*Norberto Bobbio(18/10/1909-09/01/2004), filósofo
político, historiador do pensamento político, escritor e senador vitalício
italiano. ”Teoria Geral da Política - A Filosofia Política e as Lições dos
Clássicos”. P.387.Editora Campus, Rio de Janeiro. 2000.
Política e cultura, segundo uma opção democrática, constitucionalista, reformista, plural.
domingo, 19 de março de 2023
Opinião do dia – Norberto Bobbio*
Luiz Sérgio Henriques* - ‘A rosa de Hiroshima’
O Estado de S. Paulo.
Mal podemos imaginar o grau de beligerância
num mundo em que autocratas dos mais variados coturnos conseguissem acesso
irrestrito às alavancas e às salas de comando
Desde 1945 imagens de “crianças mudas
telepáticas” e de “meninas cegas inexatas”, entre outras, passaram a indicar,
de modo irrevogável, a possibilidade de autodestruição da humanidade sob a nova
condição atômica. E a tal ponto que a ameaça absoluta representada pelo
cogumelo obsceno – a “rosa com cirrose”, na intuição de Vinícius de Moraes –
seria percebida por políticos responsáveis de todas as correntes. A partir daí
o gênio não voltaria mais à garrafa de origem e vez por outra nos assombraria.
Em alguns momentos, como na crise cubana dos mísseis, escapamos por um triz.
Talvez surpreenda hoje a afirmação de que
um líder comunista, forjado nos anos de ferro e fogo, tenha apreendido tal
ameaça em toda a sua extensão e complexidade. Palmiro Togliatti, respeitado
dirigente do antigo Partido Comunista Italiano (PCI), nos anos 1950 e 1960 do
século 20 interpelaria em variados momentos a cultura católica “adversária”,
buscando um terreno comum a partir do qual a “luta pela paz” saísse da esfera
instrumental – inclusive da parte dos comunistas – e empolgasse multidões mundo
afora.
Para Togliatti, a guerra já não era a continuação da política por outros meios, mas, antes, a abolição desta mesma política e, como consequência, “o possível suicídio de todos”. A Igreja de Constantino começava a definhar com os bons ares do Concílio Vaticano II e o tempo dos anátemas devia ficar progressivamente para trás. Seria, então, a hora do “diálogo” entre cristãos e marxistas, estes últimos, ainda por cima, chamados a deixar de lado aspectos ultrapassados da sua visão das religiões, herdados do iluminismo do século 18 e do materialismo do século 19.
Dorrit Harazim - Nada de novo
O Globo
Livros não são objetos mortos. Contêm uma
potência de vida tão vibrante quanto a alma que os criou
Felizmente, nem tudo pode estar em todo
lugar ao mesmo tempo, como pretende o filme multicampeão de Oscars de 2023. Há
coisas que merecem ser contadas com vagar para ser sorvidas em profundidade.
Assim fez Erich Maria Remarque quase cem anos atrás ao publicar sua obra-prima
literária “Nada de novo no front”. A primeira edição, de 1929, esgotou-se no
mesmo dia e, ao final daquele ano, mais de 1 milhão de cópias já haviam sido
lidas com reverência. Até hoje Remarque continua sendo, ao lado de Goethe, o
escritor de língua alemã mais lido no mundo.
O livro, como se aprende na escola, é baseado na vivência do autor como soldado na Primeira Guerra Mundial (1914-1918). O narrador é um jovem recruta, Paul Bäumer, que parte para a guerra voluntariamente ao lado de colegas de classe. Encontra a face do horror daquela que, com razão, é chamada de “A Grande Guerra”. No livro, combatentes se arrastam em trincheiras de lama e sangue, convivem com restos humanos pendurados em arame, cavalos são esturricados por bombas, explodem feio, e a soldadesca, ora faminta à beira da loucura, ora convulsionada por gases venenosos, vai silenciando. Poucos saem da narrativa com vida. O próprio protagonista, Bäumer, morre poucos dias antes da assinatura do Armistício que, na vida real, pôs fim à carnificina de mais de 40 milhões. Foi todo um mundo que ruiu e que Erich Maria Remarque compreendeu e descreveu sem retórica.
