quarta-feira, 26 de novembro de 2014

Opinião do dia – Dora Kramer

A senadora Kátia Abreu, indicada para o ministério da Agricultura, em 2007 foi relatora da proposta de derrubada da CPMF na Comissão de Constituição e Justiça.

O fim do imposto do cheque foi a maior derrota do governo Lula, usada na campanha de reeleição de Dilma para acusar Marina Silva e Aécio Neves de terem contribuído para "retirar recursos da saúde".

Dora Kramer, jornalista. O ônus da vitória, O Estado de S. Paulo, 26 de novembro de 2014

Levy deverá assumir logo para iniciar corte de gastos

• Dilma deve dar posse a Levy como titular da Fazenda na sexta-feira, para iniciar ajuste fiscal

Martha Beck, Simone Iglesias, Junia Gama e Catarina Alencastro – O Globo

BRASÍLIA -Diante do forte desgaste da atual equipe econômica e da necessidade de mostrar ao mercado que haverá uma mudança na condução da economia, o Palácio do Planalto decidiu dar posse imediata aos novos ministros, que devem anunciar um conjunto de medidas de ajuste na área fiscal. O anúncio oficial de Joaquim Levy no Ministério da Fazenda; Nelson Barbosa, no Planejamento; e a confirmação de Alexandre Tombini no Banco Central serão feitos amanhã. A posse pode ocorrer na sexta-feira, quando Guido Mantega (Fazenda) e Miriam Belchior (Planejamento) deixarão seus cargos. A presidente Dilma Rousseff passou a tarde de ontem reunida com Levy, Barbosa, Tombini e Aloizio Mercadante (Casa Civil) para discutir o ajuste.

O primeiro sinal que a presidente quer dar ao mercado com o anúncio e posse da nova equipe é que o governo está, de fato, comprometido com uma meta de superávit primário (economia para o pagamento de juros da dívida pública) mais elevada e com o controle de gastos públicos.

Planos de ajuste devem voltar à pauta
Por isso, devem voltar à pauta algumas propostas que foram defendidas por Lula em seu primeiro mandato, mas que sempre foram vistas com reservas por Dilma. Uma delas é a fixação de um limite para o crescimento dos gastos correntes. A medida fazia parte do plano de ajuste fiscal de longo prazo que foi proposto pelo então ministro da Fazenda Antonio Palocci e que foi chamado de "rudimentar" por Dilma, na época na Casa Civil.

Agora, o Palácio do Planalto avalia que o momento é de resgatar o compromisso com o reequilíbrio das contas públicas e a redução da dívida pública. Levy e Barbosa trabalham com o Planalto no plano cujas diretrizes devem ser anunciadas após a posse.

Também devem ser anunciados logo os cargos mais importantes de segundo escalão, como o do Tesouro Nacional. O atual secretário, Arno Augustin, apontado como um dos protagonistas da política fiscal que deteriorou as contas públicas, não deve permanecer no governo.

Além de Levy e Barbosa, também devem ser anunciados logo os nomes do senador Armando Monteiro (PTB-PE) para o Desenvolvimento, e o da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) para a Agricultura. Monteiro esteve ontem na sede do ministério para começar a tomar pé da situação e indicou que pode começar a despachar na segunda-feira.

Na sexta-feira, será divulgado o resultado do Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre. Mantega deve comentar os números em entrevista coletiva, que deve ser a última à frente da Fazenda. Miriam Belchior também sairá, mas deve ser indicada para outra função no governo: é provável que retorne ao Planalto com o Programa de Aceleração do Crescimento. (Colaborou Danilo Fariello)

Levy se reúne com Dilma e prepara pacote fiscal

• Presidente prepara medidas e deve anunciar nos próximos dias Joaquim Levy no lugar de Guido Mantega, Nelson Barbosa para o Planejamento e a manutenção de Alexandre Tombini no BC; Eduarda La Rocque é cotada para assumir o Tesouro

Débora Bergamasco, Tânia Monteiro, João Domingos e Vera Rosa - O Estado DE S. Paulo

BRASÍLIA - A presidente Dilma Rousseff se reuniu nesta terça-feira, 25, com o futuro titular do Ministério da Fazenda, Joaquim Levy, a fim de acelerar a apresentação de um "pacote" de resgate da credibilidade fiscal do governo. A posse da nova equipe econômica, com perfil diferente daquela que atuou no primeiro mandato de Dilma, deverá ocorrer nos próximos dias.

Levy, executivo do Bradesco, quer levar para o Tesouro Nacional a economista Eduarda La Rocque, em substituição a Arno Augustin. Presidente do Instituto Pereira Passos (IPP) da prefeitura carioca, Eduarda é formada na PUC-Rio, cuja escola de economia é símbolo da ortodoxia. Ela já foi casada com Edward Amadeo, ministro do Trabalho e secretário de política econômica do governo Fernando Henrique Cardoso. Antes de assumir o IPP, comandou a Secretaria da Fazenda da gestão Eduardo Paes (PMDB) no Rio de Janeiro.

Complemento. Mais dois nomes devem compor a nova equipe econômica de Dilma: Alexandre Tombini, que será mantido no comando do Banco Central, e Nelson Barbosa, que vai assumir o Ministério do Planejamento. Dilma planeja indicar Arno para a presidência da Itaipu Binacional.

Nas áreas não econômicas, a presidente decidiu manter José Eduardo Cardozo no Ministério da Justiça e é provável que Arthur Chioro continue na Saúde. Curinga na equipe, o governador da Bahia, Jaques Wagner, pode ocupar Comunicações, no lugar de Paulo Bernardo. Miriam Belchior, atualmente no Planejamento, tem chance de ir para Minas e Energia, pasta hoje dirigida por Edson Lobão (PMDB) - que teve o nome envolvido na Operação Lava Jato.

Aliados. Com cinco ministérios, o PMDB já começa a reclamar da perda de espaço na equipe. Nem a sigla e nem o PT gostaram da indicação da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) para o Ministério da Agricultura. Na tentativa de contornar o mal-estar, a ordem no PT é dizer agora que Kátia Abreu vai dirigir um ministério para cuidar do agronegócio, enquanto os petistas manterão Desenvolvimento Agrário para fazer a reforma no setor.

Mas sem ter um contra-argumento convincente, e receoso de prejudicar nomes preferidos pela cúpula do partido para a Esplanada, o PMDB decidiu não mais brigar contra o convite da presidente a Kátia Abreu. A partir de agora, o partido vai esquecer Kátia e lutar para fazer do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN), o novo ministro do Turismo, além de influenciar na nomeação do deputado Elizeu Padilha (RS) para algum lugar na equipe do governo.

O partido quer manter ainda o ministro Moreira Franco à frente da Aviação Civil, além de, quando for a hora, dizer a Dilma que seria bom para a manutenção da base aliada e para a governabilidade as escolhas do líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), e do líder do governo no Senado, Eduardo Braga (AM) para algum ministério. Estes dois últimos disputaram os governos de seus Estados e perderam a eleição. Esperam ser compensados pela fidelidade.

Dilma, porém, já deixou claro que não deseja abrigar derrotados, à exceção do senador e ex-presidente da Confederação Nacional da Indústria Armando Monteiro (PTB), que disputou o governo de Pernambuco, perdeu no 1.º turno e acabou com a pasta da Indústria, Desenvolvimento e Comércio Exterior. É uma forma de se aproximar dos setores produtivos, argumento também para o convite a Kátia Abreu, que é presidente da Confederação Nacional da Agricultura.

Dilma prepara volta de tributo da gasolina

• Medida, apresentada por Mantega, integra pacote para equilibrar caixa do governo e será discutida com nova equipe

• Joaquim Levy, que será anunciado como novo ministro da Fazenda nesta quinta, reuniu-se com a presidente ontem

Valdo Cruz, Andréia Sadi – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA - A volta da cobrança da Cide (contribuição para regular o preço dos combustíveis) faz parte do pacote fechado pelo ministro Guido Mantega (Fazenda) e apresentado ontem à presidente Dilma Rousseff com medidas para reequilibrar as contas públicas.

Segundo a Folha apurou, a decisão final será tomada em reunião da presidente com a nova equipe econômica. Nesta terça (25), ela recebeu no Planalto o futuro ministro da Fazenda, Joaquim Levy, e o novo ministro do Planejamento, Nelson Barbosa.

Na reunião, da qual participaram Alexandre Tombini --que será mantido no cargo como presidente do BC-- e Aloizio Mercadante (Casa Civil), foram discutidas as novas medidas e a futura equipe econômica.

Os nomes ainda não foram anunciados porque Dilma queria esperar a aprovação, pelo Congresso, de autorização para que o governo descumpra a meta fiscal deste ano. O projeto ainda não passou pelo plenário.

Além da Cide, o plano inclui propostas de redução de despesas com seguro-desemprego, abono salarial e pensão pós-morte. As duas primeiras atingem cerca de R$ 45 bilhões por ano.

Valor incerto
Técnicos disseram à Folha que a proposta de retorno da Cide tem cenários com recomposição parcial ou integral do valor que era cobrado em 2008 --R$ 0,28 por litro de gasolina e R$ 0,07 por litro de diesel. A tendência, caso a medida seja aprovada, é fazer uma volta parcial.

A contribuição, que foi sendo reduzida ao longo dos últimos anos e zerada em 2012 para segurar os preços dos combustíveis, pode gerar cerca de R$ 14 bilhões de receita por ano se cobrada em seu maior valor.

Além de reforçar o caixa do governo federal, que está no vermelho, a volta da Cide é uma reivindicação do setor de etanol para tornar o combustível mais competitivo.

Levy em Brasília
Levy e Barbosa estavam ontem a Brasília para reuniões com a presidente Dilma a fim de fechar as linhas gerais das medidas que devem ser divulgadas no anúncio oficial da nova equipe, nesta quinta-feira (27).

