Flagrado em má conduta, o governador do Rio de Janeiro quer ajuda para escrever um código de ética. Pois não
O governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), vive a sua pior crise política desde que assumiu o cargo, em 2007. Nas últimas semanas, descobriu-se que ele mantém uma intensa troca de gentilezas com empresários que têm negócios milionários com o seu governo. Esses homens oferecem seus jatinhos e helicópteros para levá-lo a festas e viagens. O governador aceita, penhorado, e intercede por eles em suas relações com o governo federal e em suas andanças pelos labirintos da burocracia estadual. Entre os amigos de Cabral, estão o multimilionário Eike Batista, do grupo EBX, e Fernando Cavendish, da Delta Engenharia, que, na gestão dele, multiplicou por oito o faturamento proveniente de contratos com o governo do estado. Cabral pede ajuda. "Quero rever minha conduta. Vamos construir um código de conduta juntos. Vamos estabelecer os limites e ver o que há em outros estados do Brasil e no mundo." O pessoal gostaria mesmo é de ir junto nas viagens exclusivas pagas pelos amigos do governador. Para trabalhar não precisa convite. Com o intuito de colaborar, VEJA lista algumas fontes que podem facilitar a elaboração do "Codex cabralensis". O ideal é começar pelo Ética a Nicômaco, obra do grego Aristóteles. Ensina o sábio do século IV a.C.: “A política é a ciência do bem comum”. Aliás, não é preciso ir longe nem no tempo nem na geografia. As lições éticas estão por toda parte.
1. Constituição Federal, artigo 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
Ou seja: viajar no jatinho de Eike Batista e, três dias depois, liberar uma licença ambiental para que ele construa um porto não é legal.
2. Resolução número 2 da Comissão de Ética Pública da Presidência- A autoridade não poderá aceitar o pagamento ou reembolso de despesa de transporte e estada, referentes à sua participação em evento de interesse institucional ou pessoal, por pessoa física ou jurídica com a qual o órgão a que pertença mantenha relação de negócio.
Ou seja: se o jatinho de Eike for usado para levar um político a uma festa em um resort da Bahia bancada por um empreiteiro com contratos com o governo estadual, é ainda pior.
3. Código de Ética do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal- É vedado ao servidor público ( ... ) o uso do cargo ou função, facilidades, amizades, tempo, posição e influências, para obter qualquer favorecimento, para si ou para outrem.
Ou seja: se o empreiteiro em questão for Femando Cavendish, da Delta, cujos negócios com o governo Cabral lhe renderam 127 milhões de reais em contratos sem licitação só em 2010, a festa pode virar uma dor de cabeça tremenda.
4. Código Penal, artigo 321- É considerado crime ( ... ) patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário.
Ou seja: constitui crime um governador telefonar para o presidente da República pedindo a ele que interceda em favor do empresário dono do jatinho para que ele obtenha direitos bilionários de exploração mineral - como Cabral fez em 2008, ao ligar para Lula e patrocinar os interesses de Eike.
Não é preciso, portanto, criar novos códigos de conduta. Basta segui-los.
FONTE: REVISTA VEJA
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