‘Ameaça comunista’ ronda 44% dos brasileiros
Por Nicolas Iory e Bianca Gomes / O Globo
Tema disseminado pela extrema-direita e
frequente dos discursos de Bolsonaro, mudança de regime no país é uma hipótese
totalmente plausível para 31%, enquanto 13% concordam em parte
Alardeado pela extrema-direita no mundo e
tema recorrente nos discursos de Jair Bolsonaro mesmo antes de ocupar a
Presidência, a hipótese de instalação de um regime comunista preocupa uma
parcela dos brasileiros — ainda que a queda do Muro de Berlim, símbolo da
derrocada do modelo, tenha ocorrido há pouco mais de 33 anos. Segundo o Ipec, a
chance de um regime ao estilo soviético ser instaurado é plausível para 44% dos
brasileiros.
No ano passado, ao longo da campanha,
Bolsonaro associava o “risco” à vitória de Lula. Nos Estados Unidos, o
ex-presidente Donald Trump e outros representantes do Partido Republicano
usavam o mesmo expediente contra Joe Biden, vitorioso no pleito de 2020. A
pesquisa mostra ainda que, no Brasil, 31% concordam totalmente com a afirmação
de que o comunismo pode vigorar no país; 13% dão aval em parte, enquanto 48% discordam
total ou parcialmente da possibilidade.
— A maior parte das pessoas associa o
comunismo na América Latina com as situações de Venezuela e Cuba, combinações
de um regime autoritário com realidades como fome e desabastecimento. Isso
esteve muito presente nas narrativas do Bolsonaro — diz a cientista política
Camila Rocha, pesquisadora do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento
(Cebrap).
Em setembro de 2022, em Sorocaba (SP), Bolsonaro chamou Lula de “capeta” e disse que o petista queria “impor” o comunismo no Brasil. Não à toa, a pergunta “o que é comunismo?” foi a que mais cresceu em uma das categorias nas pesquisas dos brasileiros no Google no ano passado.
Merval Pereira - De volta para o futuro
O Globo
Inteligência artificial conseguirá
reproduzir a realidade?
Nos sentimos envelhecer quando, além da
redução das capacidades físicas, presenciamos o início de processos que mudaram
a vida do país e do mundo. Nasci em 1949, e de lá para cá usei diversas moedas:
Cruzeiro; Cruzeiro Novo; Cruzeiro novamente; Cruzado; Cruzado Novo; Cruzeiro de
novo: Cruzeiro real e Real. Passando pelas tablitas e o URV. Todas acompanhadas
de sucessivas crises políticas e econômicas.
Também no jornalismo acompanhei mudanças
radicais, como a passagem do linotipo de chumbo à era digital. As notícias que
transmitíamos através de mensageiros ou telex, hoje podem ser enviadas pelo
celular. Celulares, aliás, que foram sendo reduzidos de tamanho, assim como os
computadores, enquanto aumentam exponencialmente sua capacidade.
O primeiro celular que vi foi com um correspondente estrangeiro, em Brasília. Era um tijolão, com uma antena enorme. Tenho ainda em casa um Macintosh Classic modelo 1991 que, ao lado de uma Remington do pós-guerra, me lembram do passado enquanto teclo um IPad última geração. A primeira telefoto a cores foi publicada no caderno de Esportes do Globo em 1979, de Recife para o Rio, num jogo do Flamengo. Mas, antes disso, a telefoto em preto e branco já representava uma evolução espantosa.
Bernardo Mello Franco - Vale a pena ver de novo
O Globo
Com pressa para apresentar resultados,
presidente relança vitrines de governos petistas
Lula está com pressa. Na terça-feira, o
presidente disse aos ministros que o mandato é “muito curto”. Acrescentou que
quatro anos passam “rapidíssimo” para quem está no poder. “Nós não temos muito
tempo para ficar pensando no que fazer. Temos que fazer”, cobrou.