Mantega deve se despedir de sua equipe já na sexta, embora a transmissão do cargo possa ficar para a segunda.

Dilma está fechando também a escolha de outros nomes da equipe econômica.

No Tesouro Nacional, são cotados Tarcisio Godoy, que foi secretário-adjunto do órgão quando foi chefiado por Joaquim Levy no governo Lula, e Carlos Hamilton, diretor de Política Econômica do BC.

No BNDES, Luciano Coutinho pode ficar mais um ano. Para a presidência do BB, ela analisa os nomes de Paulo Cafarelli --hoje secretário-executivo da Fazenda-- e do vice-presidente do banco Alexandre Abreu. Na Caixa, Jorge Hereda deve continuar no comando da instituição.

Lava-Jato condiciona formação do governo

Rosângela Bittar, Raymundo Costa e Cristiano Romero - Valor Econômico

BRASÍLIA E SÃO PAULO - Preocupada com os impactos ainda desconhecidos da operação Lava-Jato sobre a classe política, especialmente em sua base aliada, a presidente Dilma Rousseff pretende começar a distribuir cargos apenas em meados de dezembro, ou somente em janeiro ou fevereiro, quando ficar claro quem será atingido pelas delações no escândalo da Petrobras.

A presidente pretende, também, manter no cargo o atual ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. O objetivo é não mexer na linha de comando das instituições que estão apurando o caso de corrupção. Por esse motivo, ela também não mudará a direção da Polícia Federal, responsável pelas investigações da Lava-Jato ao lado do Ministério Público.

Dilma decidiu, ainda, manter Graça Foster na presidência da Petrobras, apesar dos rumores de que, por causa do escândalo, ela seria substituída junto com todos os diretores da estatal.

Amanhã, a presidente anuncia a nova equipe econômica. A decisão de começar a mudança do ministério por essa área decorreu da intenção do governo de enviar forte sinalização ao mercado de que os principais problemas da economia serão atacados imediatamente. Os novos ministros - Joaquim Levy, da Fazenda, e Nelson Barbosa, do Planejamento - assumirão antes da posse, em 1º de janeiro, ao contrário dos demais ministros.

Quando fez o convite a Joaquim Levy, a presidente assegurou que ele terá autonomia para pôr em prática as políticas que julgar necessárias para a reorganização das contas públicas e o combate à inflação. A conversa animou Levy e foi crucial para que ele aceitasse o cargo.

A decisão da presidente mostra que ela estaria convencida de que precisa mudar seu estilo centralizador, pelo menos na área econômica. "Ela percebeu que é melhor dar autonomia à equipe econômica", comentou um importante aliado.

Aécio: Indicar Levy para a Fazenda é como convidar um grande quadro da CIA para dirigir a KGB

• Tucano repete frase de Armínio Fraga, que coordenou programa do PSDB

Maria Lima – O Globo

BRASÍLIA - De volta a Brasília para acompanhar a votação do projeto de lei que modifica a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para acomodar o rombo nas contas públicas, o presidente do PSDB, senador Aécio Neves, ironizou as reações dos partidos de esquerda à indicação do economista Joaquim Levy para comandar o Ministério da Fazenda, pela presidente Dilma Rousseff. Mesmo defendendo a escolha que virou motivo de piada entre os tucanos, o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), e o ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, garantem que “quem vai mandar” é a presidente Dilma Rousseff.

Ao comentar a indicação e a dificuldade do PT em assimilar o perfil liberal de Levy, que colaborou ativamente na campanha tucana, Aécio repetiu uma frase dita nesta terça-feira pela manhã pelo economista Armínio Fraga:

— Como disse oportunamente meu amigo Armínio Fraga, escolher Joaquim Levy para comandar o Ministério da Fazenda no governo do PT, é o mesmo que convidar um grande quadro da CIA para dirigir a KGB — brincou Aécio.

Além de participar de manifestações pró-Aécio na campanha presidencial, Joaquim Levy trabalhou na equipe de Armínio Fraga, que coordenou o programa de governo do candidato tucano e gerou críticas pesadas de Dilma, dizendo que iria gerar arrocho salarial e desemprego.

— O Joaquim trabalhou ativamente na equipe do Armínio e estaria seguramente na equipe de Aécio, não como ministro — disse um líder tucano.

A indicação de Levy tem sido defendida publicamente, mas internamente, tem causado grande insatisfação no PT e nos partidos de esquerda da base.

— Eu defendo muito o Joaquim Levy. Mas não sei em que condições ele vai trabalhar — disse Aécio, ao comentar declarações de Humberto Costa e Carvalho de que é Dilma quem irá mandar.

Intelectuais e ativistas criam manifesto pedindo coerência de Dilma

• Iniciativa criada por apoiadores da presidente durante as eleições critica as indicações de Joaquim Levy e Kátia Abreu para assumir ministérios e pede maior participação social

Ricardo Galhardo e Ricardo Chapola - O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - Intelectuais de esquerda e representantes de movimentos sociais que tiveram papel decisivo na reeleição de Dilma Rousseff criaram um abaixo-assinado online no qual cobram da presidente coerência entre o discurso de campanha e as práticas de governo. Os principais alvos são a senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), indicada para o Ministério da Agricultura, e o ex-secretário do Tesouro Joaquim Levy, virtual ministro da Fazenda. Com mais de 2500 adesões até a tarde desta terça-feira, 25, o texto da petição diz que as escolhas "sinalizam uma regressão".

"Os rumores de indicação de Joaquim Levy e Kátia Abreu para o Ministério sinalizam uma regressão da agenda vitoriosa nas urnas. Ambos são conhecidos pela solução conservadora e excludente do problema fiscal e pela defesa sistemática dos latifundiários contra o meio ambiente e os direitos de trabalhadores e comunidades indígenas", diz a petição, que também exige a participação social na escolha dos novos ministros.

Nenhum dos dois nomes foi oficializado pelo governo federal. O anúncio dos novos ministros deve ocorrer na semana que vem. A indicação de Kátia Abreu sofre resistências do próprio PMDB, que prefere um nome ligado à bancada do partido na Câmara e contabiliza a possível nomeação da senadora na cota pessoal da presidente.

"As propostas de governo foram anunciadas claramente na campanha presidencial e apontaram para a ampliação dos direitos dos trabalhadores e não para a regressão social. A sociedade civil não pode ser surpreendida depois das eleições e tem o direito de participar ativamente na definição dos rumos do governo que elegeu".

Segundo o texto, no "terceiro turno" das eleições iniciado pela oposição, Dilma é acusada pela falta de diálogo com as forças que a elegeram.

"A oposição não deu tréguas depois das eleições, buscando realizar um terceiro turno em que seu programa saísse vitorioso. A presidenta eleita parece levar mais em conta as forças cujo representante derrotou do que dialogar com as forças que a elegeram", subscrevem os descontentes com as indicações feitas pela presidente.

O manifesto conta com apoio de nomes e entidades que tiveram papel importante na campanha como o teólogo Leonardo Boff, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, o coordenador do Movimento dos Sem Terra João Pedro Stédile e o cientista político André Singer, porta-voz da Presidência no governo Luiz Inácio Lula da Silva.

Intelectuais e ativistas lançam manifesto contra Levy e Kátia

• Para grupo, indicação dos ministros é "regressão da agenda vitoriosa"

- O Globo

RIO e BRASÍLIA -Um grupo de intelectuais e ativistas de movimentos sociais que apoiaram a reeleição da presidente Dilma Rousseff divulgaram um manifesto em que apontam como uma "regressão da agenda vitoriosa nas urnas" os rumores da indicação de Joaquim Levy e Kátia Abreu para os ministérios da Fazenda e da Agricultura, respectivamente.

Encabeçado pelo economista Luiz Gonzaga Belluzzo, pelo líder do MST, João Pedro Stédile, e pelo teólogo Leonardo Boff, o manifesto afirma que a oposição não deu tréguas após a derrota nas eleições, "buscando realizar um terceiro turno em que seu programa saísse vitorioso". E diz que a presidente Dilma "parece levar mais em conta as forças cujo representante derrotou do que dialogar com as forças que a elegeram".

Participação social é cobrada
"Os rumores de indicação de Joaquim Levy e Kátia Abreu para o Ministério sinalizam uma regressão da agenda vitoriosa nas urnas. Ambos são conhecidos pela solução conservadora e excludente do problema fiscal e pela defesa sistemática dos latifundiários contra o meio ambiente e os direitos de trabalhadores e comunidades indígenas", diz o manifesto.

O texto cobra uma participação da sociedade civil nos rumos do governo: "As propostas de governo foram anunciadas claramente na campanha presidencial e apontaram para a ampliação dos direitos dos trabalhadores e não para a regressão social. A sociedade civil não pode ser surpreendida depois das eleições e tem o direito de participar ativamente na definição dos rumos do governo que elegeu".

O manifesto, com mais de 60 assinaturas, também é endossado por André Singer, que foi porta-voz do ex-presidente Lula, pelo petista Valter Pomar, da corrente Articulação de Esquerda, minoritária no partido, e por entidades como MST e Rede Ecumênica da Juventude.

Senadores do PT manifestaram preocupação ontem, em reunião da bancada, com a insatisfação da base do partido diante da indicação de Levy e Kátia Abreu.

De acordo com participantes da reunião, a apreensão é com a militância que foi para a rua no segundo turno da campanha presidencial, em um movimento comparado pelos petistas com a eleição de 1989. O temor é que Dilma coloque tudo a perder justamente no momento em que o partido estava tentando capitalizar essa mobilização para respaldar seu segundo mandato e impor uma agenda, depois de uma disputa acirrada.

