terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Os descaminhos do pacote

Maia diz que não há por que votar projeto anticorrupção e vai enviá-lo ao Senado como está

Júnia Gama | O Globo

-BRASÍLIA- Depois de anunciar na última sexta-feira que havia se entendido com o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), para não paralisar o projeto de iniciativa popular que ficou conhecido como as 10 Medidas contra Corrupção, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), decidiu pegar um atalho. Uma liminar de Fux determinara que o projeto, desfigurado por votação na Câmara no ano passado, voltasse a tramitar do início, retomando a proposta original referendada por mais de 2 milhões de assinaturas. Maia disse ontem que vai verificar se o projeto tem todas as assinaturas necessárias, sem necessidade de conferir se são mesmo verdadeiras, mas, ao invés de determinar que a proposta volte a ser apreciada pela Câmara, enviará o texto direto para o Senado.

Na sexta-feira, Maia afirmou ao GLOBO que cumpriria a liminar do ministro Luiz Fux que determinou o retorno do projeto à Câmara. Ontem, disse que a mera conferência de assinaturas por parte da Câmara já seria suficiente para atender a decisão do ministro do Supremo:

— A Secretaria-Geral da Mesa confere as assinaturas, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) valida, checa se o rito está correto, e a parte da Câmara estará superada — disse. 

SÓ DEPOIS DO CARNAVAL 
Questionado se devolveria o projeto ao Senado após a conferência das assinaturas, Maia respondeu afirmativamente.

— Se tiver tudo certo, com certeza, porque o rito estará cumprido.

O presidente da Câmara negou que seja necessária uma nova votação.

— Não, se o rito estiver todo correto, não há necessidade de ter outra votação da Câmara.

Maia disse ainda acreditar que isto atende ao pedido de Fux na liminar: — Acredito que sim. A preocupação dele era na origem. Se a origem está resolvida e se a CCJ confirma que todo o rito cumpriu o regimento e as leis, não vejo problema para ter que refazer a votação.

A previsão de Maia é que nenhum desses trâmites ocorra antes do Carnaval.

Em dezembro do ano passado, Fux determinou que o pacote das 10 medidas anticorrupção — desfigurado pela Câmara, com a retirada de diversas propostas e a inclusão de punição de juízes e membros do Ministério Público por abuso de autoridade, e remetido ao Senado —, retornasse à Casa inicial e recomeçasse da estaca zero, com o texto original que recebeu apoio popular. Na prática, a ordem suspendia toda a tramitação pela qual o projeto de lei passara e exigia que a Câmara adotasse o rito previsto em seu regimento interno para propostas de iniciativa da população. O projeto idealizado pelo MP chegou ao Legislativo subscrito por mais de 2 milhões de assinaturas, mas foi apresentado oficialmente ao Congresso por um grupo de parlamentares.

Fux decidiu que toda a tramitação estava viciada por não ter sido feita sob o procedimento definido para projetos de iniciativa popular. Segundo ele, nesse caso, ficam vedados “emendas e substitutivos que desfiguram a proposta original para simular apoio público a um texto essencialmente distinto do subscrito por milhões de eleitores”, embora não seja proibido que os parlamentares apresentem projetos próprios para serem apensados.

DESRESPEITO À DECISÃO É CONSIDERADO CRIME
Por isso, Fux determinou que a matéria retornasse à Câmara, para que fosse adotado o procedimento correto para a tramitação de projetos de iniciativa popular. O tema teria que ser votado em plenário, com orador para defender o texto, entre outras regras. Inicialmente, Maia disse que aguardaria uma decisão do plenário do STF, mas após entendimento com Fux deu o andamento que considerou pertinente.

Ontem, Fux não foi localizado para comentar a nova decisão de Maia. Na sexta-feira, após se reunir com o presidente da Câmara, o ministro do STF arquivou o processo que continha sua liminar. E elogiou a iniciativa de Cunha de respeitar a decisão judicial:

— O mais importante para mim é que isso não criasse um precedente de juiz dar uma liminar e a parte dizer que vai aguardar a solução do recurso para cumprir. Se um juiz que entra agora na carreira, dá uma liminar, se a autoridade não cumpre a liminar dele, a própria lei do mandado de segurança diz que é crime. Então, descumprir uma decisão judicial é criminalizado, não adianta essa de esperar o plenário. Tem de cumprir a decisão. Ele (Maia) teve a postura esperada de um homem público.

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