O petista está preocupado com o calendário.
Sabe que se aproxima dos cem dias de mandato. A data costuma marcar o primeiro
balanço de um novo governo. É quando a imprensa e a sociedade começam a
comparar o que foi prometido ao que foi entregue.
Lula informou que deve celebrar a efeméride
com um pronunciamento na TV. Se o discurso fosse ao ar hoje, teria ares de
“Vale a pena ver de novo”. Até aqui, o governo apresentou poucas novidades.
Preferiu apostar na reciclagem de velhos programas.
Em fevereiro, o presidente relançou o Minha Casa Minha Vida. No início de março, recriou o Bolsa Família. Na semana passada, ressuscitou o Pronasci. Amanhã fará uma solenidade para anunciar a volta do Mais Médicos.
Elio Gaspari - Franklin recuperou a voz da rua
O Globo
Está nas livrarias “Quem foi que Inventou o Brasil?”,
do jornalista e ex-ministro Franklin Martins. A pergunta é do compositor
Lamartine Babo em 1934 e, na resposta de Franklin, o povo canta. Nesse volume,
ele coletou 296 canções, indo da Independência à República, com algumas dezenas
tratando da escravidão e do racismo.
A história de Pindorama deve muito à música. Basta
dizer que o Hino da Independência tem letra de um jornalista político (Evaristo
da Veiga) e música de D. Pedro I. Graças à música, conhece-se também o “Batuque
de Palmares”, tão candidato que foi proibido em 1839:
“Folga nego, branco num vem cá
Se vié, pau há de levá”.
Com a colaboração de João Nabuco ao piano, foram
trazidas de volta inúmeras canções, inclusive as “Cantigas Báquicas”, compostas
em 1826 por José Bonifácio de Andrada, o poderoso ministro da Independência,
exilado na França. Episódios que o andar de cima trata com gravidade; no de
baixo as coisas eram mais simples. Quando o Banco do Brasil quebrou, em 1829, a
rua cantava “piolhos, ratos e ladrões”. Quase meio século depois, quando
quebrou um grande banco privado do Rio, cantava-se:
“E quem há de nos valer
Em momento tão sinistro?
Ah! Já sei, corramos todos
Ao palácio do ministro.”
Celso Rocha de Barros – A esquerda e o mercado
Folha de S. Paulo
Mercado só enxerga problema quando vira
gasto
Uma pesquisa
Genial/Quaest revelou que 98% dos gestores de mercado (em uma amostra
de 82) reprovam os rumos da política econômica de Lula. A primeira
coisa a ser dita é que se os 2% de gestores que discordam estiverem certos
devem fazer uma boa grana nos próximos anos.
Em um certo sentido, o resultado da pesquisa
era de se esperar. Os gestores de fundos certamente estão entre os
1% mais ricos da população, que não é território eleitoral fértil para a
esquerda. E seria ridículo não reconhecer que os gestores, como todos os outros
seres humanos, têm suas opiniões políticas.
Por exemplo, esta coluna está desde
dezembro perplexa com o pessoal do mercado que achava que Haddad era
um radical. Hoje não parece haver ninguém que ache isso, mas Haddad não mudou,
o mercado é que se rendeu às evidências.
Aliás, bom lembrar: boa parte da turma que
hoje tem medo de que "Lula não deixe Haddad trabalhar" teve a chance
de eleger Haddad presidente em 2018. Ao invés disso, preferiram votar em um
muambeiro genocida e golpista que quebrou o país e fugiu pra Disney.
Isso não quer dizer, entretanto, que a esquerda e o mercado nunca possam estar de acordo um com o outro, ou que a esquerda não cometa erros que reforçam a percepção ruim do mercado sobre ela.
