André Guilherme Vieira | Valor Econômico
SÃO PAULO - A decisão da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) de revogar a prisão preventiva do ex-ministro da Casa Civil no governo Luiz Inácio Lula da Silva, José Dirceu, tomada ontem por três votos a dois, abriu precedente para que todos os réus processados ou condenados em primeira instância na Lava-Jato possam ter suas detenções revistas pelo Supremo. Até agora, são 90 pessoas condenadas em primeira instância pelo juiz federal Sergio Moro desde o início da Lava-Jato, deflagrada em março de 2014. Desse total, três foram absolvidas pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), que por ora confirmou a condenação de primeiro grau da doleira Nelma Kodama e do empreiteiro e sócio da OAS, José Adelmário Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro - sentenciado a 26 anos e que, preso, busca fechar sua delação premiada com a Procuradoria-Geral da República (PGR).
Ontem, em uma rede social, o coordenador da força-tarefa da Lava-Jato em Curitiba, o procurador da República Deltan Dallagnol, afirmou que a decisão do STF frustrou a esperança dos cidadãos ao dar espaço para que políticos presos há mais tempo do que José Dirceu deixem a cadeia. Segundo ele, podem sair da prisão, a partir do precedente aberto pelo decisão do Supremo, os ex-diretores da Petrobras condenados em primeira instância por corrupção, Renato Duque e Jorge Zelada, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, também condenado, e o próprio ex-presidente do Grupo Odebrecht, Marcelo Odebrecht - que apesar de ter negociado acordo de delação premiada já homologado, ainda está preso por força de uma prisão preventiva.
Dallagnol também incluiu na lista de possíveis beneficiários de soltura pelo STF os ex-deputados federais condenados por corrupção André Vargas (ex-PT), Pedro Correa (PP) e Luiz Argolo (ex-PP e ex-Solidariedade).
Advogados que atuam na Lava-Jato disseram ao Valor que se multiplicaram as chances de personagens emblemáticos da operação ganharem a liberdade, como o ex-ministro da Fazenda e da Casa Civil nos governos do PT, Antonio Palocci, preso preventivamente em setembro de 2016 por decisão do juiz Sergio Moro. Palocci é acusado de gerenciar centenas de milhões de reais de uma conta corrente com a Odebrecht, inclusive a subconta 'Amigo', que segundo investigadores e delatores da companhia seria destinada ao pagamento de propinas para o ex-presidente Lula. O ex-ministro contratou advogados em busca de um acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal (MPF).
"Espero que a Constituição continue a ser cumprida pelo STF, que dá ao Brasil a grande lição cívica de que a Constituição é a medida de todas as coisas, e não a Justiça das ruas", afirmou José Roberto Batochio, criminalista que busca revogar a prisão de Palocci por meio de habeas corpus com pedido em liminar ajuizado no STF. No dia 7 de abril o ministro relator da Lava-Jato no Supremo, Edson Fachin, decidiu que o pedido deve ser avaliado pela corte somente depois de passar por instâncias inferiores. "A tramitação do pedido anda a passos lentos, apesar de tratar-se de réu preso", criticou Batochio
"De fato tratou-se de um golpe duríssimo na Lava-Jato", avaliou ao Valor o advogado Antonio Figueiredo Basto, responsável pela delação premiada do doleiro Alberto Youssef e que há um ano negocia o acordo de Renato Duque.
"Essa decisão da turma do STF significa uma mudança muito importante, não sei se para o bem ou se para o mal", disse o criminalista.
"É uma clara mudança no contexto da operação. Eu só espero que esse tratamento dispensado ao José Dirceu, que recebeu propina da Petrobras enquanto era julgado no mensalão, também seja dado aos demais investigados e réus. Se vale para um, tem de valer para todos", afirmou Basto. O STF já havia libertado os acusados João Claudio Genu e José Carlos Bumlai
"Será um desastre se ocorrer o que vimos acontecer no mensalão, em que os menores foram punidos e os chefes se deram bem", alertou o advogado.
Na opinião de Basto, a decisão do STF de livrar Dirceu da cadeia não interfere na estratégia adotada para a defesa de Renato Duque, que, na sexta-feira, será novamente interrogado pelo juiz Sergio Moro, a pedido de sua defesa. Cota no PT na Petrobras, Duque promete revelar o que sabe sobre corrupção na diretoria de Serviços.
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