quarta-feira, 23 de novembro de 2022

Vera Magalhães - Golpismo não pode ficar na conta da piada

O Globo

É de extrema gravidade que o partido do presidente tente melar as eleições em que obteve seu melhor desempenho

A cada nova casa avançada pelos que intentam questionar o resultado das eleições, o lugar-comum ouvido entre políticos, juízes, advogados e analistas políticos é:

— Esquece, isso não vai dar em nada.

Mas já deu em muita coisa, e parece haver pouca consciência por parte de todos esses segmentos do grau de radicalização operado pelo bolsonarismo não mais nas franjas da extrema direita, mas em amplos espectros da sociedade.

Há quase um mês, centenas de pessoas estão nas ruas desempenhando um ritual entre bizarro e francamente criminoso, que vai de apelos pueris a extra-terrestres a atentados terroristas contra concessionárias de rodovias.

Com exceção do Judiciário, todos os demais responsáveis por preservar o Estado Democrático de Direito de acordo com a Constituição tocam a bola de lado, ora se omitindo, ora fingindo trabalhar. É o caso da Procuradoria-Geral da República, da aparelhada Polícia Rodoviária Federal e do Congresso, cujos líderes até aqui não deram uma única palavra sobre a escalada golpista em curso.

Elio Gaspari - Lula precisa mostrar alguma carta

O Globo

Os tumultos de Bolsonaro são suficientes

Pelo seu lado, Lula vinha fazendo uma transição exemplar. Brilhou na COP27, passou por Lisboa e, por causa de um desconforto médico, terá uma semana de relativo repouso. Desde sua vitória nas urnas, formou uma equipe de transição com 283 pessoas e 31 grupos de trabalho. Um brilhante espetáculo cenográfico. Pôs na mesa a PEC da Transição e tropeçou na responsabilidade fiscal. Afora ele, não há no firmamento do novo governo uma só voz autorizada. (Abundam vozes desautorizando-se, mas assim é a vida durante as alvoradas do poder.)

Falta pouco mais de um mês para o início do governo, e não é bom que isso aconteça. Se do outro lado da cerca estivessem presidentes como Fernando Henrique Cardoso e Michel Temer, o vácuo seria irrelevante. Do outro lado está Jair Bolsonaro, calado, enquanto ainda há estradas bloqueadas e circulam mensagens sibilinamente golpistas como a do doutor Augusto Nardes.

É verdade que a Copa do Mundo sedará muitas emoções, mas Lula poderia colocar em campo pelo menos uma voz autorizada. Ele dispõe de companheiros fiéis para desempenhar esse papel sem pensar numa próxima nomeação. A barafunda da PEC da Transição arrisca misturar-se com algum tipo de blindagem do orçamento secreto. Mesmo assim, o presidente da Câmara, Arthur Lira, foi ao ponto:

— Não tem ainda o projeto, não tem ainda o texto, não tem ainda o autor, não tem ainda as assinaturas.

Pior: não tem nada próximo ao número mágico do ervanário de que o governo precisará.

Bernardo Mello Franco - Valdemar deveria ouvir Valdemar

O Globo

Para desmontar nova farsa do chefão do PL, basta confrontá-lo com suas próprias palavras

Em setembro de 2021, Valdemar Costa Neto gravou um depoimento em defesa da urna eletrônica. O poderoso chefão do PL garantiu que o sistema era confiável e criticou os bolsonaristas que se esgoelavam pelo retorno do voto impresso. “Não se trata de ser contra ou a favor do Bolsonaro. Se trata de defender os interesses do país”, sentenciou.

Ontem o mesmo Valdemar convocou a imprensa para um pronunciamento em Brasília. Insinuou que a urna teria problemas e, sem apresentar provas, pediu a anulação de milhões de votos do segundo turno. Curiosamente, não pediu a anulação de nenhum voto do primeiro turno, quando o PL elegeu a maior bancada da Câmara e do Senado.

Valdemar é um profissional. Condenado e preso no mensalão, renunciou duas vezes para não perder os direitos políticos. Na cadeia, manteve a sigla sob rédea curta e apurou o faro para novos negócios. No fim do ano passado, articulou a filiação de Bolsonaro e sua trupe. Foi um investimento lucrativo. Até 2026, ele será recompensado com a maior fatia das verbas do fundo partidário.

