Não faz sentido Brasil entrar em conflito distante de seus interesses e perder espaço no comércio
O período de transição de governo, em dezembro, já demonstrou ao presidente Jair Bolsonaro que declarações suas e de membros da equipe passaram a ter um grande peso. Mexem com mercados, repercutem no exterior.
E o país pode pagar um preço por isso. Um exemplo claro é Bolsonaro no caso da mudança da embaixada brasileira em Israel, de Tel Aviv para Jerusalém, desnecessária provocação aos palestinos em particular e aos árabes em geral. Uma juvenil demonstração de que pode repetir os EUA neste movimento. Não pode.
O presidente ainda estava em Davos, na terça, quando a Arábia Saudita anunciou a suspensão de importações de cinco frigoríficos brasileiros, sob alegações técnicas. Mas o recado foi evidente: confirmar a mudança da embaixada, o que significa reconhecer toda a Jerusalém como capital de Israel, levará a retaliações no comércio.
E o país tem muito a perder — bilhões de dólares em exportações e em milhares de empregos no agronegócio e seus segmentos. O Brasil é o maior exportador de carne halal, termo que significa “lícito”. Os frangos são abatidos conforme ritual, o que também acontece com alimentos kosher, para judeus. Também se exporta carne bovina da mesma forma.
Essas exportações são de US$ 4,5 bilhões anuais e sustentam 150 mil empregos diretos em pequenas cidades do Sul. Concorrentes do Brasil acompanham esperançosos a possibilidade de ganhar espaço neste promissor mercado.
Um caso emblemático é o de Palotina, cidade do Oeste do Paraná, em que a cooperativa C.Vale conta com uma unidade halal de abate de frangos. Exporta, por mês, 3,2 mil toneladas. Fatura US$ 3,4 milhões, mantendo 5,2 mil empregos.
Há inúmeros exemplos como este, que ajudam o Brasil a ser um dos maiores exportadores de proteína animal do planeta. Posto que estará ameaçado, se o clima de campanha preponderar em decisões importantes de governo.
Neste caso, não afetará apenas o setor de carnes, mas também 135 empresas certificadas para processar produtos halal. Oito exportam açaí para a Ásia e os Estados Unidos, açúcar orgânico para Japão, Coreia do Sul e também para o mercado americano. Até pão de queijo halal consta da lista de exportações.
Ao todo, para nações árabes, as vendas brasileiras passaram de US$ 9,8 bilhões para US$ 13,6 bilhões, em 2017, um aumento de 38%. Se, em algum momento, viera ser resgatado na política externa, em sua integralidade, o pragmatismo que sempre marcou a diplomacia brasileira, é certo que informações como estas serão levadas em conta.
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