segunda-feira, 24 de junho de 2024

Entrevista | Márcio França: Pós-eleição exigirá rearranjo para ver quais partidos ficarão com Lula

Jennifer Gularte / O Globo

Conhecido por articular palanques, ex-governador de SP avalia que reforma ministerial vai se impor quando siglas da base precisarem escolher de que lado estarão em 2026: do presidente ou do bolsonarismo

O senhor é do PSB, mas há ministros de outros partidos não alinhados ao governo. O modelo de coalizão está funcionando?

É difícil ser engenheiro de obra pronta. Nós chegamos até aqui com 95% de tudo o que mandamos aprovado. Então, não dá para dizer que não foi bem-sucedido. Mas a nossa angústia coletiva, dos políticos e jornalistas, se encerrará no final desse ano. Quando acaba a eleição de prefeito, começa a de governador e presidente. As nuvens vão se adensar para dois campos específicos: um liderado pelo governo de São Paulo (de Tarcísio de Freitas) e talvez a prefeitura de São Paulo (com a possível reeleição de Ricardo Nunes), contra o campo nacional (do governo Lula). Então, vários partidos que têm posições importantíssimas dentro do governo vão ter que tomar uma decisão difícil. Se o parlamentar vai mudar de partido e ficar com o governo federal ou se irá se embarcar na aventura paulista.

São Paulo será o contraponto? Como será esse jogo?

É muito difícil imaginar que alguém tiraria uma eleição do Lula. Depois de preso, todo arrebentado, todo chamuscado, ele ganhou uma eleição... Essa é a sensação, ainda mais em condições plenas, com poder na mão e sem o principal concorrente (Jair Bolsonaro) na disputa. A pessoa escolhida para disputar a eleição contra o Lula, mesmo sabendo que provavelmente vai perder, naturalmente se transformará no próximo candidato a presidente mais forte do país. Acho meio inevitável o Tarcísio ser candidato. Ele será empurrado para essa disputa. Querendo ou não, é o nome mais forte, um moço educado, não tem aquela coisa mais dura, bruta do Bolsonaro.

Será necessária uma nova reforma ministerial pós-eleições municipais?

Faz sentido, porque nós vamos para aquele afunilamento para ver quem vai ficar (com o governo). Hoje, por exemplo, o MDB é o adversário principal (do governo). Tem o candidato que teoricamente representa o bolsonarismo na capital em São Paulo. O MDB de São Paulo também controla o MDB nacional. O MDB também controla duas pastas vitais, do ponto de vista financeiro, Transportes e Cidades. Mesma coisa pode se dizer com relação ao PSD e União Brasil. Certamente, no pós-eleições, nós teremos necessidade de fazer o rearranjo. O MDB do Nordeste tem muita afinidade com o presidente Lula, mas não têm o controle numérico do partido.

O governo abriu espaço para o Centrão, mas tem sofrido derrotas no Congresso. Por quê?

O governo permitiu a desculpa que eles (parlamentares) queriam para poder votar a favor. Se eu não faço parte do governo, voto contra. Agora, se faço parte do governo, pelo menos um pouco eu voto a favor. Hoje, com esse número de padrão e valores de emendas, ter ministério ou não passou a ser um pouco secundário. O valor expressivo das emendas é muito mais decisivo para o efeito de ter rapidez e votação.

Alckmin (PSB) poderia ajudar mais na articulação política?

O Alckmin é um ser fora dos padrões naturais. Não tem um tipo de ambição. Não bebe, não fuma, não vai para restaurante, não tem hábitos de coisas normais. Claro que ele gostaria de continuar servindo. Estive com ele na China e pude perceber que, de toda a trajetória linda de vida, foi o ápice da carreira. Ele estava representando um país grande em conversa com o presidente da China. Ele é muito preparado, um estudioso, metódico, mas não avança um milímetro do farol. Imaginar que ele vai reivindicar algo para ele? Esqueça. Inegavelmente é um polo de atração do mundo empresarial. Mas ele não é um articulador de Congresso.

O senhor já disse que Lula “tem que ajudar a buscar opções” para um sucessor. O presidente reforçou esta semana que pode ser candidato em 2026. Isso atrapalha?

O coração do presidente, se pudesse escolher, seria o (Fernando) Haddad (ministro da Fazenda) o seu sucessor. A admiração que ele tem pelo Haddad, a correção do Haddad... O Haddad é idôneo, nos mesmos moldes do Alckmin. É radical. Agora, Lula é muito intuitivo. Ele sabe que talvez não seja fácil fazer esse movimento. Se o Lula tivesse, por exemplo, com 90% de aprovação, acho que ele poderia fazer uma opção pelo Haddad, mantém o vice e ele vai se recolher. Mas, quanto mais equilibrado, mais nós necessitamos do Lula.

Lula está pessoalmente empenhado em eleger Guilherme Boulos em São Paulo. Na hipótese de derrota, o presidente sairá enfraquecido?

Se for no segundo turno, não acho relevante. Relevante seria uma derrota no primeiro turno; o Ricardo Nunes ganhar no primeiro turno. Por isso, a existência da Tabata (Amaral, como candidata) tranquiliza. Com ela, dificilmente será em um turno. Com Pablo Marçal, é praticamente impossível. É sempre bom ganhar, mas não seria derrota grave, se for segundo turno.

O PSB deixou encaminhado o apoio a Elmar Nascimento na sucessão de Arthur Lira. Defende que esse seja o caminho de Lula também?

Essa conversa não passou por mim. Li uma conversa dele (Elmar) com o João Campos (PSB), que hoje é quem nos lidera nacionalmente. Se João entendeu assim, ele tem seus motivos, mas vamos ter reunião na semana que vem do núcleo mais duro do partido para tentar esclarecer isso. Essa é uma decisão que tem a ver com o próprio governo, unificar as posições do governo facilitam para nossa defesa.

O que foi possível fazer no ministério de Micro e Pequenas em seis meses?

Basicamente criar uma voz dentro da estrutura da economia do governo a respeito dos pequenos e MEIs. Conseguimos fazer o Desenrola da pessoa jurídica e, a partir de julho, vamos ter o Pro Crédito 360, que é outra medida bem impactante. Trinta e cinco mil empresas no Brasil já desenrolaram as suas dívidas. Entrou o episódio do Rio Grande do Sul (a devastação do estado por conta das enchentes), lá tem um programa específico e já chegamos a 13 mil empresas, que foram abertas a partir desse dinheiro que subsidiamos. Estimamos poder chegar perto de 100 mil empresas, desses mais afetados.

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