- Valor Econômico
Os italianos rejeitaram ontem por uma larga margem as reformas constitucionais propostas pelo premiê Matteo Renzi, levando ao fim de seu governo, iniciado em 2014. Por volta da meia-noite de ontem (21h de Brasília), Renzi admitiu a derrota nas urnas e anunciou que entregará sua renúncia ao presidente Sergio Mattarella na tarde de hoje, o que deve causar instabilidade nos mercados financeiros.
Ontem, logo após a divulgação das pesquisas de boca de urna que apontaram uma vitória do "não" por 54% a 58%, contra 42% a 46% do "sim", o euro caiu rapidamente frente ao dólar, para US$ 1,0550, de US$ 1,0625 antes da notícia. Em seguida, as projeções com base na apuração dos votos apontaram um apoio ainda maior ao "não", de 59%. Após o pronunciamento de Renzi, o euro acentuou a queda para US$ 1,0505 - menor cotação em vinte meses.
"A experiência do meu governo termina aqui", disse Renzi, em discurso transmitido pela tevê, após os primeiros resultados sugerirem a derrota do "sim" por até 20 pontos percentuais. Ele acrescentou que assumia total responsabilidade pela derrota "extraordinariamente clara".
As propostas de Renzi tinham como objetivo reformar a legislação italiana para facilitar a aprovação de leis para tornar o país mais competitivo e dar mais estabilidade política, com a redução do papel do Senado e do poder de decisão dos governos locais.
Depois que receber a carta de renúncia do premiê, o presidente Mattarella poderá encarregar alguém de tentar formar um novo governo. Nesse caso, entre os possíveis sucessores estão o ministro das Finanças Pier Carlo Padoan, o presidente do Senado Pietro Grasso e o ministro da Cultura, Dario Franceschini. Mas ele também pode convocar eleições gerais, que podem ocorrer no começo de 2017, entre março e abril. Esta é a hipótese mais provável, segundo a imprensa italiana. Se houver eleições antecipadas, o próprio Renzi pode sair candidato e retornar ao posto de premiê.
A imprensa italiana alerta ainda para o risco de um "Italexit" - saída da Itália da zona do euro. Os dois partidos que exploraram o sentimento antiestablisment, a Liga Norte - do ex-premiê Silvio Berlusconi - e o Movimento 5 Estrelas -do comediante Beppe Grillo - defendem a realização de um referendo sobre o tema.
Embora o resultado na Itália seja um golpe ao establisment na União Europeia (UE), houve algum alento ontem com a vitória de um político pró-Europa na eleição presidencial na Áustria
A votação na Itália era vista como outro teste decisivo para a força do populismo na Europa e há temores de que o resultado possa levar a Itália - terceira maior economia da zona do euro - a uma aguda crise política e eleve os temores de turbulência no seu já frágil sistema bancário.
A saída de Renzi aumenta a incerteza política na Itália porque seu Partido Democrático (PD) aparece quase empatado com o Movimento 5 Estrelas nas pesquisas de opinião. Além disso, ela também ocorre em um momento o Monte dei Paschi di Siena, a terceira maior instituição bancária do país, precisa levantar € 5 bilhões até o fim do ano para evitar o risco de ser liquidado.
"O voto 'não' foi precificado em antecipação até certo ponto. Portanto, não espero uma queda livre do euro no curto prazo", disse Minori Uchida, analista-chefe de câmbio do Bank of Tokyo-Mitsubishi. "Mas no longo prazo, isso vai adiar os avanços nos esforços da Itália para se livrar dos créditos podres dos bancos e é provável que amplie os spreads dos bônus do Tesouro alemão com os do Tesouro italiano", acrescentou.
O resultado do referendo italiano pode ser visto como outro sinal de crescente sentimento antiestablisment no coração da Europa, o que pode reduzir a confiança do investidor em relação ao euro diante das eleições no próximo ano na França, Alemanha e Holanda - todos países que sofrem com baixo crescimento econômico e crescente preocupação de seus cidadãos como fluxo de refugiados de países em guerra, em especial da Síria. Esses fatores têm alimentado um sentimento nacionalista e anti-Europa no continente.
Isso significa que a Europa está diante de um prolongado período de turbulência política.
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