Na reunião da bancada, houve um embate entre os senadores Lindbergh Farias (RJ) e Gleisi Hoffmann (PR) por causa da indicação de Kátia Abreu. Lindbergh criticou, segundo pessoas presentes, a escolha da presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), e foi contraditado por Gleisi, ex-ministra da Casa Civil de Dilma.

- Tem uma rebelião na base do partido, é só ver as redes sociais. Ela é um símbolo muito ruim - disse Lindbergh, segundo relatos da reunião.

Gleisi defendeu a indicação, destacando o apoio de Kátia à reeleição de Dilma, enquanto nomes como Roberto Rodrigues, ministro da Agricultura na gestão de Lula, apoiou o candidato do PSDB, Aécio Neves.

- Ela foi a única liderança do setor do agronegócio que apoiou a presidente e reconheceu os avanços do governo Dilma, como crédito farto. Ela participou do lançamento dos três últimos Planos Safra fazendo discurso no Planalto - disse Gleisi, de acordo com senadores do PT.

Gilberto defende presidente
O partido gostaria de ser ouvido pela presidente na montagem da nova equipe. No dia seguinte ao segundo turno, o presidente do PT, Rui Falcão, afirmou que o partido aceitava que o substituto do ministro Guido Mantega (Fazenda) fosse de fora do partido, desde que mantivesse a atual linha econômica, "sem se pautar pelo mercado financeiro". Joaquim Levy dirige há quatro anos a área de gestão de ativos do Bradesco.

O ministro Gilberto Carvalho (Secretaria Geral) saiu ontem em defesa de Dilma e disse que, independentemente da equipe a ser montada, a presidente "continuará governando para os mais pobres". Em discurso no 2º Encontro de Povos e Comunidades Tradicionais, Gilberto Carvalho pediu que a "ancestralidade" dos participantes abençoasse a presidente na reforma ministerial:

- Quero pedir a bênção, pedir que a ancestralidade que vocês aqui representam abençoe a presidente Dilma e todos nós, neste momento tão importante que o país está atravessando, em que a presidente começa a montar sua equipe.

João Bosco Rabello - Recuo improvável

- O Estado de S. Paulo

A presidente Dilma Rousseff atravessa agora a etapa da reação da base aliada, mais especificamente do PT e do PMDB, às nomeações não anunciadas oficialmente, mas confirmadas extra-oficialmente, para a área econômica e do ministério da Agricultura para seu segundo mandato.

São reações esperadas, talvez mais aguerridas pela falta de aviso pévio da presidente. O que sinaliza também para a orientação aplicada a essa etapa: são nomes que ela não admite discutir no contexto das negociações para ocupação do ministério.

Nesse caso, as decisões da presidente não poderão sofrer recuo, sob pena de uma demonstração de vulnerabilidade diante da pressão de uma base parlamentar que precisa se submeter às circunstâncias de crise que marcam o início do segundo mandato.

A receita para a economia é ortodoxa, o que impõe um perfil ortodoxo para a sua condução e que torna a discussão sobre conservadorismo e desenvolvimentismo inútil no presente. A nomeação de Nelson Barbosa para o Planejamento, é, nesse sentido, um contraponto aceitável para Joaquim Levy , que terá com ele uma interlocução com um desenvolvimentista.

A outra nomeação, da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO), para a Agricultura, é mais fácil de compor com o PT do que com o PMDB. Para compensar o PT, este terá Miguel Rosseto na Secretaria-Geral da Presidência, entre outros.

A reação maior a Kátia é do PMDB – e não pelos motivos até aqui arrolados pelo partido: sua condição de “neo-peemedebista”, ou sua suposta indiferença com a agricultura familiar. A reação se deve à inconformação do partido com a perda de um feudo que domina há muitos anos, sem eficiência e, não raras vezes, com escândalos, como o que retirou de cena o ex-ministro da pasta, Wagner Rossi.

Anunciada mesmo extraoficialmente, Kátia deve ficar com o ministério. Voltar atrás para Dilma seria mais que ceder a uma reclamação da base: seria capitular diante do líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), com quem trava renitente duelo e cuja candidatura à presidência da Câmara desafia a liderança da presidente sobre a base.

Já de outras vezes, ficou claro que o líder do PMDB não abre mão da influência do partido para os cargos da Agricultura, a começar pela cadeira do ministro. O faz legitimamente e com aval da bancada, mas uma vez tendo a presidente dado o passo sem consulta ao partido – ao que tudo indica, mesmo ao vice Michel Temer -, estabeleceu o fato consumado.

Dilma pretende redimensionar o papel do ministério da Agricultura, podendo mesmo fazer retornar à Pasta a Secretaria da pesca, hoje com status de ministério, mergulhada em ineficiência e com problemas legais como o da distribuição de benefícios para muito além dos pescadores.

O ministério será caracterizado como gestor de um segmento da economia que mais contribui para o PIB nacional. Precisará ser visto como fomento da alimentação interna e externa, com um pé nas pesquisas, via Embrapa, e outro na infraestrutura, que o liga, pelos interesses do setor, aos meios de distribuição da produção.

A etapa posterior à da reação deverá comprometer a presidente com um esquema de compensação ao PMDB que, segundo o vice-presidente Michel Temer, responsável pela filiação de Kátia Abreu ao partido, se dará durante o mês de dezembro.

A escolha de Joaquim Levy para a Fazenda também parece irreversível, a menos que se admita uma derroita presidencial antes de começar o segundo mandato -e, pior, para a própria base de sustentação. A repercussão positiva de Levy na Fazenda já se fez sentir com as reações favoráveis do mercado e de renomados economistas.

O próprio PT exibe uma crítica quase burocrática, já substituída pelas manifestações e apoio de suas lideranças no Senado. Além disso, o ex-presidente Lula é o fator moderador no contexto – ele mesmo um defensor da nomeação de um perfil ortodoxo para a Pasta, que fazia recair no ex-presidente do Banco central, Henrique Meirelles.

Joaquim Levy é uma nomeação que neutraliza, em parte, o discurso oposicionista de irresponsabilidade do governo na condução da economia daqui em diante. Sua presença no governo atende ao receituário que o PSDB pregou na campanha, o que rende o discurso de estelionato eleitoral, mas na prática cria uma dificuldade para a oposição.

Corrupção na Petrobras choca STJ

'Roubalheira' sem precedentes

• Ao julgar recurso da Lava-Jato, ministros do STJ fazem fortes críticas à corrupção na Petrobras

Eduardo Barretto – O Globo

BRASÍLIA - O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Newton Trisotto, relator do julgamento ontem que manteve preso homem apontado pela Polícia Federal (PF) como operador do doleiro Alberto Youssef no exterior, afirmou, durante a sessão, que a corrupção brasileira é "uma das maiores vergonhas da Humanidade". Já o ministro Felix Fischer cogitou que nenhum outro país viveu "tamanha roubalheira", referindo-se ao escândalo na Petrobras investigado pela Operação Lava-Jato, da PF.

A 5ª Turma da Corte decidiu por unanimidade manter a prisão de João Procópio de Almeida Prado, após decisões do mesmo tribunal e do Supremo Tribunal Federal (STF) na mesma direção.

- A corrupção no Brasil é uma das maiores vergonhas da Humanidade - afirmou Trisotto, numa sessão de discursos fortes.

O ministro também ressaltou a extensão que está tomando a Lava-Jato, ao revelar cifras bilionárias desviadas.

Além dos dois ministros, o subprocurador da República Brasilino Pereira dos Santos usou termos pesados ao se referir ao escândalo e falou em "quadrilha". Para Brasilino, o bordão "O petróleo é nosso" - de campanha no final da década de 40 pela autonomia brasileira nesse campo - poderia se transformar, frente à corrupção na estatal, em "O petróleo é deles". O subprocurador citou um "laranjeiral" (sic) para quantificar as operações do esquema. João Procópio seria apenas uma parte, como as investigações da PF mostram. Além de uma mudança no antigo slogan, Brasilino sugeriu também que fosse modificado o nome da Petrobras.

- A gente poderia até sugerir: em vez de Petróleo Brasileiro, seria Petróleo Mundial. É um volume de negócios muito grande, e me parece que esta quadrilha que se apossou da Petrobras está conseguindo destruir esse patrimônio. A gente pode até inverter essa cláusula, esse ditado que na Petrobras, o petróleo é nosso. Não é. É deles. Desse pessoal aí e de um tal de Alberto Youssef, que surge aqui com o seu comandado, o seu João Procópio, e uma miríada de empresas para as quais estão sendo vazados esses recursos. E o curioso é que essas empresas se situam lá longe, na Suíça, nos conhecidos paraísos fiscais. Através de um "laranjeiral" (sic), vamos dizer assim, tantas empresas laranjas para esconder patrimônio público - disse o subprocurador.

O ministro Felix Fischer, ex-presidente do STJ, classificou a corrupção no Brasil entre as maiores do planeta.

- Acho que nenhum outro país viveu tamanha roubalheira - afirmou.

A defesa de Procópio - apontado como homem de confiança de Youssef fora do Brasil, e preso em julho - alegou que a prisão havia sido cumprida sem requisitos legais e que, por isso, deveria ser revogada. Procópio teria, com Iara Galdino da Silva, apontada como outra laranja, escritórios em São Paulo que gerenciavam contas de Youssef fora do Brasil, entre elas uma conta de US$ 5 milhões na Suíça, em nome do doleiro.

- Pelo valor das evoluções, algo gravíssimo aconteceu - disse Trisotto.

Acompanhado pelos outros ministros, Trisotto negou a tese da defesa de prisão ilegal, e qualificou o papel de Procópio no esquema como fundamental:

- Procópio assumia papel relevante no esquema, controlava contas de Youssef no exterior. Foi fundamental para controlar dinheiro de origem ilícita - disse o relator.