Bruno Boghossian - Uma oposição doméstica
Folha de S. Paulo
Como não há força consistente de
centro-direita, objeções à política econômica aparecem na esquerda
Quando foi torpedeado por petistas na briga
dos combustíveis, Fernando
Haddad disse que não era nada pessoal. O chefe da equipe
econômica lembrou que Antonio
Palocci também havia passado por maus bocados na primeira
gestão de Lula,
sob críticas de colegas de governo. "Isso é
natural", sentenciou o ministro.
Palocci foi alvo de fogo amigo pesado. Economistas de esquerda diziam que sua equipe tinha infiltrados do mercado financeiro, intelectuais ligados ao PT fizeram um manifesto contra a política econômica e ministros de outras pastas falavam em buscar um plano B (o substituto favorito era Aloizio Mercadante), como conta Thomas Traumann no livro "O Pior Emprego do Mundo".
Luiz Carlos Azedo - Macron vive dias de Thatcher com reforma na França
Correio Braziliense
Ao pretender aumentar por decreto a idade
mínima para a aposentadoria 62 para 64 anos, o presidente francês viu o povo
voltar às ruas para protestar contra a reforma da previdência
Os franceses gostam de resolver suas
contradições nas ruas, desde a Revolução de 1789, que acabou com o Antigo
Regime os privilégios da aristocracia. A Queda da Bastilha, em 14 de julho de
1789, espalhou a revolução por toda a França e mudou a História do Ocidente. Mutualistas
e coletivistas, os trabalhadores franceses voltariam às barricadas em 1871, na
Comuna de Paris, tomando o poder sem estarem preparados para isso. Mesmo assim,
o assalto aos céus passou a ser o objetivo dos trabalhadores europeus, que se
dividiram em duas grandes correntes: a social-democrata e a comunista.
Para a formação dos partidos operários contribuíram as teses do judeu-alemão Karl Marx, sustentadas na Conferência de Londres da I Internacional Socialista, em 1871: “Em sua luta contra o poder reunido das classes possuidoras, o proletariado só pode se apresentar como classe quando constitui a si mesmo num partido político particular, o qual se confronta com todos os partidos anteriores formados pelas classes possuidoras”.
Muniz Sodré* - Graxa em roupa branca
Folha de S. Paulo
Imbróglio das joias das Arábias borra
imagem de rude simplicidade de Bolsonaro
Segundo um aforismo da tradição jeje-nagô,
"quem usa roupa branca não se senta na graxa" (alaosála ki ilo ioko
si-elépo, no original iorubá). Sentido prático: não se pode tocar em sujeira
sem ser descoberto. Bem provável, assim, que o imbróglio das joias das Arábias
venha borrar a pretensa imagem de rude simplicidade do ex-presidente, vendida
aos incautos por redes sociais, políticos de baixa extração e aproveitadores.
O fascínio popularesco por essa imagem, responsável também em outras regiões do mundo pela identificação com personalidades toscas, é análogo ao exercido pelo objeto antigo. Numa análise datada dos anos 70, Jean Baudrillard, crítico dos signos culturais, opõe a funcionalidade dos objetos modernos à natureza mitológica do antigo (em "O Sistema dos Objetos"). Para ele, o objeto arcaico decorativo é puramente mitológico em sua referência ao passado. Ou seja, não tem nenhuma incidência prática, sua única função é significar os índices culturais de uma vida anterior. Dele não se exige utilidade, apenas autenticidade.
Vinicius Torres Freire - Lula entre a China e a breca
Folha de S. Paulo
Presidente pode arrumar a casa antes de
viajar ou deixar país e governo no fogão da crise
No final da semana, Luiz Inácio
Lula da Silva vai à China. A gente espera que não vá à breca. Com
sorte e habilidade, pode driblar a encrenca mundial e nacional. Caso tolere
mais burrices, como as que têm vazado de seu governo, vai viajar deixando uma
panela fervendo no fogo de crises.
A semana que vem poderia ser divertida, não
houvesse tanto risco de desgraça.