Luiz Carlos Azedo - Quando a história se repete como um factoide irresponsável

Correio Braziliense

O pedido de invalidação da eleição faz parte de uma estratégia do presidente Bolsonaro para impedir a posse de Lula

As melhores reportagens políticas sobre momentos decisivos da história muitas vezes estão nos livros e não, necessariamente, nos jornais e revistas da época. É o caso, por exemplo, de Renúncia de Jânio — um depoimento, do jornalista Carlos Castello Branco, que foi referência do jornalismo político para minha geração por suas colunas durante o regime militar, no antigo Jornal do Brasil, apesar da censura prévia imposta pelo Ato Institucional nº 5. O livro mostra como uma intriga envolvendo o presidente da República e o governador carioca Carlos Lacerda, nos bastidores do Palácio do Planalto, deu início à crise política que levou Jânio Quadros à renúncia. Seus desdobramentos resultaram em 20 anos de ditadura.

Outra obra desse naipe é Cinco dias em Londres, de John Lukacs, que narra os bastidores do Gabinete de Guerra britânico, de 24 ao dia 28 de maio de 1940, quando Winston Churchill travou uma dura luta política com o Lorde Halifax para convencer seus integrantes a não fazerem um acordo de paz com Hitler. A resistência de Winston Churchill a um acordo da Inglaterra com a Alemanha evitou um desastre. O livro conta em detalhes a entrega do cargo a Churchill por Neville Chamberlain e revela a desconfiança do governo inglês, do presidente norte-americano Franklin Roosevelt e do próprio povo inglês, além da imprensa e dos aliados em relação a Churchill, homem confiável, íntegro e respeitado, porém alcoólatra e um pouco velho para o desafio da guerra.

Fernando Exman - Com Lula, o retorno da diplomacia presidencial

Valor Econômico

Perfil do chanceler vai apontar rumo da política externa

A vitória de Luiz Inácio Lula da Silva recoloca em foco a chamada diplomacia presidencial.

É aquela modalidade de diplomacia conduzida pessoal e diretamente pelo chefe de Estado, a qual ganhou peso nos mandatos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e, sob Lula entre 2003 e 2010, recebeu potentes esteroides anabolizantes. Agora, é dado como certo que Lula buscará novo protagonismo internacional. A dúvida que permanece, sobretudo diante do mistério sobre quem será o ministro da área, é como encaixará o Itamaraty e o futuro chanceler nos seus planos.

Intelectual reconhecido internacionalmente, FHC valeu-se da experiência que acumulou quando esteve à frente do Itamaraty para projetar-se no exterior. Depois de eleito presidente, com ajuda da chancelaria, construiu uma intensa agenda que acabou sendo alvo de críticas e piadas, como se tais visitas não demonstrassem o prestígio político do Brasil no exterior ou ajudassem na abertura de mercados.

Lu Aiko Otta - Uma chance para a América Latina

Valor Econômico

Busca por energia segura, verde e barata pode dar as cartas dos investimentos privados nos próximos anos

O desmonte do Superministério da Economia no próximo governo é dado como certo, mas há detalhes ainda não decididos que poderão influenciar o nível de atratividade do Brasil para investimentos estrangeiros. Por exemplo: o que será feito do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), que hoje administra uma carteira de R$ 901 bilhões em projetos de concessões, privatizações e Parcerias Público-Privadas (PPPs) federais, além de alguns projetos de responsabilidade de Estados e municípios.

Reunindo empreendimentos em áreas como rodovias, ferrovias, portos, energia elétrica, óleo e gás, mobilidade urbana, iluminação pública e até gestão de parques nacionais, o PPI tem um perfil parecido com o antigo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que deverá ser retomado no próximo governo. Portanto, um possível destino é o Ministério do Planejamento, especula-se.

Bruno Boghossian - A derrota planejada de Bolsonaro

Folha de S. Paulo

Aliados apontam que objetivo é agitar as ruas com contestação das urnas apresentada pelo PL

Nos últimos dias, um ministro do STF avisou a Valdemar Costa Neto que uma ação para questionar o resultado das eleições não teria nenhuma chance de prosperar. O presidente do PL admitiu que sabia disso, mas explicou que seguiria em frente de qualquer maneira. O chefão do partido argumentou que, se ficasse quieto, haveria uma rebelião da bancada bolsonarista da sigla.

