Destino de senador é o principal trunfo de ministro
Por Maria Cristina Fernandes | Valor Econômico
SÃO PAULO - Ao assumir o Ministério da Justiça debaixo de um bombardeio, Sergio Moro valeu-se do discurso de que iria para o governo porque sua pauta havia sido aceita pelo presidente. Acusado de ter aderido ao vencedor de uma disputa em que o principal concorrente era seu prisioneiro, Moro se defendeu dizendo que o presidente havia aderido à sua pauta, e não o contrário.
O ministro voltou a usar o mesmo argumento ao ser fritado em praça pública pelo presidente da República na entrevista à Rádio Bandeirantes. Ao dizer que assumira o compromisso de indicar Moro ao Supremo porque o ministro havia aberto mão de 22 anos de magistratura, Bolsonaro tentou colar a barganha no ministro.
Permitiu a livre interpretação de que Moro não foi para o governo em busca de realizar seu projeto de combate à corrupção mas de uma prebenda. Antecipa assim sua defesa contra futuras alegações de uma saída motivada pela frustração da pauta anticorrupção.
Não fez questão de defender os superpoderes de Moro. Ao contrário. Disse que se o conselho que controla atividades financeiras no país, o Coaf, voltar para o Ministério da Economia, não oferecerá problemas para o ministro da Justiça, que mantém boas relações com Paulo Guedes.
E foi além. O Coaf, disse, deve se manter independente. Só não pode vazar informações. Depois de deitar e rolar em cima dos vazamentos da Lava-Jato contra seus adversários na política, o presidente teve que amargar o expediente, desta vez, contra seu filho, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), que teve sua movimentação bancária exposta antes da quebra oficial do sigilo autorizada ontem pela justiça federal no Rio.
Se Bolsonaro atraiu Moro para o governo para neutralizá-lo, com sucessivas derrotas, e uma promessa irrealizável, como a da vaga no Supremo, porque exposta a 18 meses de intempéries, o ministro da Justiça também tem seu trunfo na queda de braço com o presidente.
O principal são as relações da família Bolsonaro com as milícias. Com ou sem Coaf, Moro tem como avançar nas investigações que hoje cercam o senador Flávio. Se Fabrício Queiroz ainda não teve um mandado de prisão expedido contra si é pelas salvaguardas de um momento político ainda muito distante da sucessão presidencial.
A despeito dos desgastes enfrentados desde sua posse como ministro, Moro mantém popularidade capaz de rivalizar com o presidente da República no seu eleitorado. E poderá turbiná-la ainda mais se, ao prosseguir na sua pauta, como tem dito, cruzar com o caminho do filho e, por que não dizer, do próprio presidente.
As crescentes hostilidades de Bolsonaro contra os militares de seu governo ajudaram ainda a selar velha aliança da farda com o antigo togado. Agraciado pelo então comandante do Exército, o general Eduardo Villas-Boas, com a principal condecoração da arma, a Ordem do Mérito Militar, em 2017, Moro foi alvo, na semana passada, em pleno tiroteio entre o capitão e seus generais, de singela homenagem.
Villas-Boas compareceu à sessão da Comissão de Segurança da Câmara que ouviu o ministro sobre o pacote anticrime. Com o tuíte da véspera, contra o preferido do presidente, Olavo de Carvalho, demonstrara desencanto com seu escolhido em 2018. Com sua presença, sinalizou que seu encanto já tem nova guarida.
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