O
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso defende que o tucano Aécio Neves
antecipe seu discurso e já se lance como postulante à Presidência em 2014.
"Ele deve assumir mais publicamente posições."
"Aécio
deve se lançar já ao Planalto", diz FHC
Entrevista da 2ª
Fernando Henrique Cardoso
Para ex-presidente,
PSDB precisa de "autocrítica" para afinar discurso de 2014
Fernando Rodrigues
BRASÍLIA - O
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso acha que o pré-candidato tucano ao
Planalto em 2014, o senador mineiro Aécio Neves, deve antecipar seu discurso e
se assumir já como postulante ao cargo.
Em entrevista à Folha
e ao UOL na última sexta-feira, o tucano disse: "Eu acho que nossos
políticos precisam voltar a tomar partido em bola dividida. A busca das coisas
consensuais mata a política".
Aécio deve dizer
agora que é candidato? "A ideia de que você precisa esperar, porque vai
ser desgastado, não adianta."
Joaquim Barbosa,
presidente do STF, "tem bom senso" e "não entra nessa" de
se candidatar ao Planalto. "Porque é outro caminho, não é o dele."
Seria um "erro".
FHC reconhece que, no
momento, é natural ganhar força a percepção geral de que o Estado precisa
socorrer a economia. Só que, com crise externa, "os que estão no governo
passaram a ter uma espécie de perdão para utilizar recursos públicos para
reativar a economia".
O crescimento do PIB
não é algo que dependa só do presidente da República. "Mas como puseram na
campanha que ela [Dilma Roussef] era a boa administradora, o mau desempenho da
máquina, que não dependeu dela, vai cair na cabeça dela."
Para o tucano, falta
a Dilma um "brilho" na administração. "Não conseguiu ainda
organizar. Não se sabe nem o nome dos ministros. Está uma coisa meio
opaca."
Sobre o mensalão,
disse sentir por algumas condenações, como as de José Genoino e de José Dirceu.
"Eles não foram condenados pelo que eles são. Mas pelo que fizeram (...)
Acho um episódio triste. Essa gente ajudou muito o Brasil no passado."
De Luiz Inácio Lula
da Silva, que o sucedeu no Planalto, FHC condena a atitude complacente. "A
leniência não quer dizer que participou, nem estou acusando. É que não
reclamou."
Aos 81 anos, o tucano
faz musculação três vezes por semana. Bebe vinho e uísque. "Durmo bem. Eu
gosto da vida, gosto das pessoas." Está namorando? "Eu estou. Mas não
é meio ridículo? Namorar com 81 anos? Não pode."
A seguir, trechos da
entrevista.
Folha/UOL - A crise
econômico-financeira internacional colocou na defensiva as ideias liberais.
Essa onda muda a abordagem de partidos como o PSDB?
Fernando Henrique
Cardoso - Os que estão no governo passaram a ter uma espécie de perdão para
utilizar recursos públicos para reativar a economia.
O PSDB nunca foi um
partido que tivesse muito amor pelo mercado. Como todos os partidos
brasileiros, as pessoas gostam mesmo é de governo, é de Estado. Isso desde
Portugal, da Península Ibérica. O grande ator, querido, é o governo.
É natural haver essa
percepção de que o Estado precisa voltar a socorrer todo mundo?
Enquanto estivermos
nessa conjuntura atual, sim. Mas isso muda.
O PSDB nasceu de
centro-esquerda. Em eleições recentes, abordou temas morais e religiosos.
Deslocou-se para a centro-direita. Por quê?
Por engano eleitoral.
Esses temas são delicados. Acho que você tem que manter a convicção. Você pode
ganhar, pode perder. Em termos de comportamento e de valores morais, o PSDB tem
que se manter progressista. Quando não se mantém, não tem o meu apoio. Eu não
vou nessa direção.
O sr. tem dito que o
PSDB tem que se aproximar mais "do povo". Como fará isso?
Os partidos, por
causa de uma mudança tão rápida no Brasil, ainda continuam com uma visão de
sociedade anterior à atual. A atual é essa do UOL, da pessoa que fica aí
navegando o tempo todo, que tem informação fragmentada. Minha tese é a
seguinte: é preciso ouvir. Não é pregar. É ouvir. É reconectar com o que está
acontecendo com o país.
Por exemplo?
Esse Brasil novo não
quer dizer que ele seja igual ao que foi o do passado. Que vai ser todo mundo
da classe média, um conceito que confunde.
