Folha de S. Paulo
Poder Legislativo não deve ser confundido com
a atuação dos eleitos e eleitas para dar expediente por lá
Pessoas podem ser trocadas pelo voto, mas a
instituição permanece guardada por cláusula pétrea da Constituição
O mote "Congresso inimigo
do povo" pode ser visto de várias formas: como um achado de palanque, um
ataque equivocado a um dos pilares da República ou um elogio àquele tipo de populismo
que rejeita a política e dá margem ao atraso e a aventuras nefastas.
Numa compreensão mais elaborada, pode também ser recebido como alerta didático, um chamado à responsabilidade do eleitorado como agente formador da composição do colegiado.
Se o atual Parlamento se comporta de maneira
antagônica à sociedade, haveria nesse raciocínio um estímulo à eleição de
representantes parceiros em 2026. Aí, no entanto, existe uma complicação: a
aplicação do conceito de amizade ou inimizade de acordo com pontos de vista
ideológicos.
Na perspectiva do governo —autor do slogan
para fins de mobilização da militância—, amigos são os que compartilham da
visão de mundo do Palácio do Planalto e inimigos os que discordam.
No cotejo com a realidade, contudo, a escala
de prioridades dos eleitores oscila. Depende do que prevalecer no ambiente de
campanha: a estridência ideológica ou o exame racional do que seriam as
demandas populares de fato urgentes.
Se predominar o critério das torcidas
radicalizadas incentivadas por seus chefes, a eleição de deputados e senadores
estará submetida à cartilha de cada um dos grupos e aí continuará prevalecendo
a lógica dos interesses da corporação.
Protestos
como os organizados pela esquerda no domingo (14) se prestam a
sentimentos do dever cumprido contra o avanço da direita, mas não resolvem o
problema. Apenas cria o risco de invertê-lo se amanhã ou depois a maioria for
de esquerda.
O ideal seria não se confundir o Parlamento
com os eleitos e eleitas para dar expediente por lá. Pessoas podem ser trocadas
mediante o voto, prerrogativa dos manifestantes.
A instituição é permanente. Está sob a guarda
de cláusula pétrea da Constituição,
a salvo de depreciações oportunistas e queixas de ocasião.

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