A
tensão exibe nível muito alto para uma sociedade já levada a condições
potencialmente conflituosas
Tirar Donald
Trump da presidência com um impeachment veloz é o único meio de talvez
evitar o que seria seu maior feito: aproximar ainda mais os Estados Unidos de
uma convulsão. A tensão exibe nível muito alto para uma sociedade já levada,
por longa elaboração, a condições potencialmente conflituosas e agora
submetidas a estímulos descontrolantes.
Até
a prevista
posse de Joe Biden em 20 de janeiro, serão mais de dois meses concedidos a
um presidente ensandecido, que acusa de roubo e corrupção o sistema eleitoral e
avisa o país de que resistirá “até o fim”. Não expõe nem indícios do que acusa
e não diz qual é “o fim” em sua disposição. É certo, porém, que conhece os
perigos implícitos na atitude que incita o segmento da população armado,
violento e numeroso —os seus seguidores extremados.
Com
Trump ainda na presidência, serão dias em que dele, do seu desatino ambicioso,
poderá projetar-se qualquer ato de uma mente transtornada e, apesar disso,
poderosa.
Quem
é capaz de fazer expulsar
para o México centenas de crianças sem os pais, de várias nacionalidades e
sem parentes no destino —fato anterior ao choque da derrota eleitoral e agora
revelado pelo jornal The New York Times— ficaria muito bem entre os criminosos
do nazismo. É capaz de tudo.
Há
quase 70 anos, ou desde que iniciadas as reações do nosso tempo à discriminação
dos negros, são periódicos os levantes contra a opressão racista e a liberdade
combinada com impunidade para os crimes oficiosos contra não brancos.
Mas,
como contemporâneo e profissional de atenção a esse período, não me consta fase
alguma de extremismos tão difundidos nos Estados Unidos, como atestam as
chamadas redes sociais. Nem de divisão da sociedade nas proporções atestadas
pelas urnas recentes.
Observar
que metade dos eleitores americanos, no maior comparecimento da sua história,
deseje a permanência da mente de Trump na presidência da “América” é, com a
melhor clareza, desmentir o caráter exemplar da democracia americana.
A
propaganda fez o mundo adotar a ilusão. Com discriminação racial não seria
construída uma democracia. Sobre essa deformação duradoura, o que se mostra nos
Estados Unidos não é a diversidade democrática de opinião.
Amostra
apressada, já na segunda noite da contagem eleitoral a polícia
da Filadélfia recebeu a denúncia de que homens armados dirigiam-se ao centro de
apurações. Pôde prender
dois deles.
Nos
anos Trump, a preferência por fuzis, entre os militantes armados, foi
substituída pela compra de metralhadoras. Armas de ataque, metralhadoras de
todos os tipos, motivando a criação de lojas especializadas. As milícias
políticas de brancos proliferam nos últimos anos como nunca, com campos de treinamento
também para mulheres e mesmo crianças.
Do desafio de Trump às instituições do país que preside até à nova saturação das humilhações não brancas, os prenúncios transbordam. Não é vazio o temor que jornais e televisões noticiam com avareza, com seu velho pretexto das razões de Estado. A elevação de Trump já era sinal suficiente de degeneração. Ele agiu para confirmar o sinal e age para levar a degeneração até o fim.
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