segunda-feira, 18 de dezembro de 2023

Chile rejeita de novo projeto para substituir Constituição de Pinochet

Eleitores disseram “não” a texto que era considerado fortemente conservador; primeiro projeto tinha sido criticado por ser muito progressista

“Prefiro algo mau a algo péssimo”, resumiu ontem a ex-presidente Michelle Bachelet.

Valor Econômico

Eleitores do Chile disseram “não” ontem a uma proposta de nova Constituição de viés conservador que, se aprovada, substituiria a Carta atual, promulgada durante a ditadura de Augusto Pinochet. Com 90,16% das urnas apuradas, 55,68% dos chilenos rejeitaram o texto e 44,42% o aprovaram.

Foi a segunda vez que o Chile realizou um plebiscito para consultar a população sobre uma nova Constituição. O texto anterior, com contornos fortemente de esquerda e antimercado, também havia sido barrado nas urnas.

A tentativa de mudança constitucional ganhou impulso com os grandes protestos que tomaram o país em 2019 por melhorias no sistema de aposentadoria, na educação, na saúde e por menos desigualdade.

O presidente Gabriel Boric já disse que não levará adiante o processo de construção de um terceiro projeto da Constituição.

Pesquisas de intenção de voto vinham apontando que a maioria dos chilenos iria votar contra o projeto que foi às urnas ontem.

Analistas vinham afirmando que a população já estava cansada do extenso debate no qual o país mergulhou nos últimos anos em torno de renovar ou não a Carta Magna.

O projeto colocado sob consulta ontem enfrentava a resistência de setores de esquerda, que classificavam o texto como limitador de direitos.

O texto foi considerado mais conservador em temas de costumes e moral do que a Constituição dos anos 80, em vigor. E mais pró-mercado. Entre os pontos incluídos no projeto havia regras que fortaleciam o direito à propriedade privada, que criavam condições mais rigorosas sobre imigrantes e também que restringiam as possibilidades de aborto. Outros pontos eram vistos como pouco alinhados com a defesa do meio ambiente e com direitos trabalhistas.

Os críticos do projeto chamavam atenção para o fato de que a Constituição de Pinochet havia ganhado mais de 70 emendas e que seria preferível manter a versão atual a aprovar outra, conservadora. “Prefiro algo mau a algo péssimo”, resumiu ontem a ex-presidente Michelle Bachelet.

Defensores do projeto rejeitado ontem diziam que ele previa regras que ajudariam no crescimento econômico e que daria ao país mais ferramentas para controlar a imigração ilegal e a criminalidade.

O cenário mais provável é que os ativos chilenos no mercado financeiro não sejam afetados, uma vez que o resultado já era previso e uma vez que regras já consideradas favoráveis a investimento continuam valendo.

Boric deve explorar a derrota do projeto como uma vitória contra a direita chilena.

No, entanto, o jovem presidente sai do plebiscito sem ter conseguido o que era uma de suas metas: substituir a Carta da era Pinochet por um novo texto.

As pesquisas apontavam para uma vitória do “não” - ainda que as nas últimas semanas a população pareceu mais dividida.

Na semana passada a Fitch Ratings manteve a classificação de risco do Chile e disse que não considerava que o plebiscito pudesse trazer uma guinada ao modelo econômico do país.

Mas analistas apontam que o resultado poderá manter latente em parte da população um clamor por mudanças.

Um dos cenários considerados é que, antes das eleições presidenciais de 2025, o tema volte a ganhar força e que a bandeira por um terceiro projeto constitucional entre na pauta dos candidatos.

Os chilenos rejeitaram um projeto que havia sido redigido por uma comissão de constituintes de esquerda e que acabou recebendo fortes críticas por ser considerado um texto que pregava mudanças radicais. Alguns dos pontos mais controversos do projeto anterior tratavam da eliminação do Senado e a criação de um sistema paralelo de Justiça, que cuidaria de disputas envolvendo a população indígena.

O texto rejeitado ontem tinha sido escrito por constituintes mais à direita. Após muito debate, os chilenos mostraram que não encontraram ainda um meio termo para as regras do país.

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