos", disse Wadih Damous (PT-RJ), que é advogado. "Vivemos a época de juízes celebridade, que vieram aqui salvar a política, salvar o Brasil", ironizou.
Após longa explanação sobre o código, Moro dedicou uma curta resposta aos petistas: "Não cabe a mim responder sobre casos concretos, sobre casos pendentes. Vim aqui para responder sobre o novo Código de Processo Penal. As instâncias superiores vêm mantendo minhas decisões. Não cabe a mim responder a perguntas ofensivas".
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