Coordenador da força-tarefa critica decisão do STF de soltar Dirceu
Thiago Herdy, Gustavo Schimitt | O Globo
-SÃO PAULO- Advogados de presos na Lava-Jato em Curitiba devem levar ao STF pedidos de extensão da decisão que beneficiou José Dirceu a seus clientes. A tendência de libertação de presos sem dupla condenação, ontem na Segunda Turma do Supremo, foi tratada nos bastidores da força-tarefa e da Justiça como o mais “duro golpe” contra a operação.
Em sua página do Facebook, o coordenador da força-tarefa Deltan Dallagnol disse ter faltado coerência aos ministros do STF e argumentou considerar que a prisão “é um remédio amargo”, porém “necessário para proteger a sociedade contra o risco de recidiva, ou mesmo avanço, da perigosa doença exposta pela Lava-Jato”, numa referência à corrupção.
O procurador descreveu três habeas corpus julgados pelos mesmos ministros nos últimos seis meses — dois envolvendo acusados de tráfico de drogas e um envolvendo corrupção no interior do Piauí. Para ele, situações em que a Segunda Turma teria votado “para manter presas pessoas em situação de menor gravidade”.
“O STF é a mais alta Corte do país. É nela que os cidadãos depositam sua esperança, assim como os procuradores da Lava-Jato. Confiamos na Justiça e, naturalmente, que julgará com coerência, tratando da mesma forma casos semelhantes. Hoje, contudo, essas esperanças foram frustradas”, escreveu o procurador, para quem outros presos que representam “risco real à sociedade” podem vir a ser soltos.
“Os políticos Pedro Correa, André Vargas e Luiz Argolo estão presos desde abril de 2015, assim como João Vaccari Neto. Marcelo Odebrecht desde junho de 2015. Renato Duque e Jorge Zelada desde março e julho de 2015. Todos há mais tempo do que José Dirceu. Isso porque sua liberdade representa um risco real à sociedade”, escreveu o procurador.
Nos bastidores da Lava-Jato, ao não reconhecer o risco de continuidade delitiva de Dirceu — apesar dos indícios de que ele recebeu propina no período em que estava preso, no mensalão — os ministros da Segunda Turma também abriram caminho para a libertação de outros réus, como o ex-deputado federal Eduardo Cunha e o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci. A capacidade de articulação dos dois acusados em prol de supostos atos de corrupção e o risco de novamente se tornarem peças influentes no jogo político, ainda que de bastidores, faz com que os investigadores temam o sucesso da investigação sobre corrupção em alto escalão.
Procuradores e o juiz Sérgio Moro negam com frequência que o objetivo das prisões seja forçar delações premiadas. Mas admitem que a pressão de prisões que entendem ser “justificadas” é resposta à sensação de impunidade envolvendo crimes de colarinho branco, além de elemento a favorecer uma mudança de atitude de acusados frente aos crimes de corrupção. Cunha é um dos principais caciques do PMDB e já foi identificado como articulador de propina para seus pares no partido. Palocci é apontado como intermediário de recursos que teriam beneficiado o ex-presidente Lula e homem que detém informações sobre relações pouco republicanas da elite econômica do país.
Quando advogados acusam a força-tarefa de manter prisões para forçar delações, procuradores argumentam que a maior parte dos 155 acordos celebrados em três anos foram realizados por réus soltos. A diferença do atual momento, no entendimento da Lava-Jato, é o novo contexto político, onde ainda ecoam diálogos gravados do líder do governo, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) sugerindo um pacto para “estancar a sangria” representada pela operação. Nos mesmos áudios, que são objeto de ação na Justiça, Jucá menciona a construção, em eventual governo Michel Temer, de um pacto nacional “com o Supremo, com tudo”, em nome deste propósito.
Defensor de réus como José Carlos Bumlai, também solto pela Segunda Turma, Edward de Carvalho foi irônico ao comentar a soltura de Dirceu:
— Se a função do STF é cumprir a Constituição, as pessoas não podem se surpreender quando uma coisa dessas acontece — afirmou.
Advogado de Renato Duque, Figueiredo Basto deverá levar nos próximos dias o caso de seu cliente ao STF:
— Vamos ver se é possível estender a decisão a ele. Mas isso não mudará nossa estratégia, porque Duque está disposto a colaborar — afirmou.
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