O poder mudou a vida
dos dois principais personagens da Operação Porto Seguro. Paulo Vieira, que em
2004 declarou ter R$ 135 mil, hoje é dono de bens milionários. Já Rosemary
Noronha usou a proximidade com Lula até para dar pitos em ministros.
De secretária
petista a protagonista de fraudes
Ex-chefe de gabinete da Presidência chegava a passar pito em ministros
Tatiana Farah, Sérgio Roxo
Poderosa. Rose gostava de mostrar influência no PT, mas colecionou desafetos
no partido
No pé do ouvido. Lula conheceu Rose quando ela trabalhava com Dirceu como
secretária do PT
SÃO PAULO - O ano é 1997. Luiz Inácio Lula da Silva ainda sonha ser
presidente. Os petistas se reúnem, em seu XI Encontro Nacional, no antigo Hotel
Glória, no Rio. De calças justas e um cinto largo, com detalhes em metal,
Rosemary Noronha cruza o saguão aos gritos. Vai ralhar com um repórter que,
inadvertidamente, recolhera de uma mesa cópias das teses que seriam debatidas
pelo partido.
Rose, como é conhecida, tinha a função de secretária da presidência do PT,
na época exercida por José Dirceu, recém-condenado a dez anos e dez meses de
prisão no escândalo do mensalão. Foi para Dirceu que ela ligou, na manhã do
último dia 23, para pedir ajuda, quando a Polícia Federal amanheceu em sua casa
para fazer uma busca ao deflagrar a Operação Porto Seguro.
Dirceu ficou furioso, contaram seus interlocutores. Rose ligou, também, para
o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, para reclamar que os agentes da PF
haviam entrado na residência e estavam recolhendo papéis, computadores e o que
mais parecesse suspeito. Cardozo não atendeu.
- O que ela esperava? Que nós fôssemos parar porque ela estava falando com o
nosso chefe? - ironiza uma delegada da Polícia Federal.
Rose podia mesmo esperar que o ministro a ajudasse. Desde os tempos de
secretária do PT, a ex-chefe de gabinete da Presidência da República em São
Paulo coleciona desafetos porque reina, ou tenta reinar, absoluta nos
bastidores do enclave petista. Tem relação muito próxima com o ex-presidente
Lula.
Em agosto de 1997, uma cena de gentileza explícita de Lula chamou a atenção
em um ensaio da Mangueira, do qual participava a cúpula petista. Servido pelo
garçom, Lula se levantou da mesa onde estava para levar uma bandeja de salgados
até Rose.
Desde 2003, quando foi nomeada por Lula para trabalhar na Presidência, Rose
fez 24 viagens ao exterior na comitiva presidencial. Ela tinha direito a
passaporte diplomático. A volta ao mundo não impediu que quase brigasse com
Paulo Vieira, ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA) acusado de chefiar
a quadrilha de corrupção e tráfico de influência. O motivo da discussão foi
simplório: ela queria fazer um cruzeiro entre Santos e Rio com a presença da
dupla sertaneja Bruno e Marrone.
No gabinete da Presidência, Rose foi ganhando cada vez mais espaço. Gostava
de ser chamada de "madame", de dar ordens e de usar coisas que
considerava chiques. A ex-bancária, hoje com 57 anos e duas filhas, adorava
ostentar poder. Arrumava confusão com porteiros e seguranças do prédio do Banco
do Brasil onde fica o escritório da Presidência.
"Ela acha que manda"
Rose ganhou o cargo após a saída de um dos aliados de Lula, José Carlos
Espinoza. Se, como secretária do PT, gritava com repórteres, como chefe de
gabinete chegava até a passar pito em ministros. Em uma cena dessas, em que
tentou impedir que um ministro próximo de Lula fizesse uma reunião em
determinada sala, ouviu-se do ministro:
- Ela acha que manda.
Se os petistas temiam Rose por sua proximidade com o poder, hoje temem falar
sobre a ex-chefe de gabinete.
- Ela é arrogante. Acha que manda mais do que manda. É insuportável -
reclama antigo funcionário do PT, que prefere não se identificar.
Nos e-mails interceptados pela PF na operação Porto Seguro, Rose faz questão
de mostrar influência a Paulo Vieira, que, segundo ela, é seu amigo há dez
anos. Cita PR (presidente da República, como chama Lula mesmo depois do governo
Dilma) e JD (José Dirceu).
No prédio onde mora, no bairro Bela Vista, em São Paulo, os vizinhos a
consideram uma pessoa discreta.
Um deles diz que ela "se acha porque anda com o povo de Brasília".
Quando começou no cargo de secretária no PT, nos anos 1990, a ex-bancária era
mais dócil.
Nos e-mails trocados pelos irmãos Vieira, indiciados pela PF, há muitas
reclamações contra Rose. Ela é descrita como "uma máquina de gastar".
Em nota divulgada na quinta-feira, Rose afirmou que é inocente e que nunca
fez nada ilegal ou irregular que favorecesse Lula ou Dirceu.
Fonte: O Globo
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