quinta-feira, 26 de outubro de 2023

O que a mídia pensa: Editoriais / Opiniões

Limitar passageiros no Santos Dumont é alternativa sensata

O Globo

Objetivo é reequilibrar tráfego com o Galeão sem abrir margem a questionamento jurídico

Faz sentido o governo mudar a estratégia para reequilibrar o tráfego entre os principais aeroportos do Rio. O Tom Jobim/Galeão opera abaixo da capacidade, enquanto o Santos Dumont é conhecido por filas e atrasos. Em agosto, o Conselho de Aviação Civil (Conac) publicou resolução limitando, a partir de 2 de janeiro de 2024, os voos do Santos Dumont a um raio de 400 quilômetros. A medida, bem-intencionada, suscitou questionamentos de técnicos do Tribunal de Contas da União (TCU) e foi parar na Justiça.

Com apoio do governador Cláudio Castro (PL) e do prefeito Eduardo Paes (PSD), o governo pretende agora revogar a resolução e quer, no lugar dela, restringir a movimentação anual no Santos Dumont a 6,5 milhões de passageiros (hoje 10 milhões têm viajado pelo aeroporto). Será preciso ainda chegar a um consenso sobre a melhor forma de pôr isso em prática. Haverá pressão para transformar os 6,5 milhões em 7,5 milhões, 8,5 milhões etc. Ao governo, não restará opção senão ser rigoroso. É fundamental zelar pelo equilíbrio entre os dois aeroportos — o regional e o internacional —, como ocorre em toda grande cidade.

Merval Pereira - Uma questão política

O Globo

A Presidência da República precisa se envolver na formulação de uma estratégia de combate ao crime

A questão da segurança pública, sobretudo no Rio, mas também no Brasil, é essencialmente política, por isso é preciso que a própria Presidência da República se envolva na formulação de uma estratégia de combate. Pois é a segurança nacional que está em jogo. Até recentemente, os presidentes evitavam se envolver com a questão, pois certamente seriam atingidos pelas consequências dos problemas que afetam milhões de brasileiros.

Como, pela Constituição, a segurança pública é atribuição de governadores e prefeitos, pensavam que as crises não atingiriam diretamente o Palácio do Planalto. Mas governar um país com territórios dominados por milicianos e traficantes, cada vez mais interligados nas ações criminosas, é tarefa que se transforma a cada dia em desafio grandioso.

Malu Gaspar – Uma estátua para Lewandowski

O Globo

Petrobras derreteu R$ 32,3 bilhões na Bolsa e perdeu quase 7% de seu valor na segunda-feira, logo depois de divulgar ao mercado duas decisões do Conselho de Administração. A primeira foi a retirada de artigos do estatuto que blindavam a companhia de conflitos de interesse e indicações políticas. A segunda, a criação de uma reserva financeira que, em tese, servirá para uma série de objetivos, entre eles pagar juros e cobrir eventuais prejuízos.

As mudanças ainda precisam passar pela assembleia de acionistas, mas certamente serão aprovadas, porque o governo Lula tem maioria dos votos.

Quando isso acontecer, cairão as proibições para que ministros, secretários de estado, dirigentes partidários ou sindicais e seus parentes ocupem cargos de direção na companhia — mesmo que possam usá-los na aprovação de obras de refinarias deficitárias para ajudar aliados políticos ou para baixar artificialmente o preço do combustível.

Míriam Leitão - Energia e guerra, segundo a Opep

O Globo

O secretário-geral da Opep calcula que o Brasil vai ser um dos únicos países em que a produção de petróleo vai continuar crescendo até 2030

O secretário-geral da Opep, Haitham Al Ghais, acha que o preço do petróleo tem sido afetado principalmente por fatores psicológicos, já que a região do conflito Israel–Hamas não é produtora de petróleo. Perguntei o que aconteceria se alguma coisa saísse do controle como, por exemplo, a comprovação do envolvimento do Irã. “Na Opep, não vemos cenários hipotéticos”. Ontem circulou a informação, inicialmente publicada pelo “Wall Street Journal”, de que 500 integrantes do Hamas teriam feito treinamento no Irã, nas semanas anteriores. Mesmo com todo o cuidado de Al Ghais em não admitir o cenário “hipotético”, o fato é que ele existe, e o mercado de petróleo ficará pressionado enquanto durar essa guerra.