Veja essa última
novela da Globo, "Avenida Brasil". Coloca uma temática do que se
imaginava que eram os emergentes. Eles têm uma identidade forte com o lugar de
origem. Olham até com suspeita a chamada Zona Sul. Como diria o Elio [Gaspari],
o andar de cima. Mas o andar de baixo subiu. Está não se sabe bem onde.
Como é a capacidade
gerencial do atual governo?
Alguém me perguntou a
respeito de o PIB ter crescido pouco: "Isso quer dizer que a presidente
Dilma é má administradora?". Não. O PIB cresceu pouco por mil razões. O
erro, que eu acho que houve, é que o governo se colou ao PIB. Não precisava.
Não acho que se deva colar na presidente Dilma [a queda do PIB]. Ela é que pode
se colar nisso. Aí fica mal para ela.
O PIB afeta a
eleição?
Se não houver
desemprego, a população não sente. Na campanha, para viabilizar a candidatura
da presidente Dilma, ela foi apresentada como grande gestora. Responsável pelo
que acontece no país. Não há mais isso. Hoje a gestão depende da máquina. Mas
como puseram na campanha, o mau desempenho da máquina, que não dependeu dela,
mas de um sistema, vai cair na cabeça dela.
Esse discurso é bom
para a oposição?
A governança está
falha. Mas campanha é outra coisa. Isso [falar da governança] pega quem? Por
enquanto, não pega o povo.
Há um escândalo novo
que envolve uma ex-chefe do escritório da Presidência da República em São
Paulo. Por que esse tipo de escândalo ocorre com tanta frequência?
A cultura tradicional
brasileira é patrimonialista. Nunca vou negar que Lula deu algumas
contribuições importantes ao Brasil. Mas houve uma regressão patrimonialista.
Aceitar como normal a transgressão. Na cabeça deles não é transgressão. Esse
último episódio é uma consequência de uma coisa mais geral.
O sr. conviveu com
alguns dos réus que foram condenados no mensalão. José Genoino, José Dirceu. O
que o sr. achou dessas condenações?
Eles não foram
condenados pelo que eles são. Mas pelo que eles fizeram. Uma coisa é você ser
um bom homem. De repente, eu fico com raiva, dei um tiro e matei alguém. O que
eu vou fazer? Vou para a cadeia.
Nunca vi nada do
Genoino. É uma pessoa bastante razoável. O José Dirceu é um quadro. Eu respeito
as pessoas que têm qualidade de quadro. Acho um episódio triste. Porque essa
gente ajudou muito o Brasil no passado.
O PSDB está com o
discurso afinado para 2014?
Não. Falta o que na
esquerda costuma-se dizer "fazer a autocrítica".
Quem serão os
candidatos em 2014?
Hoje, você tem o
Aécio [Neves], a presidente Dilma, eventualmente, Eduardo Campos [governador de
Pernambuco e presidente nacional do PSB] e Marina [Silva, que foi candidata em
2010, pelo PV].
Joaquim Barbosa, do
STF?
Eu acho que ele tem
bom senso. Não! [risos] Eu acho que ele tem juízo, não entra nessa, não. Porque
é outro caminho, não é o dele. Aí é erro.
No PSDB, Aécio é
consenso?
O PSDB tem que se
habituar à prévia. Se não houver combatentes... Será.
José Serra?
Ele pode, de repente,
ser candidato. Neste momento, eu diria que não é a tendência. Ele poderia
preencher um papel grande, político e social. Escrevendo, pregando, fazendo
conferência.
Aécio deveria
acelerar a busca do discurso? Está na hora?
Acho. [Deve] assumir
mais publicamente posições. Falar, fazer conferência, viajar. Nossos políticos
precisam voltar a tomar partido em bola dividida. A busca das coisas
consensuais mata a política. E mesmo se for o caso de ser candidato, que diga
que é. Acho que ele deve assumir.
Como está a saúde?
Está boa.
Algum cuidado
especial?
Gostar da vida. Das
pessoas. Faço um pouco de exercício, musculação. Como bem e não muito. Bebo
vinho. Não muito. E, às vezes, uísque, mas raramente. E durmo bem.
Está namorando?
Isso é o que dizem
por aí. Mas dizem tanto, que eu acabo acreditando [risos].
Mas está ou não?
Eu estou. Mas não
estou dizendo que acabo acreditando? Mas não é meio ridículo? Namorar com 81
anos? Não pode.
Por quê?
No meu caso, eu não
penso que eu tenho 81 anos. Então vai [risos].
Fonte: Folha de S.
Paulo