Os donos do dinheiro, especialmente os negociantes frenéticos de dinheiro, esperam que o presidente diga algo sobre o plano do que fazer de gastos e dívida, o "arcabouço fiscal" de Fernando Haddad. Caso não diga nada, mande tudo de novo para a prancheta ou vazem mais frituras de Haddad, o caldo engrossa mais.
Já no final da semana que passou, havia gente do Planalto e do PT vazando malícias para os jornais. Não deu para entender ainda se é manobra do gênero "olha, não temos nada a ver com isso" (pacote fiscal de Haddad) e "o presidente está fazendo isso a contragosto". Ou se tentam de fato avacalhar o teto de gastos de Lula, mais flexível ou conversível, mas um limitador de despesa e dívida.
Míriam Leitão - As tempestades no horizonte
O Globo
Com Congresso parado e cenário
internacional turbulento, o ministro Fernando Haddad ainda viverá teste com a
divulgação do arcabouço fiscal
Há crises se formando aqui e no exterior, complicando a vida do governo Lula, que tem que entregar resultados a curto prazo. O Congresso parado é o primeiro desafio do presidente em seu objetivo de reorganizar a administração e aprovar os projetos que marquem a mudança. As MPs enviadas não andaram um milímetro. A queda de braços entre Arthur Lira e Rodrigo Pacheco pode fazer com que elas caduquem. Há outros tremores. Ainda não se sabe a evolução da crise bancária que começou localizada, mas ainda não parou. Os economistas dizem que os recentes abalos não são nada comparáveis à crise de 2008, mesmo assim os bancos perderam globalmente US$ 500 bilhões em valor de mercado em uma semana, segundo cálculos do Financial Times. As ações de resgate estão ficando cada vez mais amplas.
Celso Ming - Contra a inflação, mas não só com juros
O Estado de S. Paulo.
Tantas foram as promessas a respeito da
qualidade do arcabouço fiscal, responsável por substituir o critério do teto de
gastos, que o risco é de que não seja suficientemente confiável e que acabe em
decepção. A conferir.
O governo Lula tem insistido em que não se
pode deter a inflação apenas com a alta dos juros. Nada mais certo. Só não se
vê até agora nenhum passo decisivo nessa direção. Mas vamos ao que poderia ser
feito para ajudar a segurar ou, até mesmo, a derrubar os preços, sem pressionar
demais os juros.
As providências mais importantes escorreriam para o lado fiscal. O presidente Lula não esconde sua resistência a práticas de austeridade fiscal. Para ele, as prioridades são as despesas sociais que aliviem a pobreza e os investimentos em obras públicas que produzam crescimento econômico e emprego. E, no entanto, despesas sociais e investimentos baseados em despesas públicas, sem receitas que lhes correspondam, despejam recursos no mercado e fazem o contrário do que tenta o Banco Central.
Eliane Cantanhêde - Durma-se com um barulho desses
O Estado de S. Paulo
Com PT x PT, Haddad ajusta PAC e vinculações constitucionais na nova âncora fiscal
De boas intenções o inferno está cheio e
elas são irmãs siamesas de “ideias geniais” que pululam em Brasília, animam a
plateia, atiçam interesses e dividem o governo. O presidente Lula virou
mediador entre a “criatividade” de Fernando Haddad, o “esquerdismo” do PT e a
“genialidade” de ministros afoitos.
O pacote fiscal de Haddad empacou na reunião com Lula na sexta-feira, quando Rui Costa (Casa Civil) vocalizou a pressão do PT e de ministros gastadores por “maior amplitude” para obras e investimentos no teto de gastos. Eram 4 a 2: os petistas Lula, Haddad, Costa e Esther Dweck, vinculada ao partido, “contra” os liberais Geraldo Alckmin (PSB, ex-PSDB) e Simone Tebet (MDB). O problema, porém, foi PT contra PT.
Celso Lafer* - Rui Barbosa, no centenário do seu falecimento
O Estado de S. Paulo.
