Se o investimento público atingiu o patamar mais baixo das últimas cinco décadas, se é certo que teremos déficit primário pelo menos até 2021 e existe um teto constitucional a limitar os gastos da União, se o Brasil ocupa apenas a 80ª posição entre 137 países no ranking de competitividade do Fórum Econômico Mundial e tem na carência de infraestrutura um de seus gargalos mais evidentes, era razoável a expectativa de que os candidatos à Presidência da República explicassem como imaginam destravar investimentos em áreas como energia elétrica, petróleo e gás, portos, aeroportos, rodovias e ferrovias com dinheiro privado.
Infelizmente, o que se vê ainda é uma mistura de equívocos e ideias confusas quando se trata de privatizações e concessões de infraestrutura. A começar pela promessa de Ciro Gomes (PDT) de reverter o marco regulatório do pré-sal e retomar campos leiloados recentemente. A participação obrigatória da Petrobras na nova fronteira petrolífera - exigência removida em 2016 - mostrou-se um erro que desacelerou as atividades de exploração no momento em que o petróleo vive provavelmente seu último ciclo de protagonismo energético e a matriz muda progressivamente para fontes renováveis.
Estima-se que o leilão de excedentes do contrato de cessão onerosa celebrado em 2010 poderia movimentar até R$ 150 bilhões em novos sistemas de produção - sondas, plataformas marítimas, outros equipamentos pesados - e na contratação de milhares de trabalhadores especializados. Frear esses planos ou insistir no monopólio da Petrobras, ainda uma das petroleiras mais endividadas do mundo, para a extração dos recursos fará bem à economia.
Se existe uma boa discussão a ser feita, certamente é a possibilidade de mudança do regime de partilha para o modelo de concessão. A dificuldade recente da PPSA em vender os barris de petróleo a que tem direito no pré-sal demonstra como a escolha feita no passado gera uma burocracia desnecessária.
Também não soa factível o plano do economista Paulo Guedes, mentor do deputado Jair Bolsonaro (PSL), de privatizar "tudo" e arrecadar até R$ 700 bilhões com esse saldão generalizado de ativos. Nem se coloca aqui a pertinência de manter ou não bancos públicos atuantes no crédito agrícola ou no desenvolvimento habitacional, estatais para administrar aeroportos que dão prejuízo nos confins da Amazônia ou para entregar correspondências onde ninguém mais aceitaria. É de se imaginar apenas a viabilidade de tocar um plano de tal magnitude em um país que pena até para leiloar seis distribuidoras de energia altamente deficitárias que prestam serviços cujos indicadores de qualidade estão abaixo de quase todas as suas concorrentes. Quando se quer privatizar "tudo", sem prioridades ou foco, é mais provável não privatizar nada.
O ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) tem defendido uma postura mais aberta às privatizações do que em 2006, quando foi candidato ao Palácio do Planalto pela primeira vez e desistiu dessa bandeira para evitar um tema polêmico de pouco apelo eleitoral. Já demonstrou apoio ao plano de capitalização da Eletrobras, com ressalvas à Chesf, e aproveitou entrevista dada ao Valor na semana passada para defender a venda de poços maduros no pós-sal. Também chamou a atenção sua defesa de quebra do monopólio (na prática) na área de refino, bem como uma participação mais ativa do setor privado em gasodutos e no sistema de distribuição de combustíveis.
Causa inquietação, porém, o silêncio absoluto - ou escassez de ideias? - em torno de outros dilemas da infraestrutura. Quem é a favor da renovação antecipada das concessões de ferrovias? Onde fazer os investimentos que serão exigidos em contrapartida? Como resolver os problemas das concessionárias de rodovias que entraram em inadimplência contratual e não conseguirão duplicar suas pistas? Deve-se leiloar aeroportos lucrativos como Congonhas e Santos Dumont ou eles são essenciais para manter o equilíbrio da rede de terminais como um todo? O governo deve preservar uma estatal que fabrica semicondutores que só opera no vermelho? Precisa de uma empresa para fazer o planejamento logístico ou isso pode ser feito por menos custo pelo próprio Ministério dos Transportes? Como privatizar mais estradas com uma tarifa de pedágio aceitável?
São perguntas para as quais não se ouviu nenhuma boa resposta até agora. Joga-se fora uma oportunidade de discutir, com maturidade, questões essenciais para o desenvolvimento da infraestrutura do país.
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