Folha de S. Paulo
A maioria dos brasileiros pensa que governo e
oposição deveriam se unir em torno da defesa do país
A se confirmar em 1º de agosto, o tarifaço contra as exportações brasileiras, imposto por Donald Trump,
terá efeito negativo, imediato e inevitável na economia do país. Ainda assim,
seu simples anúncio engendrou uma oportunidade política única para fortalecer o
governo e o jogo democrático —e colocou na berlinda a direita bolsonarista,
cúmplice assumida do desastre anunciado— como, merecidamente, será julgada.
Resultados da pesquisa Genial/Quaest, divulgada na quinta-feira 17/07, ajudam a dar nitidez aos desafios tanto para o governo quanto ao bolsonarismo.
Maioria expressiva, incluindo uma parcela dos
apoiadores do ex-capitão, ficou sabendo da ameaça feita por Trump; acha que ele
está errado ao propagar a falácia de que os Estados
Unidos perdem ao comerciar com o Brasil; e considera que o americano
não tem direito de criticar o processo no qual Bolsonaro é réu. Porcentagem ainda maior de brasileiros
acredita que as tarifas astronômicas farão suas vidas piorar. Quanto à melhor
forma de enfrentar a ameaça, oito e tanto em cada dez entrevistados —sete e
tanto em cada dez autoproclamados bolsonaristas— pensam que governo e oposição deveriam se
unir em torno da defesa do país.
É sempre possível pensar que tamanho
incentivo à convergência política se deve à natureza do problema: uma ameaça
externa percebida como prepotente e capaz de prejudicar a vida de todos e cada
um.
Entretanto, dados da sondagem indicam que
outros fatores ainda fomentam o apoio a soluções negociadas e que promovam a
união dos brasileiros. De fato, o levantamento também tratou da reforma
do Imposto de Renda, permitindo saber que os cidadãos, em
peso, apoiam a proposta do governo de isentar os mais pobres e taxar os muito
ricos. Contudo, são maioria os que não gostam da retórica de pobres contra
ricos, por criar "briga e polarização". Apresentada como um dos
acertos da comunicação
da Presidência, a campanha que inundou as redes sociais batendo naquela
tecla só é apoiada por 38% das pessoas.
Especialistas dirão que a cultura política
que privilegia a negociação e a formação de consensos é mais adequada à
democracia pluralista. Nela, o debatido e o negociado sempre se impõem com
ganho: dois mais dois são sempre cinco. Mais ainda quando as instituições
políticas impedem a existência de maioria partidária e, em consequência, de
governos de um só partido, como é o caso do Brasil.
A grosseira prepotência de Donald Trump deu
ao governo Lula a
oportunidade de isolar em um canto a extrema-direita bolsonarista —aí incluídos
os governadores eleitos sob suas bandeiras. O aplauso ao tarifaço e a submissão
ao interesse pequeno do golpista e de sua patética família, desqualificam os
radicais de direita para dirigir o país em tempos difíceis. Tosco a mais não
poder, Trump também proporcionou a um governo cujo prestígio seguia ladeira
abaixo a oportunidade de assumir o comando de medidas previamente concertadas
com diferentes grupos da sociedade e com as lideranças do Congresso. Até aqui,
Lula tem seguido esse roteiro —recebendo em troca o reconhecimento da opinião
pública. A persistir nesse rumo, o ganho para a democracia irá muito além de
possíveis dividendos eleitorais ainda incertos e não sabidos.
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