Austeridade, quem diria, foi o grande tema dos prefeitos, em seus discursos de posse, nas maiores capitais brasileiras. Assim como grande parte dos Estados, as grandes cidades estão atoladas em dificuldades financeiras. Em algumas nem o pagamento do funcionalismo está garantido. A severa contração econômica iniciada no fim de 2014 reduziu os impostos e contribuições coletados diretamente pelos municípios, assim como a arrecadação estadual e federal.
Dependentes de transferência de recursos de Estados e da União, até para pedir socorro os governos municipais tiveram dificuldade nos últimos dois anos. Mas só em parte os problemas são atribuíveis à retração dos negócios e ao desemprego crescente. Erros de administração, gastança e irresponsabilidade no uso de verbas cada vez mais escassas foram as causas principais do desastre, em todos os níveis de governo.
Pela primeira vez em muitos anos, prefeitos substituíram, em seus discursos de posse, o costumeiro cardápio de maravilhas e delícias pela promessa de medidas sérias de contenção de gastos e redução do aparelho administrativo.
O Estado reproduziu, na primeira página da edição de ontem, declarações de prefeitos de algumas das capitais em piores condições. Vale a pena realçar pontos comuns. “A ordem é a seguinte: é proibido gastar”, disse Marcelo Crivella (PRB), ao assumir a prefeitura do Rio de Janeiro. “(Vamos) governar abrindo mão de cargos, abrindo mão de emprego, de gastos desnecessários”, anunciou Alexandre Kalil (PHS) em Belo Horizonte. “Vamos deixar só cargos em comissão necessários para a máquina funcionar”, explicou Nelson Marchezan Jr. (PSDB) em Porto Alegre. “(Vamos) enxugar a máquina da prefeitura em 40%”, prometeu Rafael Greca (PMN) aos curitibanos. O discurso de João Doria (PSDB) em São Paulo foi mais ameno, mas ele já se havia comprometido com a redução de secretarias e de postos comissionados e com a contenção de gastos.
Não se falou de cortes provisórios, mas da redução de gastos inúteis, da eliminação de pessoal excessivo e da reformatação do aparelho administrativo, com extinção de órgãos e de pessoal supérfluos. Admitiu-se o inchaço da administração municipal. Reconheceu-se o descontrole da folha de salários e dos custos vinculados a obrigações trabalhistas. É cedo para dizer se as palavras serão convertidas em ações, mas as falas foram animadoras.
Pela primeira vez em muito tempo foi reconhecido um fato inegável, quando se trata da maior parte da administração pública brasileira: é preciso fazer mais com menos. Mais que isso: é possível oferecer aos cidadãos serviços melhores com gastos iguais ou inferiores aos contabilizados durante anos.
Em termos financeiros, houve na última década um claro relaxamento da disciplina fiscal. Às vezes com estímulo direto, às vezes por mero contágio, governadores e prefeitos acompanharam a deterioração das práticas fiscais no governo federal. Em termos de gerência, houve a disseminação do desprezo à eficiência e à qualidade do trabalho interno e dos serviços prestados à população. A distribuição de benefícios, por meio de bolsas, de créditos e de outras benesses de caráter populista, nunca poderia compensar a devastação de serviços essenciais de segurança, educação e saúde.
O governo federal já ensaia a recuperação de padrões administrativos, com novas normas para direção e gestão de estatais e também com a eliminação de cargos comissionados e de confiança. Por enquanto foi anunciada a extinção de 4.689 postos desse tipo. Um exame severo provavelmente permitirá ampliar essa lista.
Mas será preciso ir muito além para uma reforma efetiva. Será necessário avançar na profissionalização do funcionalismo e na valorização dos conceitos de planejamento, eficiência e qualidade, tratados como bandeiras conservadoras pelos governos petistas. Buscar o equilíbrio de longo prazo nas contas públicas será uma parte indispensável da renovação. Mas a gestão pública só estará renovada quando os serviços prestados forem proporcionais à cada centavo de tributo, como nos países politicamente mais desenvolvidos.
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