sexta-feira, 10 de março de 2017

Plano é anistiar crime em doação

Após o STF decidir que doação oficial não legaliza propina, cresce entre os parlamentares um movimento para anistiar os crimes cometidos através de financiamento eleitoral.

Anistia ao caixa 2 de volta

Congresso já debate estratégias para perdoar crimes cometidos via doação eleitoral

Cristiane Jungblut, Junia Gama e Maria Lima | O Globo

-BRASÍLIA- Uma nova estratégia para retomar a votação de uma anistia contra crimes cometidos por meio de financiamento eleitoral já começa a ser discutida no Congresso. A medida valeria para o caixa 2 e para a doação oficial. A articulação ganhou corpo depois da decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) de considerar que doação oficial pode ser crime, se feita com dinheiro ilegal, e transformar o senador Valdir Raupp (PMDB-RO) em réu.

Os parlamentares cogitam duas alternativas para aprovar uma anistia: uma proposta sobre financiamento eleitoral ou incluir o tema dentro do pacote das dez medidas anticorrupção, que deverá voltar em breve ao Senado. Depois da conferência de assinaturas pela Câmara, o projeto das dez medidas será prontamente devolvido para apreciação dos senadores. Mas se eles alterarem o texto para incluir a anistia, o texto aprovado pela Casa terá de voltar à Câmara.

— Pelo que ouvi vão botar isso na votação das dez medidas. Eles aprovam as medidas de combate à corrupção sem distorcer o objetivo, e juntro no pacote, a anistia às doações de Caixa 2. Com o pavor que tomou conta da Casa, depois que passar na Câmara, passa fácil no Senado. Esse é o movimento em curso — contou o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP).

Na Câmara, deputados da base acreditam que, neste momento, é melhor esperar o Senado fazer um movimento sobre o assunto para, só depois, aprovarem algo do tipo. Eles dizem que já houve um enorme desgaste no fim do ano passado, quando a Câmara tentou aprovar a anistia ao caixa 2 em meio ao pacote das dez medidas anticorrupção, e que o Senado sequer pautou o projeto em plenário.

— Agora é a vez do Senado, chega de ficarmos com a brocha na mão. A preocupação dos deputados é grande, mas não adianta votar algo aqui e ficar parado lá no Senado — acrescentou um deputado do PMDB.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEMRJ), disse que as assinaturas dadas ao pacote anticorrupção estão sendo conferidas pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e, se confirmadas, o projeto será devolvido diretamente ao Senado, sem nova votação na Câmara.

Nos bastidores da Câmara, a avaliação é que depois do confronto do líder do PMDB no Senado, Renan Calheiros (AL), com o deputado Carlos Marum (PMDB-MS) por causa de uma moção para afastar o comando do partido investigado pela Lava-Jato, os deputados não vão tomar a iniciativa que pode favorecer os senadores.

— Eles é que estão enrolados e agora vêm pedir ajuda para a Câmara? Se quiserem aprovar a anistia vão ter que tomar a iniciativa no Senado — diz um interlocutor de lideranças do PMDB na Câmara.

NO PMDB, CLIMA DE REVOLTA
Outra opção para evitar desgaste é incluir a anistia ao caixa 2 em um projeto sobre financiamento eleitoral. Ontem, o presidente do Senado, Eunício Oliveira (CE), defendeu que o Congresso discuta a forma de arrecadação para campanhas eleitorais, mas ao GLOBO ele reforçou que defende que essa discussão não seja confundida com debate sobre caixa 2.

— Acho que esse é o grande momento de se fazer o debate sobre essa questão. Financiamento de campanha, até 2014, tinha uma regra que era o livre financiamento empresarial. Aprovamos uma lei muito rígida, que eliminou qualquer tipo de participação empresarial nas campanhas. Por outo, lado, o fundo partidário nunca foi um mecanismo de financiamento de campanha — disse Eunício.

Na prática, os dois assuntos podem se misturar. Isso porque é difícil falar em financiamento de campanha sem esbarrar na questão do caixa 2.

— Se discutirem o caixa 2 no pacote anticorrupção, o financiamento pode entrar sim. Se o pacote é para combater a corrupção e hoje o caixa 2 é visto como corrupção, pode entrar — explica um técnico.

O deputado Carlos Marum diz que juridicamente seria possível incluir algum dispositivo para explicitar o que é legal ou não:

— Não se pode criminalizar uma doação legal. Sou favorável à reabertura do debate sobre financiamento de campanha, contra a proibição de doações por pessoa jurídica. Nesse debate pode-se aprovar um dispositivo dizendo que propina é uma coisa, doação legal é outra e caixa 2, outra coisa.

Logo após a decisão do STF, na última terça-feira, Renan comandou uma reunião da bancada do PMDB no Senado, na qual o caso de Raupp foi longamente debatido. O clima era de revolta com a mudança de paradigma em relação as doações de campanha.

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