Após ministro Edson Fachin relatar ameaças à família, Cármen Lúcia afirma que Poder tem ‘um papel constitucional a cumprir do qual ele não pode se subtrair’
Rafael Moraes Moura | O Estado de S.Paulo
BRASÍLIA - Um dia depois de o ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, afirmar que sua família está recebendo ameaças, a presidente da Corte, ministra Cármen Lúcia, disse ao Estado que “a Justiça não se intimida” com tentativas de constrangimento.
“A Justiça não se intimida, primeiro porque ela tem um papel constitucional a cumprir do qual ela não pode se subtrair. A prestação da Justiça significa exatamente atender a quem tem direito. O que o juiz ameaçado precisa é de garantia para ter tranquilidade e cumprir as suas funções”, disse a presidente do Supremo, ressaltando que decisões judiciais sempre trazem um “nível de insatisfação”.
As declarações de Cármen Lúcia e de Fachin ocorrem num momento em que ministros do Supremo se agridem verbalmente em sessões no plenário, viram alvo de constrangimento nas ruas e a própria imagem do tribunal se desgasta perante a opinião pública.
O ministro Gilmar Mendes, por exemplo, foi hostilizado enquanto caminhava por Lisboa, onde vai passar o feriado de Páscoa. O vídeo circulou nos últimos dias nas redes sociais.
Em meio ao clima de pressão sobre a Corte, o plenário do Supremo julga na próxima quarta-feira o habeas corpus preventivo ajuizado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O petista tenta evitar sua prisão após a Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) rejeitar o recurso contra a condenação a 12 anos e 1 mês de reclusão no regime fechado pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do triplex do Guarujá (SP).
Escolta. Cármen Lúcia autorizou o aumento do número de agentes para escolta permanente de Fachin e encaminhou ofício para todos os colegas do Supremo sobre a necessidade de reforço na segurança. Atualmente, cerca de 90 magistrados de todo o País estão sob escolta.
“Numa democracia, as pessoas se manifestam. O que não é aceitável é ultrapassar os limites da lei, da legalidade”, afirmou Cármen Lúcia. A própria presidente do Supremo também virou alvo de ofensas e críticas nas redes sociais, intensificadas depois do julgamento que abriu caminho para o senador Aécio Neves (PSDB-MG) retomar o mandato parlamentar, em outubro do ano passado.
Na conversa com o Estado, Cármen Lúcia disse que não se preocupa com a sua segurança particular, mas, sim, com as ameaças dirigidas a magistrados de todo o País. A ministra afirmou que não pedirá um reforço na proteção pessoal.
“Eu me preocupo com ameaças a ministros, tomo as providências que tenho de tomar. Se tem caso de agressão, tem de tomar providência, a presidência vai tomar. No meu caso, estou continuando com a minha vida, tem de manter a tranquilidade na medida do possível”, declarou a presidente do Supremo.
Cármen Lúcia informou que ainda não recebeu oficialmente dos colegas nenhum pedido de reforço de segurança. Dois ministros ouvidos reservadamente pela reportagem informaram que não devem pedir aumento na proteção pessoal. Para um deles, criou-se um clima de “Fla-Flu” para pressionar os juízes. Ele reclamou do noticiário sobre o Supremo, que estaria estimulando a animosidade.
Diretoria. Em maio do ano passado, Cármen Lúcia anunciou no âmbito do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) – também presidido por ela – a instalação do Departamento de Segurança Institucional do Poder Judiciário, voltado para garantir a segurança de magistrados em situação de risco e seus familiares.
“A diretoria é composta por um grupo de duas delegadas especialistas em segurança de dignatários, que avaliam exatamente cada situação que chega e adotam as providências necessárias, tanto que temos hoje tudo cadastrado, tudo sob sigilo”, afirmou Cármen Lúcia.
O reforço na proteção dos magistrados é, muitas vezes, feito pelos próprios tribunais, podendo contar com o auxílio de agentes da Polícia Federal quando for necessário. Na época em que foi criado o departamento, a presidente do Supremo afirmou que haviam aumentado as ameaças a juízes que atuam em varas de família, do trabalho e em casos de violência doméstica.
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