- O Globo
O cenário internacional, neste momento que estamos passando por uma das crises econômica e política das mais complexas da nossa história, tem um ponto em vermelho no calendário: dia 23 de junho. Dentro de menos de duas semanas os cidadãos do Reino Unido vão decidir se querem ou não continuar na União Europeia. E isso pode ter várias consequências.
Ontem, as bolsas caíram no mundo e no Brasil depois que foi divulgada uma nova pesquisa mostrando aumento do apoio à saída dos ingleses da União Europeia. Aumentou o percentual dos que apoiam a retirada contra os que querem ficar. A pesquisa divulgada pelo jornal “Independent”, na Inglaterra, mostrou que o “sim”, favorável à saída, subiu quatro pontos nas intenções dos ingleses enquanto o “não” caiu quatro. Com isso, o “sim” abriu 10 pontos à frente do “não”, com 55% contra 45%. Essa é a maior vantagem desde que pesquisas começaram a ser feitas.
Se o resultado do referendo for favorável ao chamado “Brexit”, isso afeta sobretudo a confiança. E não apenas na economia inglesa ou europeia. Quando há uma queda da confiança, os efeitos no mercado são generalizados.
Os temores dos investidores de que a elevação dos juros americanos fosse levar mais capital para os Estados Unidos, tirando financiamento dos países em crise, como o Brasil, ficou menor nos últimos dias. A queda do ritmo de criação dos empregos nos Estados Unidos adiou esse perspectiva de mudança na política monetária americana.
O medo que assombrou o mundo, anos atrás, de uma queda rápida da economia chinesa, foi sendo reduzido. A China deixou de ser a máquina de alto crescimento para entrar no que os governantes chineses definiram como o “novo normal”: um ritmo mais moderado de crescimento.
A crise da Europa foi a parte mais prolongada dos problemas financeiros globais após a quebra do banco Lehman Brothers em 2008. O complexo nó da dívida soberana de vários países europeus provocou reflexos em inúmeros países. Se o temor de saída da Grécia da zona do euro fez oscilar cotações nos mercados, imagina o que poderá acontecer com a saída do Reino Unido da União Europeia.
Há efeitos econômicos, como explica André Leite, sócio e CIO da TAG Investimentos:
— A saída do Reino Unido da União Europeia provocaria um efeito cascata sobre o euro e os títulos públicos da região. Esse é o receio do mercado financeiro, que acompanha com atenção o plebiscito que decidirá o futuro dos ingleses, no próximo dia 23. O risco é que outros países também queiram deixar o bloco, colocando novamente o euro na berlinda e trazendo de volta a crise fiscal, com o aumento da desconfiança sobre países como Itália, Portugal e Espanha.
O impacto direto no Reino Unido pode ser o êxodo de instituições financeiras do mercado de Londres, que prefiram ter a sede em algum país integrado ao bloco. Há o perigo também de aumentar o desejo de autonomia de regiões como Escócia, e, em dominó, regiões da Espanha que também lutam por autonomia.
A ideia da federação sempre esteve presente na engenharia política da região. O esforço é para que haja mais Europa e não menos. A Inglaterra sempre foi refratária à união e aos tratados que dão aos europeus de todas as regiões, inclusive aos do leste ou de países mais pobres, o direito de livre circulação. O país nunca aceitou abrir mão da própria moeda. Mas agora mais do que os imigrantes de outros países europeus, o que assusta os ingleses, com sua boa política de bem estar social, é a onda de refugiados da África e dos países em conflito no Oriente Médio.
Esse é o funcionamento do mundo globalizado de hoje. Vítimas de guerras civis, terrorismos, perseguições étnicas e religiosas fogem para a Europa em busca de algum tipo de refúgio e de um novo sonho.
— Se a Inglaterra sair, a tendência é que o euro perca valor, assim como os títulos públicos de países como Espanha, Portugal e Itália. A crise fiscal, que estava relativamente sob controle, pode voltar a ser um problema para o mundo — explicou André Leite.
E há um temor maior do que as eventuais oscilações econômicas: o de que a escolha dos ingleses pelo isolamento fortaleça os ultranacionalistas que querem radicalizar o fechamento de seus países.
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