sábado, 19 de outubro de 2019

Merval Pereira - Gente fina

- O Globo

Áudio vazado tem o mesmo teor das negociações com o baixo clero político que levaram ao mensalão e ao petrolão

O áudio vazado por um deputado federal da bancada do PSL que revela o presidente Jair Bolsonaro cabalando votos para a destituição do líder Delegado Waldir tem o mesmo teor das negociações com o baixo clero político que levaram ao mensalão e ao petrolão.

A diferença é que o Fundo Partidário é fruto de dinheiro de origem controlada, o nosso dinheiro colocado no Orçamento para financiar os partidos políticos. O dinheiro do PT também era nosso, porém desviado das empresas estatais. Mas o caminho é o mesmo trilhado pelo PT com outros partidos, atraídos para sua base política por favores e dinheiro. Que acabou em escândalo e prisões.

Bolsonaro, na conversa gravada que tem sua legalidade garantida pelo Supremo Tribunal Federal, que já decidiu que o participante de uma conversa tem o direito de gravá-la sem a autorização da outra parte, mostra toda a sua habilidade política, muito diferente do parlapatão que surge em público sem travas na língua.

Em nenhum momento o presidente oferece vantagens ao interlocutor, mas sugere que o seu lado é mais confiável para concedê-las: “Que poder tem na mão, atualmente, o presidente, o líder aí? É o poder de indicar pessoas, de arranjar cargo no partido, é promessa para fundo eleitoral por ocasião das eleições. É isso que o cara tem, mas você sabe que o humor desse cara muda, de uma hora para outra, muda”, comentou Bolsonaro, durante a conversa com o deputado federal.

Não pode ser acusado diretamente de estar tentando comprar o apoio do deputado, mas basta ligar lé com cré que se chega à conclusão certa. Hoje, no entanto, estamos voltando a viver um ambiente que favorece a impunidade. O ex-presidente Michel Temer, por exemplo, acaba de ser absolvido da acusação de obstrução de Justiça devido àquela famosa conversa com o empresário Joesley Batista em que disse a célebre frase: “Tem que manter isso aí, viu?”.

O tom baixo das vozes dos dois, quase sussurrando, o local, a entrada sorrateira de Joesley no Palácio do Jaburu tarde da noite, com o nome de um assessor do presidente, tudo dá bem a dimensão do que tratava a conversa, mas há espaço, como sempre houve antes do mensalão e do petrolão, para um entendimento mais benevolente.

Estamos voltando ao tempo em que será preciso um “ato de ofício” para comprovar corrupção. Nem mesmo serve a mala de dinheiro do assessor Rodrigo Rocha Loures, de cujo nome Joesley se utilizou para entrar no Palácio, indicado por Temer a Joesley para tratar de todos os assuntos: “Pode passar por meio dele, viu? Da minha mais estrita confiança”.

Por trás da briga do PSL estão os R$ 350 milhões do Fundo Partidário e do Fundo Eleitoral para as eleições do ano que vem. O PSL é um partido grande, com dinheiro gigante, com tudo para se firmar como importante na vida política brasileira, mas essa briga de baixo clero no Congresso — Luciano Bivar e Bolsonaro sempre foram baixo clero — está levando partido e presidente à desmoralização.

É uma briga abaixo da linha da cintura. Bolsonaro quer controlar o fundo partidário, mas precisa da concordância de Bivar de que, se fizer a união com o DEM, leva o dinheiro. Já se fala que Bolsonaro poderia até ir para o Partido da Mulher Brasileira, que mudaria de nome. Mas não adianta, é um dos mais nanicos de todos os 37 partidos existentes, sem verba, nem tempo de televisão para propaganda eleitoral. A situação do presidente é complicada, ele vai aprender que pode muito, mas não pode tudo. Partidos grandes e médios estão longe dele, sem interesse em levar os problemáticos filhos de Bolsonaro para suas legendas.

O PSL está repleto de novos e antigos parlamentares, mas o estilo é o da velha política nossa conhecida. O líder do PSL na Câmara, Delegado Waldir, que Bolsonaro quer derrubar para colocar em seu lugar o filho Eduardo, afirmou em reunião interna da ala ligada ao presidente do partido, Luciano Bivar, que vai “implodir” o presidente Jair Bolsonaro.

No áudio do encontro, gravado por um dos presentes, ele diz “Eu vou implodir o presidente. Aí eu mostro a gravação dele. Não tem conversa. Eu implodo ele. Eu sou o cara mais fiel. Acabou, cara. Eu sou o cara mais fiel a esse vagabundo. Eu andei no sol em 246 cidades para defender o nome desse vagabundo”, afirma Waldir.

Tudo gente fina.

Um comentário:

Gira Mundo disse...

Bolsonaro usou a Instituição Política Federal de Estado é caso de Impeachment..? Acha que Impeachment ou Bolsonaro destrói a Instituição Congresso Nacional Implanta a Ditadura..??