Luiz Carlos Azedo - Ofensiva de Israel torna a ONU irrelevante

Correio Braziliense

A deterioração da situação internacional tem por pano de fundo o colapso da chamada ‘pax americana’, a unipolaridade surgida após o fim da antiga União Soviética

As críticas a Israel feitas pelo presidente da ONU, Antônio Guterres, em meio à crise humanitária em Gaza, provocaram forte reação do ministro de Relações Exteriores israelense, Eli Cohen, que pediu a renúncia do diplomata português e anunciou que os vistos para funcionários da ONU foram suspensos por seu país. A crise diplomática escalou após declarações de Guterres de que os ataques do Hamas, em 7 de outubro, que deixaram 1.400 mortos, não aconteceram “no vácuo” — fazendo referência aos “56 anos de ocupação” dos palestinos por Israel. E não justificam a morte de 5,8 mil civis palestinos, muitas mulheres e crianças, e o deslocamento de mais de um milhão para o Sul de Gaza.

A forma como Israel ataca Guterres e pretende tratar o pessoal da ONU que atua na região em missões humanitárias, dos quais 35 já morreram nos bombardeios, é um sintoma da profunda crise que paralisa a organização. Seu Conselho de Segurança, presidindo provisoriamente pelo Brasil, não consegue aprovar uma resolução sobre o conflito, apesar dos esforços de mediação do chanceler brasileiro Mauro Vieira. Ontem, foram rejeitadas mais duas resoluções — uma apresentada pelos Estados Unidos e outra pela Rússia. A disputa entre as duas maiores potências militares do planeta tem por pano de fundo a Guerra da Ucrânia, apesar dos 1.875km de distância em linha reta entre Donetsk, região ocupada pelo Exército russo, e Gaza, que Israel pretende invadir por terra, mar e ar.

Maria Cristina Fernandes - Mediação da paz depende de lugar de fala

Valor Econômico

Legitimidade do Brasil como mediador da paz depende do enfrentamento do crime organizado

Indagado, antes da cirurgia, sobre a agenda de seu chefe em 2024, um auxiliar próximo do presidente Luiz Inácio Lula a Silva, listou, nesta ordem, o que são suas prioridades: o G-20, cujo comando o Brasil assume na próxima semana, as visitas de chefes de Estado ao país, em retribuição àquelas que Lula lhes fez este ano, e a preparação para a COP 30 e a cúpula dos Brics, em 2025. E a lojinha? Fica por conta dos ministros.

Neste quase um mês em que Lula convalesceu, Brasília parou. O mundo é que andou, sob o fogo cruzado do Oriente Médio. A política externa seguiu a cartilha do Itamaraty à qual Lula, à distância, se incorporou, tropeçando aqui e ali, e se corrigindo acolá. A política interna é que mostrou o quanto é dependente de Lula. Se o presidente se valeu de sua cirurgia para postergar nomeações, o presidente da Câmara, Arthur Lira, respondeu na mesma moeda com o adiamento de votações. Até o relatório da reforma tributária, no Senado, só saiu depois que Lula reapareceu.

César Felício - Parecer indica que reforma tributária caminha para modelo mais complexo

Valor Econômico

Relator no Senado manteve o núcleo central da proposta dos deputados, mas acatou 207 emendas

O parecer sobre a reforma tributária do senador Eduardo Braga (MDB-AM), lido nessa quarta-feira na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, foi apresentado pelo emedebista como um ponto de partida para a discussão e para novas mudanças no texto, mas não é bem assim. O ponto de partida na realidade foi o relatório do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) na Câmara, aprovado em julho com diversas modificações de última hora.

Braga manteve o núcleo central da proposta dos deputados — cobrança de tributação no destino, IVA dual e regra de transição longa, mas foram 207 emendas acatadas. O viés de mudança que a PEC vier a ter no Senado até o texto ser devolvido à Câmara deve ser para tornar o texto cada vez mais distante do votado pelos deputados. E cada vez mais complexo.

Lu Aiko Otta - No Senado, reforma tributária mudou para atender preocupações dos Estados

Valor Econômico

Relator Eduardo Braga tentou acatar demandas e reduzir resistência de governadores

Na casa da Federação, o Senado Federal, a reforma tributária ganhou ajustes para problemas que vinham incomodando os governadores. Primeiro, o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR) foi reforçado, passando de R$ 40 bilhões para R$ 60 bilhões, como antecipado pelo Valor.

Segundo, o Conselho Federativo foi redesenhado, perdendo os pontos que o faziam ser percebido como uma ameaça ao pacto federativo. Mudou de nome, passando a chamar Comitê Gestor, o que reforça seu caráter meramente técnico.

