quinta-feira, 26 de agosto de 2021

Bruno Boghossian – Um golpista em cada esquina

Folha de S. Paulo

Bolsonaro pode não conseguir golpe organizado, mas prepara terreno para agitadores

Às vésperas das eleições de 2018, um juiz de primeira instância em Goiás preparou uma ordem para que o Exército recolhesse urnas eletrônicas pouco antes da votação para uma perícia. A ideia era assinar a decisão na sexta-feira anterior ao primeiro turno e tumultuar o processo.

O plano não deu certo porque os militares denunciaram a trama. A Advocacia-Geral da União descobriu que o juiz Eduardo Luiz Rocha Cubas havia gravado um vídeo com o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL) questionando a segurança do sistema de votação. O órgão apontou que aquela conduta era inadequada e pediu o afastamento do magistrado.

O clã bolsonarista prepara o terreno para o surgimento de novos Cubas e outros agitadores nas próximas eleições. As mentiras do presidente já ajudaram a inflar a desconfiança de parte da população sobre as urnas eletrônicas. Em 2022, esse sentimento pode mover juízes com canetas alucinadas, policiais responsáveis pela segurança dos locais de votação e eleitores alvoroçados.

Há dúvidas sobre a capacidade de Jair Bolsonaro fabricar um golpe organizado, com apoio abrangente nas Forças Armadas. Já um tumulto descentralizado, protegido pelo discurso oficial, é praticamente uma certeza. Bastam alguns episódios de quebra-quebra em seções eleitorais, denúncias falsas de mau funcionamento das urnas e agentes de segurança lenientes com os baderneiros.

Mesmo isolados, casos assim podem impulsionar o esquema golpista de Bolsonaro. Se um único juiz decidir dificultar a votação e o Exército mantiver segredo até executar a ordem, estará criada incerteza suficiente para dar ao presidente uma plataforma para convocar um levante e se recusar a deixar o cargo.

Na semana passada, o FBI constatou que havia poucas evidências de que a invasão do Capitólio havia sido uma ação coordenada. Ainda assim, aquela ação foi suficiente para sacudir a democracia dos EUA. A onda golpista de Donald Trump só não foi adiante graças à resistência da classe política e dos militares.

 

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