Com a decisão unânime, o STJ reforçou a posição do juiz federal Sérgio Moro, que conduz a Lava-Jato e vem sofrendo duros ataques de advogados.

O nome de Procópio ainda está envolvido em negócios de Youssef com empresas de energia, já que essa investigação da PF começou com a apreensão de uma planilha de custos da obra da Usina Hidrelétrica de Jirau no escritório de Youssef. O documento estava com Procópio.

No começo deste mês, o suposto laranja de Youssef - como aponta a PF - teve o pedido de habeas corpus negado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em decisão do ministro Teori Zavascki. O argumento da defesa de Procópio era o de que ele necessitava de tratamento médico (neurologista e cardiologista), já que havia sofrido um acidente vascular cerebral há dois anos. Teori justificou que a análise não competia ao STF, já que no STJ o pedido já havia sido derrubado, decisão que se repetiu ontem.

Processo não trata de corrupção de políticos, diz juiz

• Sérgio Moro chama de 'fantasiosa' tese da defesa de executivo de que oculta nomes para manter sob sua tutela as investigações da Lava Jato

Ricardo Brandt, Mateus Coutinho - O Estado de S. Paulo

O juiz federal Sérgio Moro, que conduz os processos da Operação Lava Jato, classificou ontem como "fantasiosa a argumentação" de advogados das empreiteiras de que estaria "ocultando o nome de agentes políticos envolvidos nos crimes" para manter sob sua tutela as investigações.

Moro também destacou que a ação que tramita na Justiça Federal no Paraná não envolve crime de corrupção de agentes políticos. A Lava Jato apura acusações e suspeitas de cartel, corrupção e propina na Petrobrás. As defesas dos 11 executivos das maiores empreiteiras do País tentam tirar o caso da Justiça Federal no Paraná.

Em reclamação ao Supremo Tribunal Federal, a defesa de Gerson Mello Almada, vice-presidente da Engevix Engenharia - uma das empresas do "clube" da propina, segundo a Polícia Federal -, argumentou que, ao proibir a citação de políticos nos interrogatórios dos acusados, Moro "usurpou da competência do STF". O advogado Fábio Tofic Simantob argumenta que o juiz federal no Paraná cindiu as investigações quando se deparou com indícios de cometimento de crime por autoridades com prerrogativa de foro, notadamente o deputado federal André Vargas, então no PT, "sem submeter a questão ao Supremo".

Parlamentares federais possuem o chamado foro privilegiado e só podem ser investigados pela Corte. A reclamação individual de Almada é endossada por outras defesas das empreiteiras. O ministro do Supremo Teori Zavascki encaminhou os questionamentos a Moro.

"O objeto deste processo não envolve o crime de corrupção de agentes políticos, mas sim crimes licitatórios, de lavagem e, quanto à corrupção, apenas dos agentes da Petrobrás", diz Moro em seu despacho. "Não há agentes políticos aqui investigados, nem haverá, perante este Juízo."

O magistrado disse que se o dinheiro desviado da Petrobrás foi, depois de lavado, usado para pagar vantagem indevida a agentes políticos, trata-se de outro crime. Ele observou que as delações premiadas firmadas no âmbito da Lava Jato - e na qual políticos foram citados - foram encaminhadas ao Supremo. "Quanto a eventuais crimes de corrupção de agentes políticos, estes são de competência do Supremo Tribunal Federal e que já dispõe das provas pertinentes da colaboração premiada."

Sigilo. Sérgio Moro afirmou que a orientação para que os depoentes não indicassem, em audiência, o nome de políticos visa a preservar a autoridade do Supremo, que quer manter as investigações em sigilo.

"Não caberia a este Juízo violar a autoridade da decisão do Supremo permitindo que o nome dos supostos agentes políticos fosse (...) revelado."

Acusações de ilegalidades são 'fantasiosas', diz juiz

• Sergio Moro rebate advogados da Lava Jato e nega estratégias ilícitas

• Defensores de empreiteiros reclamam de que juiz usa prisões para forçar acordos de delação premiada

Rubens Valente, Gabriel Mascarenhas, Severino Motta e Mario Cesar Carvalho – Folha de S. Paulo

BRASÍLIA, SÃO PAULO - O juiz federal Sergio Moro, um dos responsáveis pelas investigações da Operação Lava Jato, classificou de "fantasiosa" a acusação de advogados das empreiteiras de que teria adotado estratégias ilícitas para evitar que o caso seja deslocado para o STF (Supremo Tribunal Federal).

Entre essas estratégias estaria o veto aos réus de mencionar nomes de parlamentares, que só podem ser investigados pelo Supremo porque têm foro privilegiado. O juiz também foi acusado de dispor de provas secretas e de usar as prisões para forçar acordos de delação premiada.

A acusações contra Moro foram feitas pelos advogados Alberto Toron, em entrevista à Folha, e Fabio Tofic Simantob, em reclamação ao Supremo. Eles defendem a UTC e a Engevix, respectivamente.

Toron reclamou que, sem ter acesso ao conteúdo das delações de Alberto Youssef, do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e de outros executivos, os presos pela Operação Lava Jato no último dia 14, sobretudo diretores de empreiteiras, têm o seu direito de defesa cerceado porque não conhecem todas as acusações.

Segundo o juiz, os nomes dos políticos não podem ser citados "para preservar a autoridade da decisão da Suprema Corte". As delações mencionam mais de 50 políticos, segundo a Folha apurou. A citação do nome de um deles poderia anular o processo.

Moro diz no despacho desta terça-feira (25) que a delação foi "uma escolha voluntária" dos réus, sem relação alguma com as prisões. Sobre o acesso aos acordos de delação, que Toron chamou de "provas secretas", o juiz diz que essa questão está sob análise da Procuradoria-Geral da República e do STF.

O juiz voltou a negar que há políticos sob investigação. "O objeto desse processo não envolve o crime de corrupção de agentes políticos, mas sim crime licitatórios, de lavagem e, quanto à corrupção, apenas de agentes da Petrobras."

Dois ex-ministros do STF e especialistas nesta corte ouvidos pela Folhaafirmam não ver ilegalidades na conduta do juiz federal.

"Não vejo irregularidades. O envolvido responde ao que o juiz indaga", disse àFolha o ex-ministro do Supremo Carlos Velloso. Segundo ele, "a situação está correndo dentro da normalidade".

Outro ex-ministro do Supremo, Ayres Britto, disse que "enquanto o STF não avocar os processos, o juiz deve seguir como está procedendo". Pesquisador das ações do Supremo, Oscar Vilhena Vieira, diretor do curso de direito da Fundação Getulio Vargas em São Paulo, afirmou: "O juiz não está agindo de maneira arbitrária. A princípio, ele segue o posicionamento mais recente do Supremo".

Para Vilhena, o próprio Supremo minimizaria essas polêmicas se tivesse estabelecido "critérios claros para que os juízes possam atuar".

Para Luís Henrique Alves Machado, doutorando em direito processual pela Universidade Humboldt de Berlim, na Alemanha, o ideal seria o STF analisar o processo "em toda sua integralidade, até para evitar eventual contradição em decisões".

Ele, no entanto, considera a hipótese pouco provável, tendo em vista a "experiência traumática" do julgamento do mensalão, que praticamente paralisou as atividades do tribunal por meses para a análise de um único processo.

Moro nega que esteja ocultando nomes de políticos

• Segundo o juiz responsável pela operação Lava-Jato, esta investigação está no Supremo

Germano Oliveira - O Globo

SÃO PAULO - O juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal do Paraná, disse ontem "ser fantasiosa" a argumentação de que oculta nomes de políticos nos crimes da Operação Lava-Jato, para preservar sua competência no processo. A afirmação consta de despacho no processo em que empreiteiras do país respondem por fraude na Petrobras.

Os advogados das empreiteiras pediram ao juiz acesso aos depoimentos de Paulo Roberto Costa, ex-diretor de Abastecimento da Petrobras, e do doleiro Alberto Youssef, feitos ao Supremo Tribunal Federal (STF). Os dois prestaram depoimentos num acordo de delação premiada. O juiz crê que o os advogados desejam tirar de sua esfera a investigação da Lava-Jato, remetendo todo o processo ao STF.

"O objeto deste processo não envolve o crime de corrupção de políticos, mas sim crimes licitatórios, de lavagem e, quanto à corrupção, apenas dos agentes da Petrobras. Se o dinheiro supostamente desviado da Petrobras foi, depois de lavado, usado para pagar vantagem indevida a agentes políticos, trata-se de outro crime que não é objeto deste feito", diz o juiz.

Sem agentes políticos investigados
Moro frisa: "Não há agentes políticos aqui investigados, nem haverá, perante este Juízo, ação penal tendo no polo passivo agentes políticos (...) Quanto a eventuais crimes de corrupção de políticos, estes são de competência do STF e que já dispõe das provas pertinentes da colaboração premiada".

Segundo Moro, o sigilo decretado nos depoimentos em delação premiada de Costa ao STF parte do próprio STF: "A orientação realizada por este julgador na ação penal, para que os depoentes não indicassem, em audiência, o nome de políticos visou, a toda evidência, não esconder o fato da possível ocorrência de crimes da espécie, ou seja, corrupção de agentes políticos (...). Se os eventuais crimes de corrupção de políticos estão sendo apurados no STF - que, aliás, dispõe das provas e não este Juízo, e se aquela Suprema Corte decidiu por manter o sigilo sobre aquelas provas, então não caberia a este Juízo violar a autoridade da decisão do Supremo", diz Moro. 