A República lhe deu espaço público para,
como jurista, senador e em duas campanhas presidenciais, defender a verdade
eleitoral, enfrentar a questão social e sustentar o civilismo
Há cem anos falecia Rui Barbosa. Merece
destaque a atualidade de seu legado, que se notabiliza por um fio condutor: “a
formação da esfera pública e a construção institucional da democracia no
Brasil”, como certeiramente realçou Bolívar Lamounier.
A Oração aos Moços foi seu discurso de
paraninfo da turma de 1920 da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco,
onde se formou. Foi o seu balanço de 50 anos de trabalho na jurisprudência e de
serviços à Nação. Enfatizou que não atuou como “político fértil em meios e
manhas”. Empenhou-se em “inculcar ao povo os costumes de liberdade e à
República as leis do bom governo”, que fazem prosperar os Estados, moralizar a
sociedade e honrar as nações.
Rui é um paradigma da atuação dos advogados que souberam valer-se do Direito como instrumento da ação política, como observou Afonso Arinos. Na sua práxis, viveu o Direito não como abstração, mas em função do agir. A autonomia de jurista em relação ao poder é um traço marcante da personalidade de Rui, que não colocou o seu saber para acomodar impulsos arbitrários do pragmatismo de governantes ou justificativas de “razão de estado”.
Cristovam Buarque* - Os esquecidos da anistia
Blog do Noblat / Metrópoles
No mundo letrado, o analfabeto é torturado
todos os minutos em que está desperto. É como se carregasse um chicote elétrico
dentro do cérebro
No seu brilhante e emotivo discurso de
posse, o Ministro Silvio Almeida listou, um por um, os grupos que precisam ter
seus direitos humanos relembrados, afirmando que eles não seriam esquecidos.
Mas não citou aos mais de 10 milhões de brasileiros analfabetos.
Diante da violência da tortura a que foram submetidos os presos políticos no passado, do sofrimento diante do racismo contra os negros e dos preconceitos contra gays e transsexuais, o Brasil esquece a violência cometida contra quem sobrevive no mundo letrado sem saber ler seu próprio idioma: a tortura de caminhar pelas cidades sem ler o nome de cada rua, sem saber o remédio que toma ou o ônibus em que sobe.
O que a mídia pensa - Editoriais / Opiniões
Lula manteve opacidade no Orçamento
O Globo
Mas, com aumento nas emendas de
parlamentares, nem isso lhe garante força para ditar agenda no Congresso
Ao acabar com as emendas do relator,
identificadas pela sigla RP9 no Orçamento da União, o Supremo Tribunal Federal
(STF) acreditou prestar um serviço ao país. No discurso, valorizava a
transparência dando um basta ao esquema de compra de votos que sustentou apoio
parlamentar ao governo Jair Bolsonaro e à alocação de recursos públicos seguindo
critérios paroquiais, não técnicos. Na prática, as brechas continuam abertas.
Os critérios adotados no Orçamento de 2023 desenham um quadro não muito
diferente, quando não pior, do existente sob Bolsonaro.
Para começar, os recursos à disposição dos
congressistas aumentaram. As verbas previstas para 2023 somavam R$ 47 bilhões,
ante emendas de R$ 43,1 bilhões em 2020, R$ 37,1 bilhões em 2021 e R$ 26,2
bilhões em 2022 (em valores corrigidos até 15 de março). Nunca o Orçamento lhes
destinou tanto dinheiro (há dez anos, as emendas giravam ao redor de R$ 15
bilhões).
Metade (R$ 9,8 bilhões) do valor previsto para as banidas emendas do relator foi incorporada às emendas individuais, cuja execução é obrigatória (RP6). Na dotação inicial, o total das RP6s saltou de R$ 11,7 bilhões para R$ 21,5 bilhões. Cada deputado federal teria neste ano R$ 32,5 milhões à disposição, e cada senador R$ 59,8 milhões — antes ambos tinham R$ 19,7 milhões.