sábado, 12 de abril de 2025

O Capitalismo ainda é aquele? - Marcus Pestana

O novo presidente dos EUA, Donald Trump, está colocando o mundo de cabeça para baixo. O ciclo da economia capitalista, inaugurado com o fim da Guerra Fria e a aceleração da globalização das cadeias produtivas, sob a liderança do setor serviços e das novas tecnologias, parece ter chegado ao fim.

Com seu estilo sui generis, Trump acionou a metralhadora giratória de tarifas para os produtos importados pelos americanos. Embora o foco seja a China, sobrou para Canadá, México, União Europeia, outros países asiáticos, e, também, em menor grau, para o Brasil e a América Latina. As bolsas de valores despencaram, houve grande volatilidade cambial e a previsibilidade – característica essencial para a economia de mercado – foi implodida.

 O objetivo de Trump e seu governo é supostamente combater o mega déficit comercial americano, reindustrializar o país, recuperar a liderança global para os EUA, impor ao mundo o “America First”. Tudo indica que será um enorme tipo no pé e o resultado será uma profunda estagflação, a combinação nefasta das duas “doenças econômicas” que manifestam disfunções no funcionamento do sistema: inflação e recessão. Fato é, que a guerra comercial está instalada.

O protecionismo é a própria antítese da evolução da economia capitalista e de toda a teoria que a embasou. Adam Smith, Ricardo, Hayek e Milton Friedman, que sempre inspiraram o Partido Republicano dos EUA, devem estar se revirando em seus túmulos.

O capitalismo nasceu no útero da crise do feudalismo – uma economia fragmentada, pouco integrada, de frágil dinâmica, baixo nível de comércio internacional e de poder político descentralizado. Primeiro tivemos sua etapa comercial e colonialista. A acumulação e a reprodução de riquezas se davam na extração e comercialização de mercadorias. O primeiro passo para a globalização da economia foi dado, embora sobrevivessem muitas barreiras.

Com a Revolução Industrial inglesa, o eixo se deslocou para a produção. Era necessário remover os obstáculos à livre circulação das mercadorias. Eram milhões de ofertantes em busca de consumidores livres de amarras. Em sequência, transitou-se para o capitalismo monopolista e o fortalecimento da esfera financeira. Isso correspondia a um movimento de centralização e concentração de capitais necessária a expansão da grande indústria. A Inglaterra liderava o ciclo.

Até que o conflito de interesses das potências imperialistas levou a eclosão de duas grandes guerras mundiais entremeadas pela maior depressão da história do sistema capitalista. O comércio internacional foi profundamente abalado. A liderança foi assumida pelos EUA. A emergência da URSS instalou a Guerra Fria, mudando a configuração mundial. Com a dissolução da URSS na década de 1990 e a queda do Muro de Berlim, a democracia liberal e a economia de mercado imperariam absolutas e definitivas. O século XXI nasceu, dentro desse ambiente, como a afirmação de um novo mundo e de uma nova etapa capitalista: integração das cadeias produtivas globais, internet, robótica, biotecnologia, Big Techs, globalização, “fim” do protecionismo, a China optando pela economia de mercado etc.

O liberalismo econômico, que sempre ancorou o desenvolvimento capitalista, imaginava que o livre jogo de oferta e procura; a livre circulação de mercadorias, capitais e trabalhadores; enfim, a ação da mão invisível de Adam Smith, levariam ao equilíbrio geral e ao desenvolvimento permanente sustentado. Não foi bem assim. Crises se sucederam ininterruptamente no final do século XIX, em 1929, na suspensão da conversibilidade do dólar e nos choques do petróleo e dos juros nos idos de 1970 e 1980, na crise global desencadeada pela bolha imobiliária americana e pela quebra de seus bancos em 2008. Mas o futuroso glorioso do capitalismo globalizado era simples questão de tempo.

Agora chega Trump, chuta o balde e decreta o fim do multilateralismo e da integração global, a volta dos Estados Nacionais autárquicos e do protecionismo. São muitos interesses feridos. São muitas alianças rompidas. Até onde esta onda irá não está claro. Muito menos quais são os objetivos, a estratégia e os resultados esperados. Por enquanto, quando as bravatas de Trump viraram ações concretas, reina a perplexidade mundo afora. 

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