Caso Rosemary: 2 anos sem punições

Escândalos em série

• Dez acusados de vender pareceres em órgãos públicos mantêm empregos no governo

Sérgio Roxo – O Globo

SÃO PAULO - Dois anos depois de ter sido um dos principais alvos da Operação Porto Seguro, deflagrada pela Polícia Federal e pelo Ministério Público Federal, a ex-chefe do escritório da Presidência da República em São Paulo Rosemary Noronha mantém mistério sobre a sua vida profissional. A amiga do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não revela como tem se sustentado. Sua família inaugurou, no início do ano, uma escola de inglês para crianças em bairro nobre de São José dos Campos (SP), no Vale do Paraíba. Até hoje, não houve punição a nenhum dos 24 citados no escândalo, e dez deles mantêm seus cargos no governo federal, com salários de R$ 3,9 mil a R$ 21,4 mil.

Durante as investigações que levaram à descoberta da quadrilha que vendia pareces em órgãos públicos federais, foi constatado que Rosemary e o ex-diretor da Agência Nacional de Águas (ANA) Paulo Vieira planejavam abrir uma escola de inglês. A Red Ballon, já aberta, está em nome de Meline e Mirelle, as duas filhas de Rosemary, e de seu ex-marido, José Claudio de Noronha, também acusado de participar do esquema.

Meline, que seria a responsável pela escola, se recusou, semana passada, a conversar com O GLOBO. No dia da operação, em novembro de 2012, foi determinado a policiais federais que cumpriram mandado de busca e apreensão no apartamento da outra filha de Rosemary, Mirelle, que buscassem documentos relacionados à escola.

O advogado de Rose, Celso Vilardi, informou que não faria comentários sobre o funcionamento da escola.

- A empresa foi aberta e está devidamente declarada por seus donos. Minha cliente não tem nada a ver com isso - afirmou o defensor, ao ser questionado sobre a coincidência entre os planos de Rose descobertos durante as investigações da PF e do MPF e a instalação da unidade pelos parentes da ex-chefe do escritório da Presidência.

Vilardi também não quis revelar se Rosemary, exonerada logo após a operação, exerce alguma atividade profissional.

Rosemary foi a única dos servidores públicos citados na Operação Porto Seguro a receber punição administrativa da Controladoria Geral da União (CGU) até o momento. Em setembro do ano passado, o órgão apontou 11 irregularidades na conduta dela à frente do escritório da Presidência em São Paulo, e, assim, determinou que ela não pode voltar a ocupar cargos públicos.

Outros dez servidores apontados como participantes do esquema, entre eles Paulo Vieira, continuam a manter seus empregos, apesar de exonerados das funções comissionadas que ocupavam na época. Os processos administrativos disciplinares (PADs), que poderiam levar à perda da função pública desses funcionários, ainda estão em andamento. A Controladoria Geral da União (CGU) culpa as ações judiciais apresentadas pelos servidores para brecar as apurações como responsáveis pela demora na conclusão dos procedimentos.

Os processos judiciais também ainda estão em fase de apresentação de provas e defesa. A denúncia criminal contra os acusados, apesar de ter sido apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF) menos de um mês depois da deflagração da operação, só foi aceita pela Justiça em fevereiro deste ano. Como há servidores públicos envolvidos, foi permitido que os acusados apresentassem defesa prévia, o que adiou a decisão do juiz. Dos 24 denunciados, 20 foram transformados em réus. A outros quatro, responsabilizados por crimes menores, foi proposta transição penal, que permite a extinção da ação em troca de cumprimento de serviços comunitários.

Rosemary e José Claudio de Noronha, respondem a um processo criminal. Ela é ré por corrupção passiva, tráfico de influência e falsidade ideológica. Ele responde apenas pelo último crime.

Réu nas cinco ações penais e nas duas de improbidade que resultaram da Operação Porto Seguro, Paulo Vieira exerce a função de analista de controle e finanças do Ministério da Fazenda, com salário mensal de R$ 19.437,76. O PAD contra ele já teve a fase de apresentação de provas concluída e também já houve o indiciamento.

Trabalho na AGU rende R$ 21 mil
Na Justiça, Vieira responde pelos crimes de corrupção ativa setes vezes, tráfico de influência, falsidade ideológica duas vezes, falsificação de documento de particular e quadrilha. Ele é acusado de ter oferecido favores a Rosemary para ser nomeado para o cargo na ANA. Ao assumir o posto, teria comandado um esquema de venda de pareces em órgãos como a Secretaria de Patrimônio da União (SPU), a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Anataq) e a Advocacia Geral da União (AGU). O advogado de Vieira não foi localizado. Na defesa prévia, o ex-diretor da ANA questionou os procedimentos formais das investigações e pediu a transferência de todo o caso para Brasília, o que foi negado pelo magistrado de São Paulo.

Réu em uma ação penal e outra de improbidade, José Weber Holanda, ex-adjunto do advogado geral da União, Luís Adams, trabalha na escola da AGU, com salário de R$ 21,4 mil.

Investigação vê rede de operadores do PMDB na Petrobrás

• Força-tarefa da Lava Jato conclui que sigla, ao contrário de PP e o PT, tinha várias frentes que se beneficiavam do esquema na estatal

Andreza Matais e Fábio Fabrini - O Estado de S. Paulo

BRASÍLIA - O PMDB tinha uma rede de operadores na Petrobrás para desviar recursos de contratos com empreiteiras, segundo as investigações da Operação Lava Jato. Ao contrário do que ocorria com o PP e o PT, no PMDB havia várias frentes que se beneficiavam do esquema, cada uma com seu interlocutor nas diretorias da estatal.

As investigações indicam que o modelo peemedebista na Petrobrás reproduzia a organização descentralizada do partido, loteado por diversos caciques, e principal aliado do governo. Cada operador atuava para um padrinho, reportando-se a uma pessoa ou grupo de poder, e não à legenda como um todo.

Em depoimento à Justiça, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás Paulo Roberto Costa admitiu que além de operar para o PP, que o indicou ao cargo, também passou num determinado momento a atender o PMDB. O ex-diretor disse que começou a repassar dinheiro a peemedebistas após acordo para permanecer no cargo. A barganha foi a saída encontrada por ele para conter investida de uma ala da legenda, que se articulou para derrubá-lo da cúpula da companhia petrolífera.

A negociação com o PMDB ocorreu quando Costa se afastou por meses do cargo para tratar uma doença adquirida em viagem à Índia. Segundo interlocutores, após voltar ao Brasil, o então diretor teve uma infecção generalizada e chegou a ser desenganado pelos médicos. Aproveitando-se da vacância, uma ala do partido teria se articulado para substituí-lo pelo ex-gerente executivo Alan Kardec.

No depoimento, Costa contou que, depois de recuperado, esteve em Brasília e costurou o apoio à sua manutenção no cargo com um político do PMDB. Nessa época, o então deputado José Janene, seu padrinho, já estava enfraquecido por causa do seu envolvimento com o mensalão. Paulo Roberto precisava do PMDB para continuar no cargo.

O PMDB também tem negado envolvimento do partido no esquema. Costa dirigiu a área de Abastecimento e Refino da Petrobrás de 2003 a abril de 2012.

Baiano. Segundo as investigações, paralelamente, outro grupo do PMDB também se beneficiava do esquema por meio do consultor Fernando Soares, o Fernando Baiano - que está preso na superintendência da Polícia Federal no Paraná e teve R$ 8,5 milhões bloqueados nas contas de duas de suas empresas. A defesa nega que ele tenha participado de esquema de corrupção na estatal.

A força-tarefa da Lava Jato, porém, concluiu que Baiano tinha influência na Diretoria Internacional, comandada até 2008 por Néstor Cerveró.

No PP e no PT o esquema tinha operadores únicos, que atuavam para atender aos partidos como um todo, conforme os investigadores. No caso do PP, o operador era o doleiro Alberto Youssef, um dos delatores do esquema de corrupção na petroleira.

Descontrole e protecionismo ajudam corrupção – O Globo / Editorial

• Não é fato de estar liberada da lei 8.666 e ter a flexibilidade de seus concorrentes na contratação de serviços que levou a Petrobras a mergulhar em escândalos

Com a abertura do mercado brasileiro de petróleo, a Petrobras perdeu a condição de empresa monopolista. Ao menos em tese, todas as atividades nas quais a Petrobras está presente foram abertas à competição, do poço de petróleo ao posto de serviços. Nesse novo quadro, não faria sentido manter a companhia amarrada às regras do serviço público em geral e de outras empresas estatais. Licitações, por exemplo, se conduzidas pelas normas da lei 8.666, levariam bem mais tempo do que o dispensado pelos concorrentes.

Assim, nos serviços essenciais, a Petrobras convida fornecedores a apresentarem suas propostas, e escolhe às que mais se adaptam a seus propósitos. De fato, tal sistema deu mais agilidade aos investimentos que a estatal promove.Teria sido então a dispensa de contratação pela lei 8.666 o flanco que favoreceu o superfaturamento, o suborno, o achaque, o pagamento de propinas nos escândalos de corrupção agora revelados pela Operação Lava-Jato?

Culpar a forma mais flexível de contratação pelo esquema criminoso que se formou em torno de grandes obras da empresa equivale a tentar tirar o sofá da sala como solução para o problema. Na verdade, mesmo sem seguir o ritual da lei 8.666, a Petrobras nunca esteve desobrigada de controles internos e externos. Como o Tesouro é seu maior acionista, deve explicações ao Tribunal de Contas da União e à Controladoria Geral da União.

A cada trimestre analistas de mercado de capitais se debruçam sobre os números de suas demonstrações financeiras. Todas as transações que possam impactar significativamente tais resultados devem ser divulgadas como fatos revelantes para conhecimento simultâneo dos acionistas.

