terça-feira, 3 de outubro de 2017

Os opostos também se atraem em eleições | Fernando Exman

- Valor Econômico

Candidato ao centro garantiria maior previsibilidade

A postura sectária de alguns pré-candidatos à Presidência da República, as recentes pesquisas de opinião e o teor da reforma política em fase final de discussão no Congresso são alguns aspectos de um cenário ainda em construção, mas que devem indicar as condições de governabilidade do próximo chefe da nação. Sem uma vitória indiscutível no pleito de 2018, o que hoje é visto como improvável, o sucessor de Michel Temer terá que lidar com o desafio de construir imediatamente uma maioria num Parlamento ainda fragmentado. O atual governo deve deixar reformas estruturais como um passivo legislativo, e caberá ao próximo presidente assegurar previsibilidade ao mercado para destravar investimentos.

Discursos radicais têm ganhado terreno mundo afora. E isso deve se repetir por aqui, se os marqueteiros não entrarem em campo para burilar os pré-candidatos que já começam a atrair a atenção dos eleitores e reduzir seus índices de rejeição.

Líder em todos os cenários verificados pelos institutos de pesquisa, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem sua candidatura em xeque devido aos processos que enfrenta na Justiça. Mas vem sinalizando que estaria propenso a apostar em uma campanha baseada em fortes críticas ao processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, à política econômica do governo Temer e à elite empresarial.

Já se apresentaram também os pré-candidatos que pretendem ocupar o espaço antagônico ao de Lula, como o prefeito de São Paulo, João Doria, e o deputado Jair Bolsonaro. Ciro Gomes e Marina Silva buscam se contrapor a ambos os lados. Há ainda os que tentarão aproveitar a rejeição da população à classe política para levantar a bandeira do "contra tudo o que está por aí". Desenha-se, assim, um ambiente político hostil para quem escolher se apresentar com um perfil mais conciliador.

Curiosamente, no entanto, cresce o percentual de eleitores que se dizem centristas. Segundo o Datafolha, esse número alcança agora 29% dos entrevistados. No meio do ano, o Ibope entregou relatório à Secretaria de Comunicação da Presidência no qual tal índice chegava a 38%.

Pelo menos em tese, o rótulo de "candidato do centro" garantiria uma posição privilegiada na largada da campanha. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, buscam ocupar esse espaço. Mas até agora não despontaram nas pesquisas de intenção de voto. Assim, falta ainda um pré-candidato forte que se coloque desde já no centro do espectro político nacional e consiga demonstrar capacidade de aglutinar uma chapa forte o suficiente para levar adiante, por exemplo, uma reforma da Previdência. A Câmara não parece ter disposição de enfrentar o problema a fundo a um ano das eleições.

Além disso, a possível criação de uma cláusula de barreira tende a reduzir o número de partidos, mas não eliminará os obstáculos à formação de maiorias congressuais - desafios normalmente superados com ofertas de cargos e outras facilidades nas relações com o Executivo.

Com a perspectiva de arquivamento da segunda denúncia apresentada contra o presidente Michel Temer, a eleição de 2018 é vista pela maioria da população como uma das principais oportunidades para a promoção de mudanças no país, além do avanço do combate à corrupção. Mesmo assim, a classe política insiste em agir para se proteger e manter privilégios. Parece ter se acomodado com a ausência de manifestações nos últimos meses.

É recomendável que parlamentares e dirigentes partidários lembrem que multidões foram às ruas do país logo no início de 2015, pouco tempo depois de Dilma se reeleger e tomar posse de seu segundo mandato, para protestar contra um governo que acabara de sair vitorioso das urnas. Desde então, a polarização na política nacional só se intensificou. Embora quieto, o eleitor anda extremamente
insatisfeito.

Minha Casa, Minha Vida
Bandeira dos governos do PT, o Minha Casa, Minha Vida está sob análise da administração Temer.

Um grupo de trabalho foi criado pelo Ministério das Cidades para formular um novo programa habitacional voltado preferencialmente a famílias de baixa renda. Oficialmente, o governo quer apenas estabelecer os critérios para a criação do chamado "aluguel social". No entanto, autoridades do governo federal até já consideraram a possibilidade de mudar o nome do Minha Casa, Minha Vida.

Choques de instituições
As energias do Congresso estão, neste momento, voltadas ao embate com o Supremo Tribunal Federal em razão da peculiar situação do senador Aécio Neves (PSDB-MG). Mas novos choques com o Executivo também estão no horizonte.

Em relação ao Judiciário, a prioridade da defesa da classe parlamentar, que interessa a uma bancada multipartidária, é fechar o flanco contra decisões do STF sobre regimes de recolhimento de senadores e deputados que não sejam consideradas ordens de prisão. No ataque, avançam as discussões a respeito de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar o pagamento de salários acima do teto constitucional nos três Poderes.

O capítulo seguinte poderá ser um embate a respeito do exagerado número de medidas provisórias editadas. O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), prometeu devolver as MPs que chegarem ao plenário a menos de 15 dias de expirar. Nesta semana, por exemplo, três MPs podem caducar. No dia 11, outras duas.

Temer já criticou o abuso de MPs quando presidiu a Câmara, mas não ajudou a diminuir o uso do instrumento ao chegar à Presidência. Recentemente, o Executivo ultrapassou a marca de 800 MPs editadas em 16 anos. A eventual devolução de uma medida provisória pode ser interpretada como uma tentativa de o Congresso se reafirmar diante do Planalto, mas também há quem possa considerá-la um sinal de fragilidade do presidente.

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