segunda-feira, 22 de dezembro de 2025

Kast aposta em xenofobia na América Latina. Por Camila Rocha

Folha de S. Paulo

Admirador de Pinochet promete criar 'corredor humanitário de devolução' para venezuelanos

Diferente de Bolsonaro e Milei, novo presidente chileno torna central expulsão de estrangeiros

José Antonio Kast, recém-eleito presidente do Chile, certamente não será um novo Bolsonaro ou Milei, mas algo muito pior. Admirador do ditador Augusto Pinochet, já declarou que defende "qualquer situação" para acabar com o regime de Nicolás Maduro na Venezuela e já adiantou que deve criar um "corredor humanitário de devolução" para imigrantes em situação irregular, citando o caso dos venezuelanos no Chile.

A crise da Venezuela foi fortemente influenciada pela desvalorização do petróleo no mercado internacional a partir de 2014. Dependente dessa commodity para importar itens básicos de consumo cotidiano, o país sofreu um desabastecimento generalizado. Em 2017, as sanções impostas por Trump ao país pioraram a crise econômica, fomentando uma crise migratória sem precedentes.

Em 2018, o número de venezuelanos que abandonaram o país foi recorde. Estima-se que mais de um milhão deixou o país, somando-se aos dois milhões que já haviam saído em anos anteriores.

Na época, Jair Bolsonaro, então candidato à Presidência, afirmou que procuraria a ONU para criar campos de refugiados perto da fronteira brasileira. Sua justificativa, porém, vinha entremeada com um apelo aos direitos humanos: "Eu sou humano, eu respeito os direitos humanos de quem está numa situação crítica, como eles estão, mas não podemos deixar nas mãos do governo de Roraima resolver esse problema".

Em seu primeiro mês de mandato, Bolsonaro tirou o Brasil do Pacto Mundial para a Migração, assinado por 164 países. No entanto, a xenofobia não foi instrumentalizada por seus apoiadores. Pelo contrário. Bolsonaro fez questão de se mostrar receptivo aos imigrantes venezuelanos, sobretudo a partir da "Operação Acolhida", implementada na fronteira de Roraima.

Javier Milei, por sua vez, encerrou as atividades do Instituto Nacional contra a Discriminação, a Xenofobia e o Racismo, com a justificativa de que o órgão era um "cabide de empregos" em 2024. No entanto, assim como ocorreu com Bolsonaro, a xenofobia não era pauta central de seu discurso.

Isso mudou com José Kast. Mais do que uma bravata, a expulsão de imigrantes foi uma das principais bandeiras de Kast durante a campanha. Ao associar a entrada de estrangeiros ao aumento de violência no Chile, prometeu a construção de um muro na fronteira com a Bolívia, a expulsão de todos os imigrantes sem documentos e o recurso às forças armadas para barrar imigrantes ilegais.

A investida em discursos xenófobos em relação a países latino-americanos é extremamente preocupante. A xenofobia é um elemento central dos discursos de extrema direita em muitos países, mas, até o presente, isso não ocorria na América Latina.

Milei já demonstrou entusiasmo com a ideia. Não só adotou mais medidas contra imigrantes em 2025, como, logo após a vitória de Kast, postou em suas redes sociais um mapa que mostra os países vizinhos empobrecidos, incluindo o Brasil, e uma Argentina futurista.

Agora, graças ao presidente pinochetista, a tragédia que se avizinha novamente na Venezuela pode motivar uma quebra de solidariedade entre povos na região sem precedentes.

 

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