Os escândalos, e na dimensão que aconteceram, ocorreram por falha nos controles internos e externos da companhia. As investigações mostrarão se a falha foi proposital ou involuntária. Seja como for, ficou claro que a Petrobras não tinha uma política de governança corporativa à altura do que se deveria esperar da principal companhia do mercado de capitais brasileiro.

A maioria dos projetos encomendados pela Petrobras são executados por empreitadas. Com base nas especificações técnicas, recomendações e objetivos traçados pela companhia, o empreiteiro se encarrega de subcontratar os demais fornecedores, assumindo a responsabilidade pelos prazos. tal modalidade, conhecida como EPC, é usual em grandes empreendimentos industriais. O problema é que o o ramo das empreiteiras se transformou em um clube fechado, subdividido em diferentes níveis, de acordo com o patamar do contrato. Empresas internacionais não podem concorrer dentro do país. Tudo indica que chegou a hora de se rever esse antigo protecionismo.

Um monumento ao desperdício do dinheiro público – O Globo / Editorial

• A Sete Brasil, em que a Petrobras se associa a bancos privados e fundos de estatais, é projeto-símbolo de um plano que reproduz política da Era Geisel, inclusive seu fracasso

Como toda crise, o escândalo histórico de corrupção na Petrobras aponta falhas, necessidade de reformulações em sistemas de gestão, e assim por diante. O caso chama, ainda, a atenção para algo que já se sabia: os enormes riscos que o Erário corre com o projeto de inspiração estatista de utilizar-se a exploração do pré-sal como alavanca para um anacrônico programa de substituição de importações de equipamentos na área de petróleo. Tudo no mais bem acabado figurino da política seguida pelo penúltimo governo da ditadura militar, do general Ernesto Geisel, inspirada num modelo tropicalizado de capitalismo de Estado. Naquela época, na segunda metade da década de 70, a ambição era bem maior — produzir internamente máquinas, equipamentos e insumos básicos químicos e petroquímicos, antes importados.

Com o lulopetismo no comando da Petrobras, o objetivo é mais modesto, porém a fórmula do fracasso, a mesma: apoio firme do dinheiro público distribuído pelo BNDES, e sociedade da Petrobras com empresários privados, os quais abandonarão o barco e deixarão o prejuízo para a Viúva, assim que o empreendimento fracassar. Não deu certo no passado, não dará agora.

O mérito do escândalo, nessa questão, é projetar luz sobre a situação difícil de um empreendimento-símbolo deste projeto dirigista acoplado à exploração de áreas do pré-sal pelo modelo de partilha. É a Sete Brasil, fundada no final de 2010, para permitir a produção de sondas no país capazes de operar na região de águas profundas em que se localizam os mais promissores blocos do pré-sal. A empresa tem contratos com a estatal de afretamento de 28 sondas, uma garantia de mercado criada para incentivar sua produção internamente. No mundo das ideias, tudo muito lógico e promissor — como o megalomaníaco programa de substituição de importações de Geisel. Mas, na vida real, a situação é outra. A Sete Brasil já pagou a cinco estaleiros US$ 6,5 bilhões, um terço do valor total contratado. Porém, apenas cinco de 29 sondas previstas começaram a ser montadas. O descompasso se explica pela necessidade de a Sete Brasil — em que a Petrobras se associa ao Bradesco, Santander, BTG Pactual e a fundos de pensão de estatais — adiantar dinheiro para que os estaleiros sejam construídos. E em alguns estão associadas empreiteiras envolvidas no escândalo de corrupção.

Para aumentar a dose de suspense em torno deste projeto, a Sete Brasil foi idealizada dentro da estatal, sob a supervisão de Renato Duque, diretor da Petrobras indicado pelo PT e no momento preso pela Operação Lava-Jato. Um dos cargos de direção da subsidiária foi ocupado por Pedro Barusco, o ex-auxiliar de Duque que promete devolver US$ 100 milhões recebidos em propinas. Não se pode, portanto, ser otimista com a Sete Brasil, um projeto cevado sob a proteção do Estado e embalado numa visão nacionalista que tudo justifica, inclusive a roubalheira.

Incertezas complicam a gestão da dívida mobiliária – Valor Econômico / Editorial

A campanha eleitoral teve impacto direto na dívida mobiliária federal e sua gestão será certamente mais uma das difíceis tarefas da equipe econômica do novo governo, agravada pela possibilidade de rebaixamento do risco de crédito. As agências de avaliação do crédito soberano sinalizaram a intenção de aguardar os primeiros movimentos do futuro governo antes de mudar suas avaliações. Mas, o espaço para a complacência diminuiu bastante depois que a Standard & Poor's (S&P) tomou a dianteira e rebaixou a nota do Brasil em março, de BBB para BBB-, na fronteira do investimento especulativo, deixando a impressão de que as outras agências ficaram defasadas ao manter avaliações mais favoráveis ao país.

O ambiente de incerteza criado inicialmente pela disputa eleitoral e, agora, pelas indefinições a respeito das novas diretrizes da política econômica dificultaram a rolagem dos papéis públicos, encareceram o custo de financiamento e reduziram os prazos de vencimento.

Um dos primeiros problemas foi a volatilidade e a alta dos juros dos títulos, refletindo a expectativa em relação ao grau de investimento e, mais recentemente, o aumento da taxa básica (Selic). O custo médio de emissão de títulos em ofertas públicas - que inclui a taxa interna de retorno dos papéis no mercado doméstico e a variação de seus indexadores -, passou de 11,44% em agosto para 11,76% em setembro e atingiu 12,14% em outubro. Em dezembro do ano passado, estava em 9,33%, quase três pontos abaixo.

Além disso, houve o encurtamento do prazo médio dos papéis. No fim de 2013, da dívida mobiliária interna, 25,5% venciam em 12 meses. Em agosto, o percentual já estava em 26,52% e passou para 26,92% em setembro e 24,78% em outubro.

Nesse ambiente de incerteza, não passou desapercebido o grande aumento de operações compromissadas do Banco Central (BC), revelando a preferência dos investidores por negócios de curto prazo e risco menor. O total de operações compromissadas aumentou cerca de 37% no segundo semestre, passando de R$ 661 bilhões em junho para R$ 905 bilhões em outubro - um bolo formidável, equivalente a mais de 40% da dívida mobiliária total, que constitui mais um fator de pressão sobre os juros, como notou o colunista do Valor, Yoshiaki Nakano (1/11).

A outra face do aumento das compromissadas é a redução das ofertas primárias de títulos públicos. Em agosto, o volume de títulos vendidos em leilão totalizou R$ 52 bilhões, bem abaixo dos R$ 71 bilhões resgatados. Em setembro, foram vendidos menos títulos ainda, R$ 42,67 bilhões, para um total de resgates de R$ 57,66 bilhões. Agora em outubro, as emissões da dívida interna somaram apenas R$ 35,59 bilhões para resgates de R$ 84 bilhões, resultando em uma redução de R$ 48,42 bilhões da dívida. Assim, o estoque total da dívida pública diminuiu 1,29% para R$ 2,15 trilhões.

Desde o início do ano, os resgates líquidos da dívida mobiliária federal somam quase R$ 170 bilhões e a previsão é de que o volume pode fechar o ano em R$ 110 bilhões. Já no ano passado os resgates superaram as novas emissões em R$ 87 bilhões, o que não acontecia desde 2007, quando estourou a crise internacional. A matemática desfavorável reflete a preocupação do investidor com o risco e mostra que o governo brasileiro, apesar de pagar um dos juros mais elevados do planeta, está com dificuldade de vender seus títulos. Além disso, realimenta a preocupação com a situação fiscal pois indica que o Tesouro tem mais uma fonte de gastos, que é fazer frente aos resgates (Valor 17/11).

Do lado positivo, há o interesse dos investidores estrangeiros pelos títulos brasileiros, já interpretado como sinal de que haveria maior otimismo no exterior em relação ao Brasil do que dentro do próprio mercado doméstico; ou simplesmente resultado da estratégia de buscar ganhos maiores. O total da dívida mobiliária nas mãos de estrangeiros saiu de 16,1% em dezembro de 2013 para 18,8% em agosto; atingiu 19,32% em setembro e 20,28% em outubro.

Relatório da área externa divulgado na segunda-feira pelo Banco Central revela que essa tendência pode estar mudando. Em outubro, houve o ingresso líquido de US$ 3,511 bilhões de investimento estrangeiro no país, acumulando no ano US$ 29,02 bilhões canalizados para a renda fixa. Dados parciais deste mês registram o resgate líquido de US$ 519 milhões até o dia 20, volume pouco representativo frente ao total acumulado, mas que não deixa de ser um sinal de alerta.

A patética pesquisa do PT - O Estado de S. Paulo / Editorial

Depois do segundo triunfo do presidente Lula nas urnas, apesar do fardo do mensalão que ele carregava, líderes tucanos começaram a se perguntar por que o partido não havia conseguido capitalizar contra o seu principal beneficiário o que até então constituía o maior escândalo político da democracia brasileira. A esse fracasso se somou outro: o definhamento do PSDB no Congresso Nacional. Em 1998, na esteira da consagradora reeleição do presidente Fernando Henrique, a legenda viu a sua bancada na Câmara dos Deputados ampliar-se de 62 para 99 cadeiras. Com o advento da era Lula, porém, começou o longo declínio tucano: os 99 caíram a 70 em 2002 e a 66 daí a quatro anos.

Na esperança, afinal frustrada, de pelo menos estancar a hemorragia em 2010, um perplexo dirigente paulista da agremiação propôs numa reunião o que poderia se revelar um primeiro passo em busca da luz no fim do túnel. Por que, perguntou ele aos interlocutores, não encomendamos uma pesquisa para saber o que o eleitorado gostaria que fosse o nosso programa? O tucano decerto não se deu conta de que isso representaria uma abdicação: embora pesquisas periódicas sobre políticas que mexem com o sentimento popular tenham se incorporado em toda parte às práticas partidárias, o que se espera de uma sigla é que seja capaz de persuadir o público de que as suas propostas são as que mais bem atendem o interesse geral. A isso se chama liderança.

