O Ministério Público Federal (MPF) vê indícios de que o suposto cartel dos trens atuou também em licitações federais envolvendo a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU), disse a procuradora da República Karen Louise Jeanette Kahn. Desde 1998, algumas das principais empresas investigadas mantêm ou mantiveram contratos com a estatal, ligada ao Ministério das Cidades.
Esquema de cartel em metrôs pode ter se espalhado pelo País, diz procuradora
Bruno Ribeiro, Fausto Macedo, Marcelo Godoy
O Ministério Público Federal (MPF) vê indícios de que o suposto esquema de cartel nas obras do Metrô de São Paulo tenha atuado também em licitações federais envolvendo a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU). A afirmação foi feita ontem pela procuradora da República em São Paulo Karen Louise Jeanette Kahn, responsável pela investigação do caso na área federal.
Algumas da principais empresas investigadas no caso mantêm e mantiveram contratos com a estatal federal, vinculada ao Ministério das Cidades, desde 1998 até agora. "Há vários contratos (federais) também. Há possíveis outros cartéis em âmbito federal. Aqui estamos falando, via de regra, em cartéis estaduais com efeito na esfera federal, crime de evasão. Envolve recursos da União", disse Karen. Em seguida, questionada especificamente sobre a CBTU, ela disse: "A CBTU tem alguns possíveis envolvimentos. Isso depende da análise das provas. Agente tem a suspeita".
Karen afirmou que apura em tese diversos delitos. Além do cartel, haveria corrupção internacional, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e "formação de quadrilha, eventualmente com enquadramento na nova lei de organizações criminosas". Muitas empresas citadas aparecem em outras apurações do MPF, o que reforça as suspeitas da procuradora Karen.
A procuradora não especificou quais licitações teriam sido fraudadas nem o período em que elas ocorreram - se envolveriam, por exemplo, os governos de Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2002), de Luiz Inácio Lula da Silva (2003 a 2010) ou de Dilma Rousseff.
A suspeita de cartel no Metro em governos tucanos paulistas antecipou a guerra prevista para 2014 entre PSDB e PT. Desgastados com as denúncias, os tucanos reagiram afirmando que há suspeitas de cartéis cm outros sete Estados e no Distrito Federal. Em algumas capitais, como Belo Horizonte e Recife, a CBTU organizou a licitação e opera o sistema de transporte. Em outras, como Salvador e Fortaleza, foram aplicadas verbas federais no metrô, mas o sistema é operado por estatais estaduais.
Investigadas. As empresas Siemens e Alstom - que estão no centro do caso - dizem que colaboram com as investigações em curso. A Alstom é investigada desde 2009. O caso Siemens veio à tona no mês passado quando executivos da multinacional firmaram um acordo de leniência com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cadê)- relatam os ilícitos e, em troca, não são processados. O Ministério das Cidades informou que "qualquer irregularidade eventualmente encontrada será apurada (veja texto acima).
Ao lado de Carlos Emmanuel Joppert Ragazzo, superintendente-geral do Cade, Karen é uma das signatárias do acordo de leniência feito por seis ex-executivos da Siemens para delatar o cartel. Eles entregaram provas da atuação do grupo para fraudar licitações da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e dos Metrôs de São Paulo e de Brasília.
Nas 1.073 páginas do inquérito do Cade há citações a obras e licitações em outras capitais - Goiânia, Rio, Recife, Belo Horizonte, Fortaleza e Salvador - e também no Chile, em Santiago. Em trocas de e-mails, os executivos da empresa expõem análises de mercado ou seus planos para fornecer equipamentos em futuros contratos. Mas, ao contrários das seis licitações em São Paulo e no DF, não revelam provas contundentes da atuação do cartel ou indícios de pagamento de propina.
Inquéritos. Na Justiça estadual há 45 inquéritos que apuram suposta improbidade administrativa dos envolvidos e um inquérito criminal para investigar prática de cartel Assim como o MPF, o Ministério Público Estadual (MPE) também assinou o acordo de leniência com a Siemens e o Cade. Mas nenhum deles teve acesso ao material apreendido na operação de busca e apreensão realizada em 4 de julho. Por isso, Karen pediu à Justiça que lhe garanta acesso aos dados.
A procuradora não vê ação política do Cade no caso, como acusa o PSDB. "Eu não entendo (a demora do Cade) como uma tentativa de dificultar a obtenção das provas. É uma questão conceitual O Cade entende que o acesso deve ser pelo Judiciário, nós entendemos que não por conta de termos sido parte do acordo de leniência." E emendou: "Não estamos tentando abrir caminho para nenhum tipo de benefício para o Estado de São Paulo ou qualquer governo. Nosso pedido é para que possamos exercer nossa atribuição, pura e simplesmente. São Paulo é investigado, nas autoridades são investiga-1as, e acredito que aí existe uma diferença conceituai" Para ela, a dificuldade no acesso às provas atrasa apuração.
Esfera federal
"Há vários contratos (federais) também. Há possíveis outros cartéis em âmbito federal. Aqui estamos falando, via de regra, em cartéis estaduais com efeito na esfera federal"
Karen Kahn,
Procuradora da República em SP
Fonte: O Estado de S. Paulo
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