terça-feira, 13 de agosto de 2013

Urnas dão maior derrota ao kirchnerismo em dez anos

Grupo da presidente perde em 15 de 24 províncias e obtém só 26% dos votos nas primárias

Janaína Figueiredo
Correspondente

BUEOS AIRES - O governo da Argentina insiste em ver o lado positivo do cenário eleitoral e destacar que as Primárias Abertas Simultâneas e Obrigatórias (Paso) realizadas no domingo passado confirmaram que o kirchnerismo continua sendo o principal movimento político do país. Mas os números oficiais mostraram que a Frente para a Vitória (FPV, sublegenda do peronismo fundada pelo ex-presidente Néstor Kirchner) sofreu sua mais grave derrota desde que chegou ao poder, em maio de 2003. Após a eleição de Kirchner com apenas 22% dos votos, seu partido se fortaleceu e foi o grande vencedor de todas as eleições realizadas na última década, com exceção das legislativas de 2009, quando, com o ex-presidente como principal candidato, a FPV obteve 31,2% dos votos e ficou em segundo lugar na província de Buenos Aires.

Nas últimas primárias, o percentual obtido pela frente peronista, agora liderada por Cristina Kirchner, alcançou apenas 26% e foi derrotada nos principais distritos eleitorais (Buenos Aires, Córdoba, Mendoza, Santa Fe e Capital Federal) e em províncias menores como Santa Cruz (terra natal de Kirchner), La Rioja, Catamarca, Jujuy e Corrientes - ao todo, foram perdidas 15 de 24 províncias. Ontem, com os dados definitivos em mãos, importantes líderes da oposição asseguraram que a Argentina já está vivendo o fim de um ciclo político.

Pela primeira vez, desde 2003, nenhum membro da família Kirchner foi candidato. A sensação entre políticos e analistas é que o resultado do pleito legislativo do próximo dia 27 de outubro (as primárias serviram para escolher as listas de candidatos) poderia ser ainda mais adverso para o governo. Se isso se confirmar nas urnas, a oposição teria reais chances de construir uma alternativa de poder para a disputa presidencial de 2015.

- O kirchnerismo é o passado - declarou Sergio Massa, fenômeno eleitoral das primárias.

Transformado em opositor, foi justamente esse ex-chefe de Gabinete de Cristina e prefeito do município de Tigre, na província de Buenos Aires, o candidato a deputado mais votado da província onde vivem 38% dos eleitores do país. Mas, embora vitoriosa nas províncias mais importantes, a oposição ainda tem que encontrar maneiras de resolver aquela que é sua maior fraqueza - a fragmentação.

Presença ampla vira trunfo

O mesmo diagnóstico foi compartilhado pelo governador de Córdoba, o peronista José Manuel de la Sota, cujos candidatos foram os mais votados, e o chefe de governo da cidade de Buenos Aires, Mauricio Macri, que também se deu bem nas primárias. Massa conquistou 35,05% dos votos, contra 29,65% alcançados por Martín Insaurralde, prefeito do município de Lomas de Zamora e candidato de Cristina na província.

- A sociedade escolheu o caminho dos que pensam e fazem propostas pensando no futuro - disse o líder da chamada Frente Renovadora, uma nova sublegenda peronista que já conta com a participação de personalidades como o economista Roberto Lavagna, ex-ministro da Economia de Kirchner, e Alberto Fernández, ex-chefe de Gabinete de Néstor e Cristina, entre outros.

Após as primárias, a presidente tentou se mostrar tranquila e centrou seu discurso na maior fortaleza do kirchnerismo: ser o único partido presente nos 24 distritos eleitorais do país. O mau desempenho de seus candidatos e, paralelamente, o alto grau de adesão a adversários como Massa, o ex-vice presidente Julio Cobos em Mendoza, e seus rivais em Córdoba, Santa Fe e até mesmo Santa Cruz, não foi mencionado por Cristina. O que para muitos analistas foi um "voto castigo" contra o kirchnerismo não modificou em nada as posições da presidente, que prometeu "aprofundar as transformações" que seu governo vem realizando no país.

O mais provável, anteciparam analistas, é que o kirchnerismo não perca muitas cadeiras nem na Câmara. A grande incógnita é o Senado, peça-chave para uma eventual reforma constitucional que permitiria a terceira reeleição de Cristina.

O governo renovará 16 senadores, e a oposição, apenas oito. O novo Congresso (será renovada metade da Câmara e um terço do Senado) assumirá no próximo mês de dezembro. Como fez em 2009, quando Kirchner sofreu um revés na província de Buenos Aires, o governo poderia aproveitar os próximos meses para promover a aprovação de iniciativas polêmicas, que dificilmente possam obter sinal verde a partir de dezembro. Há quatro anos, a Casa Rosada avançou com a Lei de Meios, ainda motivo de disputa judicial com o grupo Clarín.

Fonte: O Globo

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