O Globo
Todos os nazistas eram psicopatas, mas nem
todos os psicopatas são nazistas
O Partido Nacional Socialista dos
Trabalhadores Alemães, conhecido como Partido Nazista, era muito mais uma
organização criminosa do que uma agremiação política. Seus membros eram
assassinos e corruptos, amorais e aéticos. O partido praticava a destruição do
outro e de determinadas etnias que eles consideravam inferiores. Para os
nazistas, o outro era qualquer um que pensasse diferente, e etnias inferiores
eram determinadas por falsas teorias, fake news, para usar um termo mais atual.
Eles usavam estudos mentirosos de eugenia para criar uma escala social onde os
arianos estavam no topo da pirâmide, abaixo estavam os escandinavos, depois
outros povos europeus, mais abaixo os eslavos, negros, ciganos e, na base da
pirâmide, os judeus. Os arianos se consideravam superiores e não deveriam se
misturar com “outras raças”, mais uma mentira, pois só existe uma raça, a
humana.
Para ser membro da SS, a elite militar, o
candidato passava por um escrutínio que retrocedia várias gerações para saber
se o sangue era puro, e não tinha nenhuma mancha no seu passado.
Ser nazista não é tão banal como muitos
acreditam.
Um jovem que comete atos de violência e se veste de preto erroneamente passa a ser considerado nazista. Os nazistas usavam preto, mas também verde-oliva, marrom e cinza. Franz Paul Stangl, comandante de Treblinka, preferia o uniforme branco; Hermann Goering, o número dois do partido, usava as cores mais variadas, às vezes parecia o excêntrico e cafona pianista Liberace. Goering e Stangl estavam no topo da hierarquia.
Um jovem que desenha uma suástica no muro
da escola é acusado de nazista, e muitas vezes o rabisco foi apenas um ato de
depredação de espaço público. Os acusadores nem se importam se a suástica foi
desenhada no sentido horário ou anti-horário.
Não é porque um jovem faz o gesto de Sieg
Heil na escola que ele é um seguidor inconteste do nazismo. Ele sabe que
isso é errado e, para incomodar ou chamar a atenção, repete o movimento que
Hitler só adotou a partir de 1926, copiando os fascistas italianos, que, por
sua vez, copiaram a maneira com que os romanos reverenciavam o imperador Júlio
César. Contrariar as regras é um ato de rebeldia, isso não faz de um idiota um
militante do Partido Nacional Socialista.
Grande maioria das pessoas que são
consideradas nazistas jamais leu “Mein Kampf”, a obra que Hitler escreveu na
prisão e resume seu pensamento, encontrada no Brasil em edição pirata, uma vez
que é proibida. Os chamados “nazistas ou neonazistas” brasileiros não leram
Maurice Barrès, Julius Streicher, Alfred Rosenberg e Heinrich Himmler ou tantos
outros teóricos que deram base ao movimento. Provavelmente esses pseudonazistas
não sabem nem pronunciar Untermensch, quanto mais o significado dessa
palavra.
Também é comum identificar grupos de
carecas como nazistas. Podem ser pessoas violentas, mas desconheço que a
calvície era uma característica ou marca registrada dos nazistas da Alemanha
nos anos 1930 e 1940.
Há grupos no Brasil autodenominados
neonazistas e, pelas características físicas dos seus membros e pela
maravilhosa diversidade étnica brasileira, Heinrich Himmler os colocaria nos
primeiros lugares nas filas das câmaras de gás.
Ser chamado de nazista é, com toda razão,
ofensa. Portanto, nominar de nazista alguém que pratica violência gratuita,
contraria a ciência ou é preconceituoso é bom para a esquerda, se encaixa
perfeitamente neste período de antagonismo e de intolerância entre os extremos
do espectro político. Violência contra opositores não é exclusividade da
direita. Tivemos péssimos exemplos como Pinochet, Mussolini, Hitler, Franco e
Salazar. No entanto, no outro extremo tivemos Stálin, Pol Pot, Mao e a família
Kim, apenas para citar alguns.
Adolescentes que invadem escolas com o
intuito de matar colegas e professores são desequilibrados sem nenhuma
conotação política. Matam porque são psicopatas. Eles não escolhem as vítimas
pela cor da pele, religião ou preferência sexual. São pessoas com distúrbio
mental que matam quem encontram pela frente, sem distinção. São apenas os alvos
que infelizmente cruzaram seus caminhos.
Todos os nazistas eram psicopatas, mas nem
todos os psicopatas são nazistas.
*Marcio Pitliuk, escritor e especialista no
Holocausto, é autor dos livros “O engenheiro da morte”, “A alpinista” e “O
homem que venceu Hitler”
Nenhum comentário:
Postar um comentário