Murillo Camarotto
SALVADOR - ACM Neto com vice, a educadora Célia Sacramento (PV): "A escolha foi importante pela pluralidade, já que Célia representa uma força que historicamente esteve do lado de lá"
Foi envolto em mais de 300 mulheres e milhares de bexigas cor-de-rosa que o deputado federal Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM) soube, na noite da última sexta-feira, que liderava folgadamente a corrida eleitoral em Salvador, com 40% das intenções de voto. Os números do Ibope foram divulgados momentos antes de ele discursar para a ala feminina do PTN - partido nanico que integra sua chapa - em uma churrascaria localizada na Boca do Rio, na zona central da capital baiana.
Assim que conseguiu se livrar do assédio e deixar o local, o neto do "véio" - como é popularmente chamado o ACM original, morto em 2007 - telefonou para um dos coordenadores de sua campanha, a fim de negociar o teor de uma eventual declaração sobre a pesquisa. Foi orientado a silenciar. A partir de então, todos os jornalistas que o procuraram ouviram que ele não falaria sobre o assunto. "Se a gente fala uma vez, depois tem que ficar explicando cada variação de um ponto", justificou.
Terceiro colocado na eleição de 2008, após liderar no início do processo, ACM Neto será mais cauteloso este ano. Mesmo com quase 30 pontos à frente do candidato petista Nelson Pelegrino, ele está consciente do poder de fogo adversário. Com uma coligação de 15 partidos, contra cinco de ACM Neto, o PT terá quase o triplo do tempo de televisão. "Ainda vem Lula, a Dilma, o (Hugo) Chávez, o (Evo) Morales...", disse ACM Neto, em certo tom de deboche, a um aliado que telefonou para parabenizá-lo pelo resultado do Ibope.
O desempenho do candidato do DEM, segundo o cientista político da Universidade Federal da Bahia (UFBA) Joviniano Neto, tem como ingrediente principal o eleitorado cativo do "carlismo", correspondente a cerca de 30% dos votantes soteropolitanos. Os outros dez pontos percentuais refletem a insatisfação popular com a gestão do governador Jaques Wagner (PT), sentimento intensificado com as recentes greves da polícia e dos professores da rede estadual, que se estenderam por períodos bem acima do que pode ser considerado administrável.
Com o fim da greve do magistério, também na sexta-feira, a tendência é de que a pressão negativa sobre o candidato petista comece a ceder. Sendo assim, para manter-se à frente da disputa até o dia da eleição, ACM Neto despiu-se do personagem de antagonista do governo federal, com a qual se apresenta costumeiramente em Brasília. No discurso às mulheres do PTN, por exemplo, o parlamentar destacou "o gesto de grande maturidade do povo brasileiro" ao eleger uma mulher para a Presidência da República.
O discreto afago à Dilma serviu de prefácio para a apresentação de sua candidata a vice, a educadora Célia Sacramento (PV), ligada ao movimento de defesa das mulheres. Apesar de ter o PSDB como o aliado politicamente mais expressivo, ACM Neto optou por um vice do PV para, segundo ele próprio, "arejar" a chapa. "Essa escolha foi importante para dar pluralidade, já que Célia representa uma força que historicamente esteve do lado de lá", afirmou o candidato do DEM, referindo-se à aliança de muitos anos entre PV e PT.
De acordo com ele, um dos grandes equívocos da oposição nacional foi o afastamento dos movimentos sociais, motivo o seu partido - que vive um processo de esvaziamento - deverá permanecer "escondido" da campanha. "Faço questão de dizer que se trata de uma candidatura pluripartidária. Não posso fazer um governo só com as ideias dos Democratas", afirmou ACM Neto. Em reserva, um membro de sua equipe disse que a campanha será totalmente "out" do partido. "Se não fizermos isso, estamos mortos", confidenciou.
Horas antes, na sede da Arquidiocese de Salvador, no bairro do Garcia, o advogado Nelson Pelegrino era bombardeado por alguns participantes do Fórum Inter-Religioso de Saúde. O caos no atendimento médico na Bahia foi longamente detalhado por agentes de saúde e líderes comunitários, deixando o candidato petista com um ar entediado. Em sua fala, ele prometeu aumentar o número de equipes do Programa Saúde da Família e, se o dinheiro der, construir o primeiro hospital municipal de Salvador.
Pelegrino lembrou que a capital baiana tem a pior arrecadação per capita da região Nordeste, o que deixa a cidade com pouquíssimo fôlego para investimento próprio. Por esse motivo, ele tem nas parcerias com o governo estadual e federal a sua principal bandeira de campanha, repetida à exaustão, como um mantra. "O grosso da população ainda não sabe que ele é o candidato de Lula, Dilma e Wagner", explica o professor Joviniano, da UFBA.
Na saída da reunião, ainda sem os números da pesquisa, Pelegrino não estava com a melhor das expectativas. Ele admitiu que a greve dos professores, que durou quatro meses, prejudicou a imagem do governador, do PT e, em consequência, o seu desempenho no Ibope. "Temos informação de que (a greve) represou muito (as intenções de voto)", disse. Pelegrino garantiu, contudo, estar tranquilo em relação à influência positiva que a associação de sua candidatura com o governo Wagner terá nos próximos meses.
Durante o debate entre os candidatos à Prefeitura de Salvador, promovido na noite da última quinta-feira pela TV Bandeirantes, Pelegrino e ACM Neto concordaram que o principal problema da cidade é de gestão. Saúde, Educação e Transporte foram as áreas citadas como as mais problemáticas para o dia a dia dos soteropolitanos. A solução apresentada também foi equivalente: o candidato do DEM prometeu botar "ordem na casa", enquanto o petista sinalizou com "choque de gestão e projeto estratégico" para a cidade.
Pelegrino diz que vai enxugar os gastos com custeio da máquina e aumentar a capacidade de investimento da prefeitura dos atuais R$ 100 milhões para algo próximo a R$ 300 milhões por ano. "Ainda assim, vai ser pouco para as necessidades de Salvador", adiantou-se o candidato. Já ACM mira o Turismo para alavancar a economia. "É a única forma de aumentarmos a receita. A violência crescente e o abandono do patrimônio histórico e da orla derrubaram sensivelmente o turismo nos últimos dois anos", sublinhou.
Apesar do grande descontentamento com a atual administração municipal, os dois evitam ataques diretos ao prefeito João Henrique (PP), cuja popularidade também anda bastante abalada. Enquanto ACM tem aliados com cargos de destaque na prefeitura, Pelegrino tem o partido do prefeito em sua chapa. Nos bastidores, entretanto, João Henrique é detonado sem cerimônia pelos dois candidatos.
Por esse motivo, o prefeito tende a manter-se afastado da campanha. Um eventual segundo turno entre DEM e PT deve trazer ao centro do embate o ex-prefeito de Salvador Mário Kertész (PMDB) e o deputado federal Márcio Marinho (PRB). Os dois aparecem na última pesquisa com 8% e 6% das intenções de voto, respectivamente, e podem fazer a diferença na escolha do próximo prefeito, caso suas próprias candidaturas não decolem até outubro.
Nos bastidores da campanha de ACM Neto, o sentimento é de que o pemedebista seguirá o candidato com maiores chances de vitória, já que não que Kertész demonstra grande predileção por nenhum dos dois. Já Marinho, que é pastor da Igreja Universal do Reino de Deus e foi o vice de ACM em 2008, já estaria apalavrado com Pelegrino para o segundo turno. Pode ser um reforço decisivo para o candidato do PT, cujo comitê fica na Avenida Antonio Carlos Magalhães.
FONTE: VALOR ECONÔMICO
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