Nem mesmo os aliados fiéis de Jair Bolsonaro acreditam que o Tribunal Superior Eleitoral vai mudar o resultado da disputa. A ideia de pedir à corte a anulação de parte dos votos do segundo turno é só uma tentativa de dar verniz político a suspeitas falsas de fraude e estimular novos protestos nas ruas.

Hélio Schwartsman – Acomodação incômoda

Folha de S. Paulo

O papel a que as Forças Armadas se prestaram na questão das urnas eletrônicas foi vergonhoso

Embora eu fique desconfiado quando ouço Lula pontificar contra a responsabilidade fiscal, penso que as críticas ao petista são precipitadas. Ele ainda não definiu nem quem comandará a economia nem a linha exata que seu governo perseguirá.

Como político conciliador formado no sindicalismo, Lula adapta seus discursos à audiência e atrasa as decisões que explicitam perdas até o último momento. Não é porque ele critica a contenção de gastos que vai necessariamente promover a farra fiscal. Teremos de ser pacientes para saber para que lado a balança penderá.

Mariliz Pereira Jorge - Por que torço pelo governo Lula

Folha de S. Paulo

Que o presidente eleito honre a defesa que fez da imprensa livre e das instituições

ombudsman da Folha em sua coluna semanal disse que a imprensa está de mau humor com Lula. José Henrique Mariante traz um levantamento e mostra como reportagens e colunas têm tratado as primeiras semanas do presidente eleito e as notícias sobre a transição.

Concordo que o estado de espírito, em especial nos editoriais e nas colunas de opinião, possa parecer antipatia gratuita. Às vezes é, mas percebo também um reposicionamento necessário. Depois do período Bolsonaro que, dos bastidores, ainda tenta dar uma rasteira na democracia, há uma urgência em voltar a tratar do que de fato é importante agora que, espero, estamos novamente entre adultos.

Vinicius Torres Freire - A barganha do Congresso com Lula

Folha de S. Paulo

Ideia dos líderes do poder é obrigar o governo eleito a renegociar mais adiante

Os líderes do grupo no poder no Congresso dizem que a votação da "PEC da Transição" vai ser negociada segundo dois critérios: 1) "Uma mão lava a outra"; 2) Manter o poder de barganha.

A "mão que lava a outra": Luiz Inácio Lula da Silva dá apoio explícito ou velado à reeleição de Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (União Brasil-MG) para o comando de Câmara e Senado, respectivamente; a "PEC da Transição" passa.

"Poder de barganha": o Congresso aprova o gasto extraordinário, além do previsto no projeto de Orçamento para 2023. Para os demais anos, a ver.

Vários parlamentares dizem que, além de manter o poder de barganha e de pressão sobre o governo, aprovar agora gasto extraordinário apenas para 2023 faria "sentido econômico". Isto é, seria necessário conhecer o novo plano de contenção da dívida, despesa e déficits (que em tese vai substituir o "teto") antes de pensar o tamanho do gasto a partir de 2024.

Marcelo Godoy - Lula e o exemplo de Osório

O Estado de S. Paulo

Equipe de transição terá almirante e general em meio a manifestações de militares da ativa

Luiz Inácio Lula da Silva se aproxima da posse com manifestantes nas portas de quartéis enquanto generais demonstram pouca disposição para contrariar o movimento. Questiona-se a legitimidade da eleição do futuro comandante das Forças Armadas.

Há ainda quem abrigue em rede social xingamentos ao futuro chefe. O coronel Alberto Ono Horita, que chamou Lula de ladrão e acusou Alexandre de Moraes de favorecer a eleição de Geraldo Alckmin, não é o único.

O coronel André Luiz Rodrigues Garcia, da 8.ª Região Militar, publicou no dia 12 no Twitter: “Janja deixa Mula mais envergonhado do que na cadeia”. Três dias depois, o general Luiz Alberto Cureau Junior, do Centro de Capacitação Física do Exército, compartilhou crítica do senador eleito Hamilton Mourão a Lula pelo uso do jatinho de um empresário para ir ao Egito. E até o chefe do Centro de Inteligência do Exército, o general Luiz Gonzaga Viana Filho, mantém publicação na qual critica a imprensa com os dizeres: “Extra, extra! Comedor de capim do PT postando merda”.