A ideia, logicamente, não foi adiante. Serve, em todo caso, como lembrete de que não há partidos imunes a iniciativas cujos autores podem achar o máximo da modernidade, mas que são apenas patéticas. Agora, quem diria, o inimigo mortal dos tucanos, o PT, resolveu perguntar aos brasileiros por que se tornou tão mal-amado. O fato, em si, é inconteste. Não só a presidente Dilma Rousseff escapou por muito pouco de ser desalojada do Planalto - obtendo uma vitória eleitoral que não a poupou de sair politicamente derrotada da campanha -, como o partido retrocedeu em todas as disputas. No primeiro turno do pleito presidencial, a sigla teve 4,3 milhões de votos a menos do que em 2010. Na segunda rodada, a perda foi de 1,2 milhão, embora nesses quatro anos tenham surgido 7 milhões de novos eleitores.

No ABCD paulista, onde nasceram o PT e a CUT, Dilma só derrotou Aécio Neves em Diadema - e por uma diferença aquém de 8%. A bancada federal petista encolheu de 88 para 70 membros. As bancadas estaduais, de 149 para 108. A agremiação não conseguiu reeleger nem o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz, que não chegou ao segundo turno, nem o do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, que chegou, mas acabou goleado. O estigma de promotor da corrupção que o partido fez por merecer, a fadiga de amplos setores do eleitorado com 12 anos de poder petista, a virtual estagnação econômica e, não menos importante, a percepção da incompetência da presidente explicam a rejeição ao petismo, que chega a ser avassaladora em São Paulo.

Pois bem. Como se isso não fosse evidente, a legenda mandou fazer uma sondagem em âmbito nacional, acompanhada de pesquisas qualitativas, para ouvir da sociedade o que os seus grãos-companheiros saberiam por conta própria, não fosse a cegueira de que foram acometidos, há muito, pela fantasia de serem os exclusivos portadores do progresso nacional e da redenção do povo injustiçado. Eis por que, antes até de receber das urnas as más notícias que os desconcertaram, ficaram aturdidos com o desgosto, também por eles, dos manifestantes de junho de 2013, não raro acompanhado de agressivo antipetismo. A memória do mensalão, o colapso dos serviços públicos - debitado em primeiro lugar à administração federal - e a ojeriza ao sistema político, sem distinguir o PT do conjunto dos partidos execrados, estilhaçaram a profana ignorância do apparat petista sobre o que germinava em surdina no País.

Embora sustentado também pelo contribuinte, via Fundo Partidário, o PT que faça o que quiser com o seu dinheiro. Por exemplo, torrá-lo numa pesquisa que, de um lado, deverá apenas confirmar o óbvio - e, de outro, dificilmente induzirá a elite estrelada a deixar as práticas afrontosas que já são a sua segunda natureza.

Marco Aurélio Nogueira - Popularização da classe política não faz Câmara ser mais progressista

– O Estado de S. Paulo

O mínimo que se poderia dizer do mais recente livro do professor Leôncio Martins Rodrigues (Topbooks, 2014) é que ele chega em ótima hora, pronto para esclarecer o debate público.

Isso se deve tanto à competência da análise, marca registrada do cientista político paulista, professor aposentado da USP e da Unicamp, quanto à relevância do tema.

Todos se recordam do alvoroço que se fez, logo após a apuração das urnas do primeiro turno das eleições, em torno da chegada ao Congresso Nacional de um grande número de deputados de perfil conservador. Não foram poucos os que constataram que o País estaria “indo para a direita”. A razão disso teria sido que os eleitores escolheram, para representá-los, parlamentares religiosos, militares, comunicadores, ruralistas e fisiológicos, estranhos aos principais partidos democráticos, mais fora do controle deles e mais propensos a seguir agendas conservadoras.

Empregando com habilidade e rigor alguns dos instrumentos típicos da boa pesquisa sociológica — a coleta e o manejo criterioso de dados, a proposição clara de uma teoria de fundo, a construção de séries históricas e comparações –, Leôncio derruba um dos mitos recorrentes no discurso político brasileiro, especialmente no de esquerda. Qual seja, o de que a política é o ambiente por excelência dos ricos e poderosos. Para ele, há dados abundantes para demonstrar que “o recrutamento para a profissão política está se fazendo cada vez mais nas camadas médias e, em menor medida, nas classes populares”. Como desdobramento, reduz-se o poder das classes proprietárias e das elites tradicionais, as chamadas “elites oligárquicas”.

A “popularização da classe política brasileira” responde a várias determinações. Decorre de forma direta da democratização da vida política, da mobilidade social e da modernização da sociedade. A vida tradicional tem menor poder de comando sobre as pessoas, vive-se de forma mais fragmentada e a massificação se tornou um fator importante na modelagem social. O campo político foi igualmente massificado: cresceu o tamanho do eleitorado e aumentou o número de organizações e entidades coletivas competindo por mais poder e benefícios. O resultado, escreve Leôncio, “é um volume extremamente elevado de atores políticos e de interesses sociais fragmentados em numerosas instituições, organizações e associações (sindicatos especialmente) que estabelecem vínculos com os partidos políticos e por eles elegem suas lideranças”. Desta forma, “aumenta o espaço público controlado ou influenciado por entes corporativos”.

Deu-se assim um duplo processo: a atividade política passou a ser um caminho de ascensão social ao mesmo tempo que a mudança social impulsionou a ida de trabalhadores e da classe média assalariada para a política. O caso mais emblemático é o de Lula. De origem humilde, uma família paupérrima de retirantes, Lula ascendeu socialmente ao se tornar metalúrgico e, mais tarde, dirigente social. Escreve Leôncio: “Como acontece com sindicalistas que ascendem pela via da atividade sindical, Lula já não era pobre ao entrar no mundo da política”. Há méritos próprios na trajetória, mas ela não seria compreensível sem as importantes mudanças que ocorreram na sociedade.

A pesquisa de Leôncio Martins Rodrigues concentra-se nos 513 deputados federais eleitos em 2010, para a 54ª Legislatura. Interessado em traçar o perfil socieconômico dos parlamentares, foi atrás de dados associados ao patrimônio declarado por eles, convencido de que a análise destes dados “é uma boa indicação do peso das elites saídas de diferentes classes e setores do sistema político e da sociedade brasileira”.

Não se trata, portanto, de uma conclusão que impute a maior ou menor riqueza nem a informações sigilosas da Receita Federal, nem a fatores de tipo ostentatório.

Para Leôncio, tanto faz o deputado “parecer” rico ou pobre, ostentar sinais socialmente tidos como associados à baixa ou alta renda. O importante é o que se tem de indicação objetiva, mesmo que ela possa estar contaminada por algum tipo de desvio subjetivista. Afinal, sempre se pode ocultar parte do patrimônio, ou sobrevalorizá-lo. Ao pesquisador interessa o que é declarado.

Com isto, a conclusão pode surpreender, mas dificilmente será contestada: o Congresso Nacional, nas duas últimas décadas, tornou-se um paraíso da classe média, refletindo a mudança principal a que se assistiu na sociedade e na política: a irrupção das massas na cena política institucionalizada, com o deslocamento das elites tradicionais e a afirmação progressiva de novas elites. O conduto principal deste movimento tem uma ponta dupla. De um lado, o processo de democratização que remonta aos anos 1980 e que se combinou com abertura de novos espaços políticos e com modernização e diferenciação socioeconômica. De outro lado, a projeção do PT e das forças por ele referenciadas, fato que possibilitou que a ocupação dos espaços abertos se fizesse com sangue novo, ou não tão velho.

A pesquisa de Leôncio ajuda a que se compreenda esse processo todo. Mostra que “o recrutamento para a classe política começou a efetuar-se mais intensamente nas classes médias e em maior medida nas classes populares, no ‘povão’. Os segmentos mais beneficiados foram aqueles onde existem sindicatos fortes, especialmente no setor público: professores, bancários, funcionários públicos, empregados de empresas estatais etc.”. O recuo que, em contrapartida, pode ser observado na representação das classes altas e das velhas elites de proprietários rurais indica o quanto se teve de mudança, ainda que não possa ser tomado como prova de perda total de poder. Muito ao contrário.

A Câmara dos deputados, apesar do aumento dos deputados vindos “de baixo”, está longe de ser uma “casa popular”. A mudança do perfil de seus integrantes demonstra, porém, que nela não predominam os milionários ou os membros das “elites econômicas”. Trata-se de uma instituição cortada pela desigualdade e pela heterogeneidade social. Os muito ricos (patrimônio superior a 4 milhões de reais) são cerca de 8%, os multimilionários (mais de 10 milhões de reais) não passam de 3% e 60% dos parlamentares declararam patrimônio inferior a 1 milhão de reais. “Pelos dados das declarações patrimoniais, a maioria dos deputados se enquadraria num dos segmentos intermediários da sociedade, sendo os ricos e os pobres uma minoria oscilando em torno de 10%”.

Donde a conclusão mais importante: “Essa distribuição dos valores, em princípio, trabalha a favor de orientações políticas moderadas de negociação e transações”.

O livro de Leôncio contribui, assim, para que se perceba que uma mudança na composição social da representação, ainda que em tese beneficie os partidos mais à esquerda e desloque as oligarquias tradicionais, não indica que a Câmara será sempre mais progressista. Os próprios partidos de esquerda nunca ultrapassaram a conquista de um terço das cadeiras da Casa. Há muito mais coisas em jogo: a qualidade e a transparência programática dos partidos, sua capacidade de se adaptarem às mudanças e à flutuação ideológica dos eleitores pesam tanto quanto os fatores institucionais.

