Não
temos um plano efetivo de vacinação em massa por parte do Ministério da Saúde,
cujo titular é um general de divisão da ativa, especialista em logística
Não
gosto de análises catastróficas nem do quanto pior, melhor. Prefiro a teoria
das duas hipóteses do humorista Aparíccio Apporelly, o Barão de Itararé,
descrita por Graciliano Ramos em Memórias do Cárcere. O escritor alagoano deliciava-se
com as anedotas e os comentários espirituosos do jornalista gaúcho, encarcerado
durante a ditadura de Getúlio Vargas. Com sua voz pastosa e hesitante, dono de
um “otimismo panglossiano”, o Barão sustentava que tudo ia bem e poderia
melhorar, fundado numa demonstração de que diante de cada situação haveria
sempre uma pior: “Excluía-se uma, desdobrava-se a segunda em outras duas; uma
se eliminava, a outra se bipartia, e assim por diante, numa cadeia comprida”,
explicava Graciliano. Com a palavra, o próprio Apporelly quando estava preso:
“Que nos poderia acontecer? Seríamos postos em liberdade ou continuaríamos presos. Se nos soltassem, bem: era o que desejávamos. Se ficássemos na prisão, deixar-nos-iam sem processo ou com processo. Se não nos processassem, bem: à falta de provas, cedo ou tarde nos mandariam embora. Se nos processassem, seríamos julgados, absolvidos ou condenados. Se nos absolvessem, bem: nada melhor, esperávamos. Se nos condenassem, dar-nos-iam pena leve ou pena grande. Se se contentassem com a pena leve, muito bem: descansaríamos algum tempo sustentados pelo governo, depois iríamos para a rua. Se nos arrumassem pena dura, seríamos anistiados, ou não seríamos. Se fôssemos anistiados, excelente: era como se não houvesse condenação. Se não nos anistiassem, cumpriríamos a sentença ou morreríamos. Se cumpríssemos a sentença, magnífico: voltaríamos para casa. Se morrêssemos, iríamos para o céu ou para o inferno. Se fôssemos para o céu, ótimo: era a suprema aspiração de cada um. E se fôssemos para o inferno? A cadeia findava aí. Realmente. Realmente ignorávamos o que nos sucederia se fôssemos para o inferno. Mas, ainda assim, não convinha alarmar-nos, pois essa desgraça poderia chegar a qualquer pessoa, na Casa de Detenção ou fora dela”.
O
raciocínio irônico do Barão de Itararé é altamente filosófico e serve para
qualquer situação. Por exemplo, para a turma enrolada na Lava-Jato, que agora
assiste, de tornozeleira eletrônica ou no xadrez, o ex-juiz Sergio Moro ser
contratado como especialista em combate à corrupção por um grande escritório de
consultoria que presta serviços à Odebrecht. Como se sabe, Emilio Odebrecht,
para salvar a empresa e aliviar a cana de seu filho, Marcelo Odebrecht,
negociou uma delação premiada com o então procurador-geral da República,
Rodrigo Janot, que quase implodiu o sistema político brasileiro. Alguns
imaginam que o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff pavimentou o caminho
para a eleição de Jair Bolsonaro; não, essa estrada foi asfaltada pelo
escândalo da Petrobras e o uso generalizado de caixa dois nas campanhas
eleitorais.
Entretanto,
não temos um plano efetivo de vacinação em massa por parte do Ministério da
Saúde, cujo titular é um general de divisão da ativa, especialista em
logística, que será o grande responsável pelo atraso da campanha de vacinação.
No momento, sua grande preocupação é negar a existência de uma segunda onda da
pandemia, sabotar as medidas de isolamento social e atrasar a liberação da
vacina chinesa. Vidas não importam, afinal, não existe guerra sem defuntos. E
onde aplica-se a teoria das duas hipóteses? Ao comparar o número de mortos com
os que sobreviveram à covid-19, graças aos esforços heróicos dos profissionais
da saúde.
Nas últimas 24 horas, houve 776 mortes, somando 175.307 óbitos desde o começo da pandemia. A média móvel de mortes no Brasil, nos últimos sete dias, foi de 544. Desde o começo da pandemia, 6.487.516 brasileiros já tiveram ou têm o novo coronavírus, com 50.883 desses casos confirmados nas últimas 24 horas. Em média, nos últimos sete dias, houve 40.421 novos diagnósticos por dia, a maior desde agosto, que registrou 40.526 mortes. O aumento no número de casos foi de 37%. A pandemia recrudesceu nos seguintes estados: PR, RS, SC, ES, MS, AC, AP, RO, CE, PB, PE, RN e SE.
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