O Povo (CE)
Em crise existencial profunda, tédio mortal e
orgulho desmedido, vai até a Assembleia Legislativa do Estado do Ceará e faz um
pacto com Mefistófeles, o diabo de Goethe, "o espírito que sempre
nega". Que negou a pandemia, o distanciamento social, a vacina, que
tentando um golpe de estado negou a própria democracia
Fausto, personagem de Goethe, é um homem sábio, "estudei filosofia, direito, medicina
e, infelizmente, também teologia", aos 15 anos até venceu um prêmio
literário em um concurso de redação sobre a vida e obra de Luís de Camões, e
deixou a pequena Sobral para conhecer Lisboa às expensas do governo português.
Um prodígio!
Fausto é não apenas um homem erudito, doutor em várias ciências, visiting scholar na Harvard Law School, é também o servo preferido de Deus, homem em quem se deposita a fé na humanidade. Confiante em sua tenacidade, Deus aceita o desafio, e permite que Fausto seja tentado pelo Diabo. "Enquanto ele viver na Terra, / Não te proíbo que o tentes. / O homem erra enquanto busca". E como erra, esse homem que busca.
Mas Fausto é também um homem
decepcionado. Cedo percebe que o saber acadêmico não é o bastante. Cedo
compreende que tem o melhor projeto para o país, um projeto nacional de
desenvolvimento com começo, meio e fim, mas que a mediocridade humana e essa
polarização odienta e irracional, não o permitem realizar. Até os artistas
e intelectuais lhe são inimigos, oportunistas, hipócritas, todos fascistas. De
direita e de esquerda, todos fascistas. Fausto amargura a profunda solidão de
seu brilhantismo e de seu amor não correspondido por Helena de Tróia e pelo
povo brasileiro.
É por isso que Fausto, em crise existencial
profunda, tédio mortal e orgulho desmedido, vai até a Assembleia
Legislativa do Estado do Ceará e faz um pacto com Mefistófeles, o diabo de
Goethe, "o espírito que sempre nega". Que negou a pandemia, o
distanciamento social, a vacina, que tentando um golpe de estado negou a
própria democracia.
Mefistófeles, Silvana, Alcides, André, Carmelo e Wagner prometem
tirar Fausto da inércia. O acordo com o demônio é coisa simples: se
Mefistófeles der a Fausto uma experiência de transcendência na Terra, um
momento de plena realização e fim de toda busca, tão feliz que ele deseje
permanecer nele para sempre, a derrota eleitoral do PT no Ceará; então, Fausto,
feliz, entregará sua alma à Silvana, Alcides, André, Carmelo, Wagner, e ao
bolsonarismo mais vulgar.
O final, todos conhecemos: Fausto está
cego. Não enxerga a realidade do pântano à sua volta. Tornou-se
incapaz de distinguir o real da utopia. Fausto, plenamente realizado na mentira
que vive, profere, então, as palavras de selam seu pacto com Mefistófeles:
"Para este instante, eu diria: Fica, és tão belo!", "Alcides tem
todos os dotes, como possível candidato ao Senado. (...) Alcides salta longe
pelas suas qualidades e por ser uma pessoa nova na política, apesar dos
seus 57 anos. Alcides é homem de fé, homem de testemunho".
E depois dessa, ainda há quem diga que a vida não imita a arte.
*Professor da Universidade do Cariri
Nenhum comentário:
Postar um comentário