Marco Aurélio Nogueira, professor titular de Teoria Política da Unesp

Merval Pereira - A busca do diálogo

- O Globo

A busca do diálogo para superar as divergências, tanto no Oriente Médio quanto no mundo atual, pluralista e não hegemônico, foi o tema central não apenas do seminário da Academia da Latinidade, quanto das conversas paralelas mantidas com as autoridades de Omã, que pretendem ter uma presença mais forte na região.

O fato de a Academia da Latinidade contar com a presença em seus debates de intelectuais latino-americanos de diversas correntes, e ser dirigida por um deles, o sociólogo e membro da Academia Brasileira de Letras Candido Mendes, serve de ponte para que o entendimento entre as religiões, preconizado pelo ministro dos Assuntos Religiosos de Omã, Sheik Abdullah bin Mohammed Al-Salmi, possa se concretizar com o apoio do argentino Papa Francisco, o primeiro latino-americano a assumir o posto. O Sheik disse ontem que está à espera de um chamado do Vaticano para concretizar o projeto. Nos contatos que teve com membros do governo de Omã, Candido Mendes pôde constatar o real interesse que têm em expandir suas ideias pela região.

O vice-primeiro-ministro Fahd bin Mahmoud al Said, por exemplo, em conversa ontem pela manhã, disse que há muito se aboliu a ideia de minorias em Omã, para que não houvesse cidadãos diferentes uns dos outros. Mesmo protegendo as minorias, diz ele, elas ficam marcadas, e a diversidade de uma sociedade, para ser um valor agregado, precisa ser tratada com naturalidade, e não destacada. Para o primeiro-ministro, uma valorização das religiões tradicionais encurtará o espaço para a ação de fundamentalistas como os do Estado Islâmico . Em uma de suas intervenções no seminário, Candido Mendes chamara a atenção para a dificuldade encontrada por regimes surgidos da Primavera Árabe, como na Tunísia e no Egito, de separar o Estado da religião , e provavelmente por isso entusiasmou-se tanto com a posição omani de afastá-los totalmente.

Ele teme que não haja um entendimento completo de que a "guerra de religiões" elimina a possibilidade de um encontro dentro das subjetividades coletivas no mundo multipolar em que vivemos. O sociólogo de Singapura Syed Farid Alatas fez um grande estudo sobre a possibilidade do diálogo, e concluiu que para facilitar o diálogo entre religiões é preciso que sejam evitados os estereótipos, que, alimentados pelo viés educacional, quer sejam orientados por educação orientalista ou eurocêntrica, acabam se refletindo na mídia. Ele advoga que haja maior in ter câmbio entre cientistas sociais na Ásia e África, para que esses estereótipos sejam superados.

Ao mesmo tempo, diz que o diálogo não deve ser limitado a conversas entre as elites, acadêmicos e políticos, mas deve ser um diálogo desmistificador que favoreça a vida do homem comum, objeto primeiro desse diálogo. Também o poeta e escritor Marco Lucchesi, da Academia Brasileira de Letras, analisou o que chamou de "novos espaços" para o diálogo diante de um novo pluralismo que vem provocando no mundo mudanças transgênicas profundas. Ele cita algumas: Los Angeles é a maior cidade budista do mundo; a Igreja Católica está crescendo mais rapidamente na Ásia; a Inglaterra tem tantos muçulmanos quanto anglicanos.

Segundo Lucchesi, a teologia das religiões hoje é parte de um plano maior e mais variado que mostra que não há saída que não o diálogo. Diz ele que "não há mais lados opostos. Estamos todos do mesmo lado, envolvidos em redes de diálogo que normalmente é árduo, mas profundamente reflexivo e delicado, onde a religião se mostra sensível ao outro num ensinamento ecumênico". Para Lucchesi, o diálogo não pode ser limitado por uma fria, asséptica, estufa inabitada. Se fosse isso, seria apenas um simulacro, não teria a beleza da descoberta do Outro.

Igor Gielow - Uma jabuticaba sincera

- Folha de S. Paulo

Enquanto Brasília prende a respiração com a Operação Lava Jato e o Planalto tenta oficializar o "reboot" da política econômica até quinta (27), um personagem prepara a volta ao centro do palco.

Trata-se de Gilberto Kassab, ex-prefeito paulistano (2006-12). Um dos políticos mais astutos e silenciosos em ação, ele fundou um partido para chamar de seu, o PSD, em 2011.

A operação custou-lhe energia e maculou seu mandato --que havia atingido um pico de popularidade quando derrotou figurões em 2008, vindo de uma gestão herdada por ser vice de José Serra (PSDB), eleito governador em 2006. Apesar da origem nominal, aproximou-se de Dilma e cumpriu seus acordos.

Viu o PSD virar uma potência política razoável. Fez dois governadores e, mesmo com a desidratação que atingiu todos os governistas, na Câmara só está atrás de PT, PMDB e PSDB em termos de bancada eleita.

A coroação do processo, para Kassab, será conseguir assumir o Ministério das Cidades, cujas verbas e capilaridade estão nas mãos de um aliado enfraquecido de Dilma, o PP que é alvo de destaque na Lava Jato.

Mas ele quer mais. Lidera campanha para fazer renascer o Partido Liberal, legenda na qual começou a vida política e que virou o atual PR.

Apesar do nome, espera-se que o PL mantenha a definição kassabista de não ser nem de esquerda, nem de direita, nem de centro. Uma jabuticaba sincera em seus desígnios, brasileiríssima, digamos assim.

Com o PL, poderá atrair gente de toda coloração em 2015, já que não há limites para o troca-troca com novas agremiações, e quando talvez o estrago da Lava Jato esteja mais claro. Siglas como o seu partido anterior, o DEM, podem ser absorvidas.

O objetivo? Mostrar serviço no Parlamento e começar a disputar espaço de fiador da estabilidade política com o PMDB, auferindo louros correspondentes. Difícil e de longo prazo, bem ao estilo de Kassab.

Dora Kramer- O ônus da vitória

- O Estado de S. Paulo

Ainda que o governo não tenha conseguido votar, e aprovar, ontem no plenário do Congresso o projeto de lei que o livra da responsabilidade de cumprir a meta de gastos seu objetivo será alcançado amanhã ou depois.

Questão numérica: o Planalto tem maioria e a base governista - com destaque para o maior e mais problemático partido, o PMDB - decidiu que o tema e o momento não são adequados para o tradicional jogo de estica e puxa quando há cima de tensão (como é o caso) entre Executivo e Legislativo.

Muito fácil concluir que deputados e senadores aliados disseram "sim" ao texto do relator Romero Jucá na votação, segunda-feira, na Comissão Mista de Orçamento em troca de cargos em ministérios ou liberação de verbas de emendas. Ocorre que não há postos para satisfazer a todos nem dinheiro para distribuir, conforme admitido pelo conteúdo das recentes medidas, inclusive dessa ora em pauta.
Qual a razão, então, de suas excelências ficarem assim tão comportadas? Uma só: não tinham para onde correr. Ou aprovavam a mudança na Lei de Diretrizes Orçamentárias ou o governo pararia de fazer repasses a Estados e municípios e pagar contratos com empresas. Além disso, deixariam a presidente Dilma Rousseff sujeita a mais dia menos dia vir a responder por crime de responsabilidade.

Tudo isso serviu de pressão sobre os parlamentares que receberam telefonemas de prefeitos, governadores, empresários e fizeram a seguinte conta: o estrago já está feito, as contas públicas foram para o espaço, a credibilidade do governo foi ao chão. Interna e externamente. Então, a única coisa a fazer seria engolir o sapo, explicar à consciência (para os que dispõem do equipamento) que o ato é pelo bem do Brasil e dar a mudança da lei de presente ao Planalto.

Não o fizerem, porém, sem ônus. Durante toda a sessão da Comissão de Orçamento, ouviram a oposição lhes dizer umas boas verdades: que aquele projeto representava uma transgressão legal, sua aprovação o aval do Congresso a ilegalidade, que a base parlamentar governista era fisiológica, submissa, vendida e fiadora de uma trapaça engendrada pelo Poder Executivo para esconder sua irresponsabilidade no trato do dinheiro público.

Sobre a presidente Dilma falou-se de tudo: impeachment, desgoverno, estelionato eleitoral. E os integrantes dos partidos de sua base aliada calados. Das 20h até pouco mais de meia-noite a pancadaria transcorreu pesada e sem defesa. Motivo alegado: havia urgência para a aprovação do Congresso e, se os governistas respondessem à oposição, perderiam tempo.

Uma verdade pela metade. Sangue frio tem limite. A menos que se sabia perfeitamente o quanto é indefensável o que se defende. É quando entra em cena e fala mais alto para calar mais fundo o constrangimento.

Passo a passo. Outra razão para o PMDB se aliar ao Planalto na extinção da meta do superávit fiscal de 2014: não jogar a candidatura do deputado Eduardo Cunha à Presidência da Câmara no campo explícito da oposição.

Não que isso vá convencer o governo de que Cunha seria, no exercício do cargo, um aliado incondicional. Apenas para não dar pretexto para que os tratores do Executivo comecem a funcionar desde já.

De outro lado, há um problema se o governo interferir com muita força: a reação dos "atropelados" a partir do dia da eleição e durante os dois anos seguintes.

Memória seletiva. A senadora Kátia Abreu, indicada para o ministério da Agricultura, em 2007 foi relatora da proposta de derrubada da CPMF na Comissão de Constituição e Justiça.

O fim do imposto do cheque foi a maior derrota do governo Lula, usada na campanha de reeleição de Dilma para acusar Marina Silva e Aécio Neves de terem contribuído para "retirar recursos da saúde".