Nicolau da Rocha Cavalcanti*- Lula e a liberdade religiosa

O Estado de S. Paulo

O uso da religião nas eleições é só a ponta de um processo maior de reenquadramento (‘reframing’) da esquerda em chave moral.

Neste ano, a campanha eleitoral de Jair Bolsonaro apresentou Luiz Inácio Lula da Silva como inimigo da religião. Segundo esse discurso, a eleição do candidato do PT à Presidência da República colocaria em risco a liberdade religiosa no País.

Utilizar o tema na campanha foi arriscado. Se existe um assunto em que Lula tem um histórico muito positivo, ele é justamente a defesa da liberdade religiosa. Pelo visto, Jair Bolsonaro apostou na ignorância de seu eleitor em relação aos fatos ocorridos no segundo mandato de Lula.

Em 13 de novembro de 2008, sob a presidência de Lula, o Brasil firmou com a Santa Sé o acordo relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil. No ano seguinte, o Congresso aprovou o tratado e, em 2010, o presidente Lula editou o Decreto n.º 7.107/2010 promulgando o Acordo Brasil-Santa Sé. Trata-se de um tema difícil e complicado, cheio de percalços e ressentimentos históricos. Eventual incompreensão sobre o assunto poderia gerar alto custo político para o presidente da República. No entanto, de forma corajosa, Lula assumiu o risco e fez com que o Acordo Brasil-Santa Sé fosse assinado e aprovado. Em todo o mandato de Jair Bolsonaro, não houve nenhum ato do governo federal em favor da liberdade religiosa tão arriscado politicamente. Sempre que Bolsonaro falou de religião foi em benefício político próprio.

Aylê-Salassié Filgueiras Quintão* - Quanto vão nos pagar para cuidar do planeta Terra?

Que semana, essa última, hein!... Ufa! 

Pela primeira vez um   brasileiro, o economista  Ilan Goldfajn, foi eleito presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).  A COP27 - Conferência do Clima da ONU aprovou a criação definitiva de Fundo de perdas e danos resultantes das mudanças  climáticas, com aporte de US$ 100 bilhões, anualmente,   para financiar os prejuízos dos países mais vulneráveis . A    Amazônia volta ao centro das discussões como  "pulmão do mundo" , e o Brasil retoma sua liderança entre os chamados países "Biodiversos", que defendem redução gradual e definitiva do uso de combustíveis fósseis no planeta (petróleo e carvão). Por aqui, em Brasília,  a Comissão de Transição de governo, constituída com 31 grupos temáticos, promove muitos debates e alguns desentendimentos,  reivindicando liberdade para  um gasto de R$ 198 bilhões, com a Bolsa Família, fora do teto fiscal. No Catar, começou a Copa do Mundo de Futebol de 2022, mesmo com a nova variante do coronavirus circulando por aí.  

O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões

PECs do Senado têm de substituir PEC da Transição

O Globo

Propostas dos senadores Tasso Jereissati e Alessandro Vieira recobram sanidade no debate fiscal

Faltando menos de um mês para a definição do Orçamento de 2023, o Senado começou um debate que merece atenção. Em jogo, não está apenas o programa de transferência de renda que voltará a se chamar Bolsa Família. A questão central é a sustentabilidade da dívida pública. Se o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva receber do Congresso uma licença para começar gastando bem mais do que o governo arrecada, sem um plano de controle do endividamento, a economia sofrerá com inflação alta e crescimento baixo.

Duas sugestões apresentadas no Senado são melhores do que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição elaborada pelo governo eleito. A primeira,do senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), propõe expansão de R$80 bilhões no valor sujeito ao teto de gastos, que seria preservado por ora. Seria o suficiente para manter os R$ 600 pagos aos beneficiários do Bolsa Família, dar mais R$ 150 a cada criança e ainda sobrariam R$ 10 bilhões para outras rubricas orçamentárias. O redesenho do Bolsa Família com mais foco abriria ainda mais espaço sob o teto.

Poesia | Desencanto - Manuel Bandeira com narração de Mundo dos poemas

 

Música | Brasil Jazz Sinfônica & Paulinho da Viola - Onde a dor não tem Razão