- O Globo
O presidente eleito Jair Bolsonaro dividiu sua estadia em Brasília em visitas aos três poderes civis e às três forças militares. A visita ao Congresso foi institucional, e Bolsonaro cumpriu adequadamente seu papel de novo líder da nação. Com a Constituição na mão, disse que o documento é o norte da democracia. Verdade que não cabia manifestação distinta, todos estavam ali para comemorar os 30 anos da Carta.
Reuniu-se protocolarmente com o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli. As imagens do encontro e, depois, na rápida fala à saída, mostram um Bolsonaro tenso, olhar fixo no horizonte. Toffoli recomendou diálogo permanente do presidente eleito com o Legislativo e o Judiciário. E Bolsonaro respondeu com grandeza, concordou com o ministro e disse que vai procurá-lo antes de tomar algumas iniciativas, em favor do entendimento. No fim do seu périplo pela capital, foi ao presidente Michel Temer para outro encontro formal.
Menos protocolares e mais animadas foram as visitas aos chefes militares. O primeiro a receber o presidente eleito foi o ministro da Defesa, general Joaquim Silva e Luna, que ofereceu um almoço a Bolsonaro na terça-feira. No mesmo dia, visitou os comandantes da Marinha, almirante Eduardo Bacellar Leal Ferreira, e do Exército, general Eduardo Villas Bôas. Ontem, ele tomou o café da manhã com o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Nivaldo Luiz Rossato. Nenhum dos três tem status de ministro.
Com boa vontade, pode-se dizer que foram encontros naturais; afinal, Bolsonaro é capitão reformado do Exército e reuniu-se com os seus velhos companheiros. Se tivesse permanecido na força, cumprido uma carreira acima da média e sem anotações por indisciplina, poderia ele próprio ser hoje um general. Mas não se tratou de simples convescote entre amigos.
Conversa entre amigos seria se o professor Fernando Haddad tivesse sido eleito e fosse visitar a Universidade de Brasília na sua primeira visita à capital. Não teria maior importância, além de sinalizar a favor da educação. A visita de Bolsonaro ao ministro da Defesa e aos chefes da três forças serviu para anunciar decisão importante e com uma deferência que somente os militares receberam na Esplanada dos Ministérios.
Na entrada da visita ao ministro da Defesa, Bolsonaro disse que os orçamentos das Forças Armadas não serão contingenciados. Segundo o presidente eleito, este é um reconhecimento por tratarem com zelo recursos públicos e “pelos brilhantes serviços que prestam a todos no Brasil, em especial nos tempos difíceis que a nação atravessa”. Os serviços que as Forças Armadas prestam são conhecidos, o que não se sabe é como elas podem ser úteis neste momento difícil do país.
Definitivamente, esta não foi uma boa fala do presidente eleito. Primeiro, se for para descontingenciar recursos, os prioritários deveriam ser os da saúde, da educação e da segurança pública, nunca os das Forças Armadas. Depois, mais importante que liberar dinheiro para Exército, Marinha e Aeronáutica, é resolver o déficit previdenciário dos militares, que representa metade de todo o buraco do setor.
Outra decisão anunciada no estilo Bolsonaro, dizendo tratar-se de ideia a ser consolidada, foi o deslocamento do general Augusto Heleno para o Gabinete de Segurança Institucional, abrindo espaço para outro oficial na Defesa. Aparentemente para um almirante, Bolsonaro sugeriu numa entrevista na sede do comando da Marinha. O único problema dessa mexida é convencer um general a se subordinar a um almirante, de resto, mudança de última hora é da natureza das transições.
Bolsonaro lembrou que é oriundo da carreira e que os militares terão lugar de destaque em seu governo. Nada de novo, isso já se sabia antes da eleição, o que lhe dá legitimidade. O problema não é colocar general ou coronel no gabinete, mas sim dar tratamento especial com recursos públicos ao Ministério da Defesa e aos departamentos militares em detrimento dos civis. As questões civis atingem a todos os brasileiros e merecem atenção prioritária do novo governo. As militares, não.
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