William Waack - Bem-vindos à selva

O Estado de S. Paulo

O conflito em Gaza vai prosseguir pelas brutais leis da região

Diante do que promete ser a maior operação militar da recente história de Israel – a invasão por terra de Gaza para exterminar a principal base do terrorismo do Hamas –, é bem reduzida a possibilidade de interferência por parte de potências ou instituições “de fora”.

A inefetividade da ONU, por exemplo, é proverbial, mas ela apenas espelha um longo processo de dissolução da ordem internacional, que guerras como as de Ucrânia e Gaza (mas não só) “de repente” expõem e aceleram. Foi desaparecendo o relativo “balanço” de poder entre as principais potências, ancorado nos últimos 20 anos na predominância dos Estados Unidos.

O presidente Joe Biden sugeriu uma volta ao “excepcionalismo” da política externa americana (“farol do mundo”) em seu recente pronunciamento à nação. Mas quão realista é essa arriscada postura no atual Oriente Médio?

José Serra* - Desenvolvimento e clima: aggiornando nossa história

O Estado de S. Paulo

O futuro desenhado pelo Clube de Roma está se concretizando com facetas diferentes, não menos desafiantes

Em 1972 era divulgado o primeiro manifesto que, relacionado com crescimento econômico, demografia e restrições ambientais, popularizou preocupação latente entre os que aspirávamos estudar e propor políticas para reverter o subdesenvolvimento.

Limites ao Crescimento – o conhecido informe do Clube de Roma, ou Informe Meadows –, de cientistas do MIT liderados pelo casal Donella e Dennis Meadows, com a participação de mais 17 colegas, projetava um cenário que beirava a catástrofe caso as tendências então observadas se prolongassem no tempo. Celso Furtado, em O Mito do Desenvolvimento Econômico (1973), chamava a atenção para os limites, em termos de sustentabilidade da biosfera, que desafiavam as estratégias para retirar a maior parte do mundo do subdesenvolvimento e da pobreza e miséria dos seus povos.

Felipe Salto* - Melhor não parir o monstrengo tributário

O Estado de S. Paulo

É preferível gastar mais tempo para gestar uma reforma que resolva, para valer, os problemas estruturais do ICMS: guerra fiscal e tributação concentrada na origem

Para salvar a proposta de reforma tributária, será preciso resolver os problemas cabeludos do texto. Não é à toa que o cronograma está atrasado. Aliás, é melhor caminhar devagar ou vamos fazer grandes e custosas bobagens. O lema dos ideólogos da PEC 45 é um só: nada pode ser pior do que o quadro atual. Ledo engano. O pecado mortal, de apostar numa reforma megalômana, não foi ainda expurgado. Tenta-se superá-lo com penduricalhos, cedendo a múltiplas pressões. O resultado é um monstrengo tributário. Eu avisei.

No segundo governo do presidente Lula, tentou-se avançar com uma reforma similar à atual. São Paulo exerceu papel importante, à época, para barrar aquela aventura, com o governador José Serra e o secretário da Fazenda Mauro Ricardo Costa. Na etapa de tramitação na Câmara dos Deputados, o governador Tarcísio de Freitas apresentou uma alternativa ao chamado Conselho Federativo, órgão que comandará o novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), baseada em sistema de compensações entre os Estados. Essa discussão precisa ser feita.

Adriana Fernandes - O custo da reforma tributária

O Estado de S. Paulo

Até agora, ninguém apresentou uma fonte para bancar uma conta de R$ 60 bi por ano

Para aprovar a reforma tributária, não vale tudo. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, aceitou botar mais dinheiro do governo federal no Fundo de Desenvolvimento Regional, com impacto nas contas públicas e comprometimento dos resultados futuros do novo arcabouço fiscal.

O aporte para o fundo que vai financiar os investimentos dos Estados para diminuir as desigualdades aumentou em R$ 20 bilhões (de R$ 40 bilhões para R$ 60 bilhões), e tudo indica que os senadores estão prontos para ampliar a facada no governo. Dinheiro para o fundo é despesa na veia.

Maria Hermínia Tavares - A fênix peronista

Folha de S. Paulo

Em toda parte, a escolha do eleitor é condicionada pela oferta de candidatos

Em 1998, o respeitado historiador argentino Tulio Alperin Donghi, publicou "La larga agonia de la Argentina peronista". Nele, argumentava que a sociedade moldada pelas políticas de bem-estar social do primeiro governo de Juan Domingo Perón (1945-1955) ia se tornando inviável.

