domingo, 12 de novembro de 2023

Hélio Schwartsman - Ações e gostos são resultados de uma loteria cósmica

Folha de S. Paulo

Livro nega existência de livre-arbítrio e analisa consequências para o direito e a ética

"Determined", o mais recente livro do cientista cognitivo Robert Sapolsky, é bom. Trata-se de um bem fundamentado libelo contra o livre-arbítrio, com todas as consequências que isso acarreta para o direito e a ética. Devo dizer que sou meio suspeito para comentar, já que tenho posição semelhante à dele, ainda que ele a professe com muito mais veemência e autoridade que eu.

O cerne de sua argumentação é simples. O Universo, ou, ao menos, o mundo macroscópico em que vivemos, é determinístico. Tudo tem uma ou mais causas. Não existem pensamentos ou vontades que não venham de ativações de neurônios que estão sujeitas às regras de causalidade do mundo físico. A cadeia de causalidades pode ser complexa. O modo como cada indivíduo reage a eventos depende de fatores tão variados que vão, do mais imediato para o mais remoto, do nível de glicose no sangue, aos hormônios secretados naquele momento, passando pela história de vida, notadamente os traumas, pelas predisposições genéticas e chegando às influências da cultura em que ele vive. O acaso também entra. Os genes de cada pessoa são o resultado de uma loteria cósmica.

Você até pode escolher entre a saladinha e a feijoada no restaurante, mas não tem agência sobre as comidas que prefere. Pior, a sua capacidade de resistir a impulsos é ela própria resultado da cadeia de determinações a que estamos todos submetidos.

As implicações não são triviais. Entram em xeque noções bem estabelecidas como a de direito retributivo. Não é que possamos prescindir de leis e de polícia, mas, quando prendemos alguém, a justificativa não deve ser um abstrato "fazer justiça", mas sim proteger a sociedade de quem a ameace fisicamente e dissuadir futuros criminosos. Indivíduos respondem a estímulos e desestímulos.

E, se isso já é difícil de engolir, ainda tem mais. Também não somos responsáveis pelos nossos acertos. A meritocracia é um mito.

 

4 comentários:

EdsonLuiz disse...

■Essa cognição baseada em uma mistura de viés, subjetividade, biologia e humores pessoais favorece cinicamente estruturas mentais como as do lulismo e do bolsonarismo, nos entendimentos, interpretações, relativizações e escolhas viciadas que estes dois populismos delinquentes fazem.

Deve servir também para Donald Tramp, Victor Orbân, Vladimir Putin, Xi Jiping, Nicolás Maduro e seus seguidores.

■■O que eu penso que essa teoria determinista de confirmação não explica é o porque de quem usa esta forma de cognição só aceitar os erros e abusos dos seus, que assimilam a um acerto ou desculpam os erros e abusos
▪Mas quando quem comete os mesmos abusos e erros são os "inimigos", aí a cognição por viés, subjetividade, biologia e impulso pessoal muda imediatamente e o "m.i.l.i.t.a.n.t.e" aplica a cognição pelo uso da racionalidade direitinho, para dar embasamento, quando é preciso, ao entendimento do erro de quem ele quer condenar.

Concordar com esse entendimento de cognição que o Hélio Schwartzman endossa é pacífico ou alguém pode entender como uma justificação para o cinismo?

EdsonLuiz disse...

■São estas teorias de cognição autorizando cinismo que levam um bolsonarista a condenar, com toda razão, a corrupção de Lula e, ao mesmo tempo, aceitar as "rachadinnhas" de Bolsonaro por ele considerar as "rachadinhas" pequenas quando comparadas aos $Bilhões roubados por Lula e quadrilha.
■■A mente do lulista, por sua parte, se nega a ver os $Bilhões de corrupção de Lula, mesmo que os comparsas que confessaram a corrupção tenham devolvido $Bilhões ; já alguns milhõezinhos das rachadinhas de Bolsonaro, para um lulista estes milhões viram uma montanha de dinheiro.

Mas quando é com um dele, ele inverte a cognição e considera alguns milhares de mortos por Deng aceitável e desculpam Lula por não comprar vacina, sendo que o mesmo erro o lulista não desculparia nunca quando cometido por Bolsonaro.

■Teorias cognitivas assim e os que aderem a elas são ou não para o uso do cinismo?

Mas é sempre um artifício torpe e podre, porque muita gente é roubada, sofre, é feita de otário e até morre, enquanto o esperto se beneficia.

ADEMAR AMANCIO disse...

O ser humano planta numa encarnação e colhe na outra,simples assim,temos livre arbítrio apenas para semear,para colher,jamais!

ADEMAR AMANCIO disse...

Sim,eu sou espírita,adoro o espiritismo.