quinta-feira, 14 de março de 2024

William Waack - O museu das ideias

O Estado de S. Paulo

As forças políticas no governo têm dificuldades em aprender com o passado

O Palácio do Planalto virou hoje o principal pavilhão de exposições do parque jurássico de ideias. São aquelas que foram testadas e derrotadas pelos fatos, e nas quais se insiste acreditando que o problema com as ideias (estatismo, por exemplo) não era de mérito, mas de dose (pouca).

Por esse motivo tem sido tão frequentemente aplicada aos inquilinos do Planalto a frase “Nada aprenderam e nada esqueceram”. Ela capta o fato de que, mesmo diante de grandes acontecimentos de resultados evidentes (como o desastre econômico ao fim da era petista), alguns indivíduos e regimes não conseguem aprender com erros passados.

O presidente Lula é a figura-símbolo hoje do que a Economist chamou recentemente de “ancien régime”: um conjunto de forças políticas e instituições lutando para se manter donas do poder. Esse “velho” sistema está se recuperando, resistindo e vencendo, assinala a revista.

Por isso não se pode atribuir apenas ao presidente os impulsos intervencionistas em relação a estatais ou empresas já privatizadas. É muito mais amplo do que o PT o conjunto de forças políticas empenhadas em transformar nacos da máquina do Estado e empresas estatais em ferramentas na defesa de seus interesses privados setoriais ou regionais. Sempre foi assim com a Petrobras.

No caso dos ataques à governança de Vale e Eletrobras, porém, o motivo não está apenas no “dirigismo estatista do PT” ou no rancor pessoal de Lula com privatizações. O poder público perdeu qualquer capacidade significativa de realizar investimentos vultosos (ferrovias ou “utilities”, por exemplo). De onde vão sair recursos para tocar obras que geram mais negócios e têm grande impacto em regiões e bases eleitorais, senão das privatizadas?

O curioso é que as ideias retrógradas na ala ideológica no Planalto e seu conluio com o mosaico de forças políticas e seus interesses particulares produziram situações nas quais se cancelam mutuamente, como demonstrado nos detalhes da luta intestina pelo controle da Petrobras – colocando em campos opostos ministérios “fortes”, conselho e diretoria da empresa, criando notável confusão e péssimo ruído para investidores de todo tipo.

Terremotos geopolíticos recentes expuseram mais uma vez mundo afora a falsa dicotomia entre “mercados” e “Estado indutor”, um dos destaques no pavilhão de ideias jurássicas no Planalto. O que esses mesmos acontecimentos ressaltam é a importância de estratégias políticas que aprenderam com erros do passado e se adaptam constantemente às condições presentes.

É coisa bem diferente da atual politicagem.

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