Desde então, com altos e baixos na economia e alternância no poder entre peronistas e diferentes opositores, foram se estreitando cada vez mais as margens para manter o padrão de vida da massa dos argentinos sem produzir inflação descontrolada. O país foi lentamente empobrecendo. (Ainda assim, a renda per capita dos vizinhos continua bem maior que a nossa.)

Vinicius Torres Freire - Senado quer limitar carga de imposto sobre consumo, mas Congresso libera gasto

Folha de S. Paulo

Prévia do texto da mudança nos impostos amplia favores para empresas e dificulta gestão das contas públicas

Na versão do Senado para a Reforma Tributária, há um limite para a carga de impostos sobre o consumo de bens e serviços. Não é boa ideia, piorada ainda pelo cálculo desse teto de impostos, baseado na média de receita de 2012 a 2021.

Nesses anos, houve quedas na arrecadação por causa de anos de recessões medonhas (2015, 2016, 2020) e crescimento pífio do PIB. O cálculo prejudica em particular o governo federal.

Não é o único e talvez não venha a ser nem o maior problema da reforma do Senado. Mas é novidade ruim. De ruindades velhas ampliadas, temos mais regimes especiais. Quer dizer, redução de alíquota de impostos para certo tipo de empresa ou setor, o que eleva a alíquota do imposto médio geral. Por exemplo, benefícios para empresas ricas de advogados, médicos e outros profissionais. Qual o motivo da distinção?

Conrado Hübner Mendes - Generais não cometem crimes

Folha de S. Paulo

Só resta ao governo apaziguar relações com os heróis da sobrevivência democrática

Generais não cometem crimes. Nem contra humanos, nem contra a humanidade. Muito menos contra não humanos e o ambiente natural. Nem crimes contra criações filosóficas como o bem público.

Militares não praticam corrupção. Não enriquecem ilicitamente. Não estimulam filhas a ficarem solteiras para acumular aposentadorias vitalícias. Nem falseiam sua própria morte para que esposa receba pensão. Nem usufruem de apartamentos funcionais ilegalmente.

Militares não erram, não traficam, não torturam. Não mentem e dispensam apuração da verdade. Substituem verdade pela honestidade. Se dizem que não mataram, assunto encerrado. Não há mortos e desaparecidos. Não seriam anistiados se não por honra ao mérito. Não teriam inocentado ex-capitão por planejar atentado se ele não tivesse vocação para a Presidência.

Thiago Amparo - Milícia no Rio, algumas perguntas

Folha de S. Paulo

Tática bangue-bangue não combaterá a milícia porque é, ela mesma, uma tática miliciana

"O crime organizado que não ouse desafiar o poder do Estado", disse Cláudio Castro enquanto 35 ônibus e um trem eram incendiados no Rio de Janeiro. À realidade coube consumar a ironia: é como se os fatos expusessem a inevitabilidade do caos que a falta de política de segurança já anunciara. Lembro de García Márquez em "Cem Anos de Solidão": "O mundo era tão recente que muitas coisas careciam de nome e para mencioná-las se precisava apontar com o dedo"; apontar, sim, mas na cara de quem?

O governador quer que acreditemos que é uma luta de mocinhos contra bandidos; ele, claro, do lado dos primeiros. Quem dera a realidade fosse tão simples quanto sugere o maniqueísmo. Se fosse, a caça à cúpula de milicianos resolveria. Eis algumas questões. Pergunta 1: as autoridades fluminenses, de hoje e outrora, precisam explicar como permitiram que as milícias crescessem 387% em 16 anos, ocupando uma área de 64 Copacabanas. A resposta é que milícia lucra a partir e para o Estado. Sem desvendar os laços econômicos e sem controlar acesso a armas, nada será resolvido.

Ruy Castro - A seguir: milícias nacionais

Folha de S. Paulo

Com tanta facilidade para operar, surge um novo e promissor mercado para seus negócios: o Brasil

As milícias nasceram modestas. Eram policiais e bombeiros empenhados em combater por conta própria o tráfico em comunidades da Zona Oeste do Rio. Vendo-se prestigiados pelos cidadãos, dedicaram-se à oferta de "serviços" de combustível, transporte e comunicações. Com a adesão de civis, passaram a vender "proteção" contra violências perpetradas por eles próprios. E, agora, aderiram à venda das drogas que diziam combater. Devido à grande rentabilidade, suas atividades se tornaram de risco, sujeitas a divergências pontuais com milícias concorrentes, traficantes profissionais e até com sua eventual aliada, a polícia.

Poesia | "Certezas" - Mario Quintana

 

Música | Geraldo Vandré - Pra não dizer que não falei das Flores