terça-feira, 21 de junho de 2016

Consumo interno fraco inibe reação dos serviços – Editorial / Valor Econômico

O setor de serviços é geralmente o último a ser afetado em uma retração econômica e o primeiro a sair dela. O Brasil corre o risco de seguir apenas a parte ruim dessa regra. Enquanto a indústria ensaia uma recuperação, beneficiada pelo aumento das exportações favorecidas por um câmbio mais vantajoso, e a agropecuária segue o mesmo caminho, apoiada no mercado externo, os serviços rateiam, dependentes eminentemente do consumo interno, que perdeu o ímpeto, enfraquecido pelo aumento do desemprego e pela redução da renda, tendências que devem se aprofundar antes de melhorar.

Os serviços só refletiram a retração econômica no ano passado, enquanto a indústria já vinha com dificuldades desde o início da década, afetada por problemas de custo da mão de obra e produtividade. O varejo começou a ratear algum tempo depois e a agropecuária ainda cresce, sintonizada com a demanda externa. O Produto Interno Bruto (PIB) dos serviços encolheu 2,7% em 2015, registrando a primeira variação negativa da série histórica, enquanto a indústria teve contração de 6,2% e a agropecuária cresceu 1,8%, levando a economia a registrar recuo de 3,8%. Os piores desempenhos foram no comércio, que recuou 2,6%; na administração, saúde e educação públicas, 2%; e no transporte, armazenagem e correio, 1,7%


Com isso, o setor iniciou este ano com um carregamento estatístico negativo de 1,9%. Os dados da Pesquisa Mensal de Serviços (PMS)

do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) mostram que o setor continua fraco neste ano, enquanto outros segmentos mostram estabilização que anima a previsão de que o fundo do poço já passou ou está próximo de ser superado. O volume de serviços registrou queda de 4,5% em abril em comparação com igual mês de 2015, acumulando retração de 4,9% no ano e de 4,6% em 12 meses. Foi o 13º mês consecutivo de recuo e o pior abril desde 2012.

Os serviços mais representativos no levantamento tiveram desempenho ruim. Os serviços de transporte, inclusive os auxiliares, e de correio caíram 6,5% em abril na comparação com o mesmo mês de 2015 e 6,1% em 12 meses, e essa atividade, sozinha, teve contribuição negativa de 2 pontos percentuais na taxa mensal, resultado basicamente determinado pela fraca demanda da indústria. Somente o transporte terrestre recuou 8,8%. Também caíram o transporte aquaviário, 2,9%, o aéreo, 0,1%, e a armazenagem, serviços auxiliares e correio, 4,7%. Os serviços profissionais e administrativos tiveram forte recuo de 5,4%. Os serviços dirigidos às famílias caíram 3%, com a demanda esfriada pelo aumento do desemprego e queda da renda; e os de informação e comunicação, também 3%.

O único ponto positivo no horizonte é a queda registrada em abril ter sido inferior à de 5,9% na comparação entre março deste ano e igual mês de 2015, mas isso pode se dever mais à base de comparação. O próprio IBGE estimou que, para zerar as perdas deste ano, o setor de serviços deveria crescer 0,6% ao mês até dezembro, o que é considerado pouco provável. Espera-se que os sinais de reação da indústria, ao menos dos segmentos mais dependentes das exportações, repercutam na área de serviços, aumentando especialmente a procura por transporte.

Mas é reduzida a expectativa de aumento da demanda de serviços pelas famílias por causa da situação do mercado de trabalho, do endividamento elevado, do ambiente político conturbado e da inflação ainda alta, que inibem também as vendas no varejo. O desemprego atingiu 11,2% no trimestre encerrado em abril e o rendimento médio real do trabalhador recuou 3,3%, de acordo com a mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (a Pnad Contínua), apurada pelo IBGE. O contingente de desocupados bateu 11,4 milhões de pessoas.

Apesar da demanda menor, a receita do setor cresce ligeiramente, 0,4% na comparação de abril de 2016 com abril de 2015, mostrando que os preços continuam subindo no segmento, comprovando a resistência da inflação de serviços. A retração do setor de serviços é especialmente danosa porque o segmento representa 62% do PIB e pouco mais de 70% do emprego no país. Somente neste ano, as dispensas no setor representaram um quarto do total de demissões do mercado de trabalho em 12 meses. Enquanto os serviços não se recuperarem, a economia e o mercado de trabalho continuarão voltando atrás ou, na melhor das hipóteses, patinando.

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